
A imagem perturbadora da tigresa Samalas (este é seu nome) em ‘pele e osso’, abaixo – premiada este mês no prestigiado concurso internacional Environmental Photography Award, organizado pela Fondation Prince Albert II de Monaco -, foi registrada pela fotógrafa norte-americana de conservação, Amy Jones, ativista em defesa dos animais, numa fazenda de criação no norte da Tailândia.
A categoria escolhida por Amy foi Humanity X Nature, que questiona a cruel relação entre os seres humanos e a natureza. Ela venceu o prêmio devido a contundência do registro, que comoveu a todos que a viram. Contei essa história aqui, na semana passada, e volto para contar sobre o desfecho da vida da tigresa porque o impacto que a imagem causou em nossos leitores também foi grande.

Foto: Amy Jones
Ela faz parte de uma série de fotografias – reproduzo algumas delas nesta página – que Amy fez a convite da Wildlife Friends Foundation Thailand (WFFT), em dezembro de 2023, no dia em que a organização resgatou 15 animais (12 tigres idosos e três leopardos doentes), de um total de 53, da fazenda assombrosa – que, na época, respondia a processo por suspeita de comércio ilegal de animais selvagens.
Entre eles, estava Samalas, que vivia ali, sob maus-tratos constantes e muita sujeira, há mais de 20 anos.
Desde 2020, o Departamento de Parques Nacionais, Vida Selvagem e Conservação da Planta (DNP) inspecionou a fazenda diversas vezes a partir de denúncias. Numa delas, encontrou evidências como uma cabeça de tigre decepada e outras partes.
A fazenda ficava no norte da Tailândia, perto da fronteira com o Laos comunista. “Acredita-se que a área, situada às margens do Rio Mekong e com vários píeres não oficiais, seja um centro de transporte ilegal de animais selvagens”, diziam.

Foto: Amy Jones / WFFT

Devido a seu estado delicado, ela não precisou passar por isso.
Foto: Amy Jones / WWFT
Força e peso
No final de 2023, então, a WFFT conduziu os animais mau-tratados para seu Centro de Resgate de Animais Selvagens, ao sul da Tailândia, um santuário que recebe animais para recuperação e outros que não podem mais viver livres na natureza.
A escolha dos animais, a cada resgate, foi determinada pela situação de saúde de cada animal. Começaram pelos mais velhos e doentes, como Salamas. “Este foi um resgate incrível. É o maior feito por uma ONG na Tailândia”, declarou Edwin Wiek, fundador da WFFT.

como ela estava “pele e osso”, deixando a cabeça gigante
Foto: Amy Jones / WFFT
Ela foi um dos primeiros animais retirados dos recintos e, devido a seu estado deplorável – mal conseguia andar de tão fraca -, os veterinários decidiram não lhe dar tranquilizantes. Primeiro, porque não faria mal a ninguém; e, segundo, por receio de que ela não acordasse da sedação.
Wiek contou: “Temia-se que ela estivesse fraca demais para andar, mas finalmente ela recuperou as forças e cambaleou até a gaiola”, que foi acoplada a uma ambulância especializada em vida selvagem, na qual viajou por 12 horas, durante a noite, até chegar ao santuário.

Foto: Amy Jones / WFFT
“Embora assustadoramente magra e com enormes áreas de pelo faltando em todo o corpo, os socorristas estão esperançosos de que Salamas comece a se recuperar logo”, acrescentou Wiek. E foi o que aconteceu.
Logo ela começou a ganhar peso e força. E ficou linda, como dá pra ver pelas fotos. No entanto, ela já era velha demais para um milagre.
Paz e compaixão
Segundo os veterinários da WFFT, Salamas tinha uma massa cancerosa de 40 cm, que se espalhou para a maioria de seus órgãos internos. “Além disso, seus órgãos reprodutivos estavam tão danificados que praticamente se desintegraram — uma consequência cruel de ter sido usada para procriar incontáveis filhotes ao longo dos anos”, explicam.

Foto: WFFT
Devido à sua fragilidade, tratá-la do câncer não era uma opção. “Nossa prioridade era garantir que ela estivesse livre da dor e pudesse viver o resto dos seus dias em paz”, conta a equipe da WFFT. E assim foi no centro da WFFT.
“A história de Salamas é um lembrete gritante da crueldade oculta por trás dos locais onde se paga para ‘acariciar tigres’. Tigresas como Salamas são frequentemente tratadas como meras máquinas de reprodução, forçadas a gerar filhote após filhote, sem nenhuma consideração por seu bem-estar”.
O tempo de Salamas no santuário foi breve, mas o suficiente para que ela usufruísse de bons momentos de paz e compaixão, depois de tanto sofrimento.

sequelas de tantos maus-tratos que resultaram no câncer
Foto: WFFT
“Ela deixou um impacto profundo em todos que conheceram sua história. Em seus últimos meses, ela finalmente pôde viver como merecia — com dignidade, cercada de amor e livre do confinamento de uma pequena gaiola. E sentiu a grama sob suas patas, caminhou na chuva, se aqueceu ao sol e foi acarinhada”.
Infelizmente, nenhum dos animais resgatados naquele dezembro de 2023 poderia voltar à natureza. Mas, diante de suas vidas dilaceradas pela exploração, estar no santuário é um presente. Lá eles encontraram um lar seguro onde podem vagar por florestas, socializar com outros tigres e nadar no lago.
Salamas aproveitou tudo isso e foi feliz como nunca nos nove meses em que viveu no santuário.

“Sentiu a grama sob suas patas, caminhou na chuva, se aqueceu ao sol e foi acarinhada”
Foto: WFFT
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A categoria escolhida foi Humanity X Nature, que questiona a cruel relação entre os seres humanos e a natureza. E venceu o prêmio devido a contundência do registro, que comoveu a todos que a viram.
Fotos: Amy Jones