Abdulrazak Gurnah sabe muito bem sobre os temas a que se debruça. Autor de dez obras, lançadas entre 1987 e 2020, o escritor nascido em uma das ilhas de Zanzibar, em 1948, chegou como exilado à Inglaterra na década de 60. Sob o regime do então presidente Abeid Karume, começou um período de perseguição aos cidadãos de origem árabe na recém-proclamada República da Tanzânia. Por fazer parte de uma das minorias sob opressão, aos 18 anos deixou a família em sua terra Natal para iniciar uma vida nova no Reino Unido. Agora, o escritor e ex-refugiado tem seu trabalho das últimas três décadas reconhecido ao ser premiado com o Nobel de Literatura.
O anúncio da escolha do nome de Gurnah foi feito nesta quinta-feira (07/10), pela Royal Swedish Academy. “O Prêmio Nobel de Literatura 2021 foi concedido a Abdulrazak Gurnah por sua penetração intransigente e compassiva dos efeitos do colonialismo e do destino do refugiado no abismo entre as culturas e os continentes”, declarou o comitê da academia.
Além dos dez livros, o escritor publicou ainda várias histórias curtas. Apesar do suaíli ser sua língua mãe, quando começou sua carreira profissional, adotou o inglês em seus textos. Infelizmente, sua obra ainda não foi traduzida para o português.
“Em todo o seu trabalho, Gurnah se esforçou para evitar a nostalgia onipresente de uma África pré-colonial mais primitiva. A sua formação é uma ilha culturalmente diversificada no Oceano Índico, com uma história de tráfico de escravos e várias formas de opressão sob várias potências coloniais – portuguesas, indianas, árabes, alemãs e britânicas – e com ligações comerciais com todo o mundo. Zanzibar era uma sociedade cosmopolita antes da globalização”, destaca Anders Olsson, presidente do Comitê do Nobel.
Ainda segundo ele, a dedicação do escritor à verdade e sua aversão à simplificação são impressionantes. “Isso pode torná-lo sombrio e intransigente, ao mesmo tempo que segue o destino dos indivíduos com grande compaixão e comprometimento inflexível. Seus romances recuam de descrições estereotipadas e abrem nosso olhar para uma África Oriental culturalmente diversificada, desconhecida para muitos em outras partes do mundo. No universo literário de Gurnah, tudo está mudando – memórias, nomes, identidades. Uma exploração sem fim movida pela paixão intelectual está presente em todos os seus livros, e igualmente proeminente agora, em Afterlives [mais recente livro], como quando ele começou a escrever como um refugiado de 21 anos”.
Ao receber o telefonema sobre a premiação em sua casa, na Inglaterra, Gurnah revelou que num primeiro momento, demorou a acreditar que fosse verdade. “Achei que fosse uma brincadeira. Há muita especulação semanas antes, ou às vezes meses antes do anúncio oficial, sobre quem são os indicados, então não era algo que estava em minha mente. Eu estava pensando, quem vai ganhar? Estou honrado por receber este prêmio e me juntar aos escritores que me precederam nesta lista. Estou extremamente feliz e muito orgulhoso”.
Dos 118 escritores premiados desde a fundação do prêmio Nobel, apenas quatro são negros, incluindo Gurnah. Três deles são homens e há apenas uma mulher.
Amanhã, sexta-feira (08/10) será anunciado o/a vencedor/a do Nobel da Paz, certamente, um dos mais aguardados.
A cerimônia de entrega dos prêmios acontece sempre em 10 de dezembro, aniversário da morte do seu idealizador, o industrial e filantropo sueco Alfred Nobel (1833-1896).
As indicações ao Nobel podem ser feitas por algumas pessoas específicas, membros de alguns órgãos e entidades, parlamentares, professores universitários, acadêmicos e ex-recebedores do título, mas a lista completa com o nome dos nomeados é sempre mantida em segredo por 50 anos.
Foto: divulgação Bloomsbury Publishing/©Mark Pringle