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Tamanduá-bandeira monitorado há três anos morre atropelado em rodovia do Mato Grosso do Sul

Os integrantes do projeto de monitoramento Bandeiras e Rodovias do ICAS – Instituto de Conservacao de Animais Silvestres conheceram o tamanduá-bandeira Ty quando era pequenino e ainda andava nas costas da mãe. 

“Foi em 2018, no Cerrado do Mato Grosso do Sul, perto de Casa Verde”, conta, saudoso, o zoólogo Arnaud Desbiez, doutor em manejo da biodiversidade e presidente e fundador do ICAS e do projeto. 

“Quando ele se tornou juvenil, em 2020, colocamos o colar de monitoramento nele – que ajustamos e trocamos periodicamente – e o incluímos no projeto ‘detetives ecológicos’, que nos ajuda a compreender o que é uma paisagem permeável, o que representa uma barreira para seus percursos, a extensão de suas caminhadas… Ty tinha um papel muito importante nesse trabalho”.

Por isso, foi tão difícil encontrá-lo sem vida no acostamento da Rodovia 267, no último sábado, 26/8. Ele foi mais uma vítima de atropelamento.

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“Acordamos com esta triste realidade nas rodovias do Mato Grosso do Sul. Ficamos comovidos porque é um animal que conhecemos há tanto tempo, é um baque, parece que um pedaço da gente se vai com ele. A gente se apega, tem carinho por eles. Ty é mais um de nossos animais que morre vítima de colisão veicular. Morreu esta noite. É um macho que monitorávamos há três anos!”.

Desbiez destaca que este é “um evento muito triste”, mas muito comum no Mato Grosso do Sul. “Nossos estudos mostram que mais de 40 tamanduás-bandeiras são mortos por atropelamento a cada 100 km das rodovias, por ano. Já encontramos 14 tamanduás mortos em 100 km num dia”.

Metade dos animais atropelados morre na estrada

O especialista revela que o projeto Bandeiras e Rodovias monitora as rodovias a cada duas semanas e que, ao comparar os “estudos de persistência”, tem identificado que 50% dos animais atropelados se locomove e acaba morrendo a 100 ou 600 metros de onde aconteceu a colisão (alguns são “retirados por cachorros e outros animais carniceiros”) e os outros 50% morre na estrada, como Ty. E ele acrescenta: “A gente sabe que, aqui, está a ponta do iceberg”. 

“Há cerca de três meses, perdemos Sharon, que também monitorávamos desde 2018. Ela foi atropelada na rodovia, sofreu uma fratura com a colisão, mas andou e foi morrer longe da estrada”, completa.

Em levantamento realizado entre 2017 e 2020 nas rodovias do estado, o ICAS encontrou mais de 12 mil carcaças de animais atropelados, entre eles, as maiores vítimas eram tamanduás-bandeiras e antas. Na rodovia BR-267 onde Ty foi encontrado e que faz conexão entre Campo Grande e São Paulo – foram detectados os pontos mais críticos.

E Desbiez ainda destaca outro perigo neste cenário, desta vez, para os seres humanos. Um tamanduá-bandeira pode pesar 35 quilos, por isso, além de sua perda para o equilíbrio da biodiversidade, atropelar um animal desse tamanho também coloca em risco a vida de motoristas e passageiros. “A gente precisa mudar essa realidade trágica, precisa de medidas mitigatórias urgentes!”, sentencia.

Em seu Instagram, o projeto Bandeiras e Rodovias também destaca: “O Mato Grosso do Sul é reconhecido por sua importância ambiental e riqueza de biodiversidade. Sendo assim, não podemos permitir que a vida de pessoas e da fauna silvestre continue em perigo”.

Muitas mortes poderiam e ainda podem ser evitadas com a implementação de medidas de mitigação eficazes, que evitem que os animais acessem a pista, como cercas associadas a passagens de fauna.

Visão e audição limitadas, movimentos lentos e pelagem escura

As características físicas do tamanduá-bandeira – que o torna um dos mamíferos de grande porte que mais sofrem com atropelamentos – reforça ainda mais a urgência dessas medidas.

Seus olhos são muito pequenos e não refletem a luz dos faróis dos veículos nas estradas. Como se isso não bastasse, ele tem péssima audição, pelagem escura e transita a maior parte do tempo à noite, com movimentos muito lentos. Todas essas características associadas aumentam as chances de colisão ao atravessarem as estradas.

O ICAS monitora animais no Mato Grosso do Sul desde 2013 e já estudou cerca de 70. Iniciou esse trabalho no Pantanal e, agora, está no Cerrado. E, no momento, há 30 tamanduás sendo monitorados pelo instituto, sob coordenação de Desbiez.

Homenagem

No dia seguinte ao atropelamento do tamanduá-bandeira Ty, em agradecimento ao retorno dos seguidores em suas redes sociais, o projeto Bandeiras e Rodovias publicou um vídeo muito singelo, no qual ele aparece deitado embaixo de um pé de limão. 

“Era seu lugar preferido, onde ele deitava e, com certeza, tinha muitos sonhos sobre cupins e formigas. E é com essas imagens que gostaríamos de nos lembrar dele”.

Veja esse vídeo abaixo: é o segundo que reproduzimos do Instagram; no primeiro, estão Arnaud Desbiez ao lado de Ty sem vida.

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Foto: reprodução vídeo

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