Todos os anos, no mês de junho, pesquisadores acompanham a migração de baleias francas (Eubalaena) do mar gelado da Antártica para águas mais quentes na costa sul da África. Lá elas encontram o ambiente perfeito para se reproduzir e cuidar de seus filhotes. Todavia, nessa região não há alimento para elas, por isso precisam chegar com altas reservas de energia para poder sobreviver os próximos meses e amamentar seus recém-nascidos.
Mas o que um grupo de cientistas internacionais percebeu é que ao longo das últimas décadas as baleias e seus filhotes têm perdido peso e ficado mais magros.
“As baleias francas estão 25% mais magras do que na década de 1980. Isso é ruim para essas populações porque significa que os filhotes recém-nascidos correm um risco maior de morrer”, alerta Fredrik Christiansen, pesquisador da Universidade de Aarhus e um dos autores de um artigo científico publicado no jornal Scientific Reports.
É com imagens e vídeos feitos por drones que se consegue estimar o peso das baleias. Os cientistas elaboraram um método que junta a largura, o comprimento e o volume para se ter uma ideia aproximada do peso de cada cetáceo.
“Calculamos o volume usando as fotografias do drone – e quando sabemos o volume, sabemos mais ou menos o peso. Dessa forma, podemos ver que as baleias ficaram mais magras nos últimos 30 anos – e isso é sério”.
E por que as baleias estão ficando mais magras?
No início do ano passado, uma notícia causou alarde mundial: a Antártica registrou 40 graus acima da média para aquela época do ano. Era março, fim do verão para o Hemisfério Sul e início de outono, e as temperaturas já deviam estar em queda.
Alguns anos antes, em 2019, um estudo divulgado na publicação Proceedings of the National Academy of Sciences analisou o derretimento da camada de gelo da Antártica entre 1979 e 2017. De acordo com os os cientistas da Universidade da Califórnia, a massa de gelo perdida no continente, anualmente, era seis vezes maior do que a média de 40 anos atrás.
Entre 1979 e 1989, a redução anual da camada era de 40 bilhões de toneladas, mas a partir de 2009, esse número saltou para 252 bilhões.
Acontece que o degelo da Antártica impacta diretamente a oferta de alimentos, sobretudo de krill, um pequeno crustáceo, semelhante ao camarão.
“Os cardumes de krill vivem do fitoplâncton, que se desenvolve melhor nas águas frias da Antártica. Lá, como plantas na terra, eles transformam a luz do sol em energia. O aumento da temperatura do mar significa que há menos fitoplâncton, menos krill e, portanto, menos comida para as baleias”, explica Christiansen.
As baleias tentam então encontrar mais alimento ao norte da Antártica, todavia, a quantidade de krills é menor e eles não são tão grandes como aqueles que vivem sob o gelo do mar Antártico.
Baleias têm tido um filhote a cada cinco anos e não mais a cada três: e menores,
eles morrem com mais facilidade
(Foto: Fredrik Christiansen)
Tempo entre nascimento de novos filhotes está maior
Outro fato notado pelos pesquisadores é que as baleais estão tendo filhotes a cada cinco anos, em média, e não a cada três anos, como acontecia na década de 80.
“Isso significa que a população está crescendo mais lentamente”, diz o pesquisador da Universidade de Aarhus.
E os filhotes estão crescendo mais devagar, já a quantidade de leite oferecida pela mãe afeta seu desenvolvimento. “Filhotes menores têm maior risco de morrer. Eles são mais vulneráveis se uma orca atacar”.
Felizmente as baleias francas no Oceano Antártico não estão em perigo de extinção. “Mas se esse cenário continuar, elas podem ficar ameaçadas”, destaca Christiansen. “As baleias são um predador de ponta. Quando um animal no topo da cadeia alimentar desaparece, ocorre um efeito cascata. Animais em toda a cadeia serão afetados se as baleias não estiverem mais lá. De tubarões a bactérias”.
*Com informações e entrevistas contidas no artigo no site da Universidade de Aarhus
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Foto de abertura: Fredrik Christiansen