
Texto atualizado em:
– 20/5/2019: para inserir informações sobre a doação de Luxemburgo no valor de 100 mil euros;
– 17/5/2019: para incluir informações sobre o encontro de Raoni e comitiva com Emanuel Macron, presidente da França, que prometeu apoio; e sua visita à Bruxelas, na Bélgica, onde participaram de Marcha pelo Clima. Leia o texto completo abaixo.
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Não é de hoje que o cacique Raoni Metuktire circula pelo continente europeu muito à vontade para falar da realidade dos povos indigenas no Brasil e pedir apoio para suas causas. E sempre foi (e é) muito bem recebido. Essa jornada de líder para além do nosso território vem desde que encantou o músico britânico Sting, em 1989, e dele se tornou amigo. Sua vitalidade tem ajudado um bocado nessa trajetória internacional também: hoje com 89 anos, ele não para, e, por onde passa, impressiona por sua força e carisma. O botoque (disco labial), que é sua marca registrada para os brancos, significa que ele sempre está pronto para defender e para morrer por suas terras.
Por tudo isso, em 3 de maio, o benadjore (cacique) Kayapó embarcou para a Europa para um giro de três semanas organizado pela ONG Floresta Protegida (ou Forête Vierge, floresta virgem), que ele preside de forma honorária.
Sua missão é arrecadar um milhão de euros para a proteção da reserva do Xingu, terra indígena que abriga inúmeras comunidades indígenas, e da Amazônia, que enfrentam ameaças constantes do agronegócio e das madeireiras, que só aumentaram com o governo Bolsonaro. Todos os dias há notícias de violência e invasões contra os indígenas e o desmatamento na floresta amazônica só cresce, a cada mês.
Em Paris, o primeiro encontro
Acompanhado por três líderes indígenas – Kailu, Tapy Yawalapiti e Bemoro Metuktire -, Raoni iniciou sua turnê por Paris, onde primeiro encontrou com o Ministro do Meio Ambiente e da Transição Energética, François de Rugy, a quem entregou um bastão tradicional “para derrubar seus inimigos”, brincou ele, demonstrando como usá-lo.

Em entrevista para o jornal francês Le Parisien, Raoni contou: “Busco 1 milhão de euros para financiar muros verdes feitos de bambu, para delinear a grande reserva do Xingu, que tem sofrido com a intrusão permanente de traficantes de madeira e de animais, garimpeiros e caçadores, que vêm caçar em nossas terras”.
Macron: admiração e promessa de apoio
No dia 16, no Palácio do Eliseu, o líder indígena e sua comitiva estiveram com Emmanuel Macron, presidente da França, que assegurou-lhes apoio em sua luta para proteger a biodiversidade, o Xingu e os povos da Amazônia, garantindo que é parte de “seu compromisso com a biodiversidade e no âmbito da presidência do G7”, este ano. Esse apoio – financeiro, inclusive – deve ser anunciado por Macron, em breve.
O presidente francês publicou vídeo sobre o encontro em seu Twitter (abaixo), no qual aparece ouvindo Tapi Yawalapiti (da etnia Yawalapiti do Xingu, que é filho de Aritana, formado em Direito) e escreveu: “Ele (se referindo a Raoni) sabe disso melhor do que ninguém: nosso planeta sofre por causa das atividades humanas. Ele fez a luta de sua vida. Com Cacique Raoni Metuktire, Grande Chefe do povo Kayapó, discutimos as medidas que estamos implementando para o clima e a biodiversidade”.
Il le sait mieux que quiconque : notre planète souffre des activités de l’Homme. Il en a fait le combat de sa vie. Avec le Cacique Raoni Metuktire, Grand chef du peuple Kayapo, nous avons échangé sur les mesures que nous mettons en oeuvre pour le climat et la biodiversité. pic.twitter.com/XW3lgulwqF
— Emmanuel Macron (@EmmanuelMacron) May 16, 2019
Macron destacou que, como um país amazônico, por causa da Guiana, “a França está naturalmente comprometida com a luta contra o desmatamento e defende os direitos dos povos indígenas, especialmente como atores-chave na preservação das florestas e da biodiversidade e, por isso, engajados na luta contra as mudanças climáticas“.
