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Chico Mendes vive: encontro destaca seu legado no país que mais mata ativistas do campo

Por Mariana Campos*

“No dia em que Chico foi enterrado, chovia como hoje, parecia que tinha muita gente chorando. Ele havia espalhado uma mensagem que fazia sentido no coração de todo mundo, uma mensagem simples com convicção forte: do valor da floresta, dos recursos naturais e das pessoas que protegem esses recursos. Hoje, todo mundo entende essa mensagem”. Assim, a antropóloga Mary Allegretti iniciou sua fala no evento que acontece desde sábado em Xapuri, no Acre, para marcar o legado deixado por Chico Mendes e denunciar a impunidade contra os crimes no campo.

Em 22 de dezembro de 1988, Chico Mendes foi assassinado na cidade que agora recebe lideranças extrativistas e movimentos sociais de diversas regiões do Brasil, além de amigos e parentes. Reconhecido internacionalmente, Chico passou a vida lutando pacificamente contra as motosserras que derrubam a floresta. Seu empenho em diminuir as injustiças no campo resultou em um bem-sucedido programa de alfabetização para os seringueiros e na criação das Reservas Extrativistas (Resex), um tipo de unidade de conservação de uso coletivo que permite que as populações utilizem seus recursos, como extração de borracha e castanha, sem destruí-la.

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Joaquim Belo, presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) e líder extrativista de Mazagão, no Amapá, conta que, mais jovem, ficou fascinado pela história de Chico. “Se tem algo que une todo mundo na causa pela Amazônia e as populações tradicionais, é o Chico”. Ele acredita que o evento em Xapuri pode contribuir para a formação política da nova geração de seringueiros. “Eles precisam saber que são fruto de uma luta. Se eu não entendo da onde vim, não valorizo onde estou”.

[na foto abaixo, feita por Marizilda Crupe para o Greenpeace, a Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, no Acre, gerida com a comunidade Dois Irmãos. As Resex foram um dos maiores legados do líder seringueiro]

Brasil lidera ranking de assassinatos no campo

A abertura do Encontro Chico Mendes 30 anos: Uma memória a honrar. Um legado a defender, no último sábado, aconteceu no dia em que Chico completaria 74 anos. Nessa mesma manhã, mais uma liderança do campo foi morta. Gilson Maria Temponi presidia a Associação dos Agricultores Nova Aliança, no Pará, e lutava pela regularização de terras junto ao Incra.

“A sensação é a de que estamos voltando a antes de 1988. A situação de conflito é grave e se espalha”, alerta Gumercindo Rodrigues (foto ao lado), amigo antigo de Chico Mendes. Ele conta que, por conta da pressão para se colocar pasto e retirar madeira de dentro das reservas extrativistas, seringueiros vêm sofrendo ameaças. A intimidação por parte de madeireiros e grileiros é tanta que alguns seringueiros tiveram suas casas queimadas em Xapuri recentemente. “Toda a mata fora das Resex já está destruída por aqui”, diz Gumercindo.

Lutar pelo meio ambiente e os direitos das pessoas no campo é tarefa arriscada no Brasil, que continua sendo o país que mais mata ativistas que defendem a terra, as florestas e os rios no mundo, segundo relatório recente da Global Witness. Em 2017, 57 mortes foram registradas no Brasil, sendo que 80% dos crimes aconteceram na Amazônia em decorrência de conflitos ligados ao agronegócio e à exploração de madeira e mineração ilegais.

“Líderes como Chico Mendes, Marielle Franco e Irmã Dorothy trouxeram consciência de classe para as pessoas e colocaram em xeque esse modelo de desenvolvimento injusto e excludente, que vira as costas para os trabalhadores do campo e os mais pobres. Por promoverem mudanças concretas e nos inspirarem, viram alvos. Essa violência precisa acabar”, diz Danicley Aguiar, da campanha Amazônia do Greenpeace, que foi a Xapuri honrar e reafirmar o legado de Chico na luta por justiça para a floresta e seus povos.

(leia também: ONU lança campanha para proteger ativistas ambientais. Brasil é um dos países mais perigosos)

Novos tempos de resistência

Com a preocupação de que os conflitos no campo e a criminalização dos movimentos sociais aumentem nos próximos anos, o trabalho de mobilização coletiva será fundamental para garantir a proteção das Resex e os direitos dos extrativistas. Nesse aspecto, Chico Mendes deixou como legado sua incrível capacidade de fazer alianças em favor das populações e da floresta.

Deixou também muitas sementes. Uma delas é Lívia Mendes, sua bisneta de 9 anos (foto abaixo) que pretende ser “pesquisadora da natureza”. Em carta escrita para o bisavô, Lívia diz: “Tomara que as pessoas tenham consciência e que tenham aprendido que elas não vivem sem a natureza”.

Fotos: Divulgação (abertura) e Marizilda Crupe/Greenpeace Brasil

Este texto foi originalmente publicado no site do Greenpeace Brasil, em 17/12/2018

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