A votação foi acirrada e empatou. Com 17 votos SIM e 17 votos NÃO, coube ao relator do Projeto de Lei 399/2015 (de autoria do deputado Fábio Mitidieri) dar o ‘voto de Minerva’: o deputado Luciano Ducci votou a favor do texto e, assim, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal aprovou, ontem, 7 de junho, o plantio de Cannabis e a fabricação e a comercialização de medicamentos com extratos, substratos ou partes da planta no Brasil, por empresas farmacêuticas.
A cannabis é conhecida popularmente como maconha, por isso, tanta confusão e moralismo.
Mesmo depois de depoimentos contundentes sobre pessoas com doenças graves que registraram melhora na qualidade de vida com o uso da cannabis medicinal, a estupidez manteve-se presente, e deputados aliados de Bolsonaro – que se manifestou contra por diversas vezes, dizendo que vetaria o projeto – tentaram obstruir a pauta.
Eles alegam que o texto legaliza a maconha! Não falta literatura e nem casos que comprovam a eficiência da cannabis na redução e na cura dos impactos de várias doenças na saúde humana. O que se almeja com o projeto não é legalização da maconha, mas a utilização de um de seus princípios – que não dá barato – pela Medicina e pela Ciência.
O texto tramitou pela comissão de forma conclusiva, por isso, o certo seria seguir para o Senado. Mas, insatisfeitos com o resultado, os conservadores prometeram entrar com recurso para que a proposta seja analisada primeiro na Câmara dos Deputados, onde talvez exista mais chance de veto já que a bancada dos conservadores é grande.
Para tanto, precisam do apoio de, pelo menos, 52 deputados. Se o recurso for aprovado, em vez de seguir para o Senado, passará pela Câmara.
Como pudemos retroceder tanto e ter parlamentares tão conservadores no Congresso, nas mãos dos quais está a decisão sobre os temas que pautam a vida dos brasileiros?
O que diz o texto aprovado
Originalmente, o projeto alterava a Lei Antidrogas, visando a autorização da venda de medicamentos que tenham a referida planta em sua formulação. Mas o relator – que é médico pediatra, vale destacar – decidiu apresentar um texto mais amplo, para além do uso medicinal, contemplando também os usos veterinário, científico e industrial da cannabis.
No caso de fins medicinais em seres humanos, a autorização para cultivo da planta será dada pelos órgãos sanitários federais. No caso de uso veterinário, a liberação virá de um órgão federal agrícola.
O projeto apresentado pelo relator sofreu algumas alterações no decorrer das discussões. O que foi aprovado:
– está liberado o “cultivo, processamento, pesquisa, armazenagem, transporte, produção, industrialização, manipulação, comercialização, importação e exportação de produtos à base de cannabis”;
– é permitido o cultivo de cannabis em todo o território nacional, desde que seja realizado por pessoa jurídica autorizada pelo poder público, com sementes e mudas certificadas;
– as empresas interessadas em produzir medicamentos e produtos com cannabis terão que se submeter a um certo controle: obedecer uma quota de cultivo, suficiente para atender demanda pré-contratada ou com finalidade pré-determinada, que deverá ser indicada no requerimento de autorização para o cultivo; indicar proveniência e caracterização do quimiotipo da planta de cannabis, como também a rastreabilidade da produção, desde a aquisição da semente até o processamento final e seu descarte; e apresentar um plano de segurança, que contemple todos os requisitos de previstos na lei, que ajudem a prevenir desvios.
O cultivo de plantas de Cannabis medicinal só poderá ser feito em casa de vegetação, que é uma estrutura especial construída para cobrir e abrigar plantas de forma artificial. Essa estrutura deve permitir a entrada de luz solar, por meio do uso de materiais transparentes, de forma a proteger sementes e mudas “contra agentes meteorológicos”.
No quesito segurança, as exigências são grandes. As áreas de plantio para este fim deverão ser bem protegidas, impedindo o acesso de pessoas não autorizadas. E deverão ser equipadas com sistema de videomonitoramento e alarme de segurança, de forma a restringir o acesso.
No caso de uso medicinal, toda a área da instalação deve ser protegida com tela, alambrado de aço ou muro de alvenaria, que deverão ter, no mínimo, dois metros de altura e cercas elétricas com tensão suficiente que impeça qualquer invasão.
O texto também define regras para descarte, armazenamento e transporte de sementes, plantas e insumos provenientes da cannabis.
Pesquisa, exportação, importação
O texto do PL aprovado também contempla instituições de pesquisa. Elas estão autorizadas a “plantar, cultivar, colher, manipular, processar, transportar, transferir e armazenar as sementes de cannabis, além de espécies vegetais secas ou frescas da planta, de insumos, de extratos e de derivados”.
A importação e a exportação de sementes e derivados também estão permitidas, desde que autorizadas pelos órgãos competentes, previamente.
Foto: Esteban Lopez/Unsplash