O clima, aliás, é um dos temas que o estadista diz serem imprescindíveis na sua agenda. Por isso, em outubro do ano passado, ele cutucou Bolsonaro, logo após sua vitória na eleição presidencial, devido a suas declarações irresponsáveis a cerca da saída do Brasil do Acordo de Paris. Na época, disse que esperava que a cooperação bilateral entre os países fosse mantida, principalmente no cenário da “diplomacia ambiental”.
Macron saiu do Palácio Eliseu de braços dados com Raoni e Bemoro, como você pode ver no vídeo da AFP. Muito emocionante.
Em Bruxelas, marcha pelo clima com estudantes
De Paris, Raoni foi para a Bélgica, onde participou de uma Marcha pelo Clima em Bruxelas. Junto com com Kalu, Tapi e Bemoro se uniu a centenas de pessoas, entre elas jovens, para protestar contra a inércia dos adultos e do governo diante da crise climática. Inspirados pela adolescente sueca Greta Thunberg, que iniciou o movimento Fridays for Future, os jovens belgas já causaram a demissão da ministra belga do meio ambiente.
Super bem recebido, em Bruxelas o líder indígena falou do motivo de sua viagem e, mais uma vez, denunciou as ameaças à Amazônia e aos povos indigenas.
Luxemburgo e a primeira doação
Em 20 de maio, ele e sua comitiva chegaram Grão-Ducado de Luxemburgo, onde o primeiro-ministro, Samuel Bettel, anunciou doação financeira para proteger a floresta amazônica. “Meu governo deseja propor uma contribuição financeira de 100 mil euros à Associação Forêt Vierge“, disse em comunicado oficial. Foi bem mais rápido que Macron nesse quesito.
A associação citada por ele é a ONG Floresta Protegida, que Raoni preside de forma honorária, como já contei neste texto. E a doação será disponibilizada por intermédio de um fundo gerido pelo Ministério do Ambiente, Desenvolvimento Climático e Sustentável do Luxemburgo.
Essa adesão rápida ao projeto dos indígenas para o Xingu não é à toa. Desde 2015, esse pequenino país europeu tem investido cada vez mais no financiamento de projetos de desenvolvimento sustentável. E graças à primeira plataforma de ações dedicadas aos valores sustentáveis, ecológicos e sociais – Luxemburgo Green Exchange (LGX) – ocupa o primeiro lugar no mundo em quantidade de “títulos verdes” listados na Bolsa de Valores. Não pára por aí: O país quer conquistar 39% da participação no mercado europeu de fundos de investimento responsável, segundo a agência Luxemburgo para Finanças.
Que países Raoni ainda visitará?
Ainda fazem parte da agenda de Raoni pela Europa, passagens pela Suíça, Mônaco, Itália e pelo Vaticano, onde tem encontro marcado com o Papa Francisco. Claro!
O que será feito com o dinheiro no Xingu?
O montante que Raoni conseguir arrecadar nesta viagem será investido para melhorar a sinalização dos limites da Terra Indígena do Xingu – “com muros verdes feitos de bambu” -, para comprar drones e equipamentos que ajudem na proteção da região e evitar a entrada de traficantes de madeira e de animais, garimpeiros e caçadores. Também quer investir na prevenção de incêndios.
Os recursos ainda devem ser aplicados na saúde e em conhecimentos técnicos para extração e comercialização de produtos da floresta do jeito que eles acreditam ser o melhor: sustentável, renovável e com respeito à natureza.
Abaixo, assista à reportagem da Euronews sobre o primeiro dia da visita de Raoni à Europa, em português:
Foto: Renato Soares (destaque) e reproduções do vídeo da EuroNews