
Muito tem se discutido sobre o impacto das redes sociais em nossa sociedade. Na maior parte das vezes, o debate recai sobre o mau uso delas ou ainda, a influência devastadora que elas podem ter sobre os mais jovens, como mostra de maneira brilhante e muito chocante a série Adolescência, exibida pela Neflix. Contudo, se bem utilizadas, essas plataformas digitais também podem ter um papel educacional e ambiental muito importante, ao promover, por exemplo, a conservação. E um novo estudo mostra exatamente isso: como o Instagram se tornou um canal valioso na divulgação dos anfíbios e répteis brasileiros.
“No ranking mundial, o Brasil ocupa o primeiro lugar em número de espécies de anfíbios e o segundo lugar de répteis. Descobrimos que os perfis brasileiros no Instagram são responsáveis por divulgar praticamente metade dessa riqueza de espécies aos usuários da rede social. Isso é impressionante, especialmente quando pensamos na aplicabilidade das redes sociais como ferramenta de divulgação científica e conservação da fauna — particularmente de anfíbios e répteis, que são, em geral, animais malvistos”, diz Werther Ramalho, professor e pesquisador do Instituto Federal Goiano, Campus Rio Verde, e do Instituto Boitatá de Etnobiologia e Conservação da Fauna, e principal autor do estudo.
A ideia para a realização do levantamento surgiu durante a pandemia da covid-19, na época do isolamento social, conta Werther. Ele e outros colegas decidiram analisar o conteúdo compartilhado em redes sociais, mais especificamente, no Instagram.
“O que é compartilhado nas redes sociais surgiu como uma ideia prática e oportuna, naquele momento, para compreender quem são os divulgadores e qual a representatividade da diversidade biológica conhecida que está sendo apresentada na internet”, explica. “Considerando que as redes sociais são amplamente utilizadas para a divulgação da ciência produzida por instituições e grupos de pesquisa, percebemos a importância de entender os padrões de publicação desses grupos – especialmente, identificar quais espécies são mais frequentemente divulgadas e se há padrões que possam ser reconhecidos e aprimorados. Isso pode contribuir para maximizar os objetivos dos perfis e, consequentemente, reforçar os esforços de conservação de anfíbios e répteis.”
Os perfis analisados foram todos brasileiros, gerenciados por laboratórios, grupos de pesquisa e/ou divulgação científica, associados a instituições públicas e privadas e ONGs.
“Colocamos alguns critérios para selecionar estes perfis, como possuir uma descrição que indicava que o objetivo do grupo era o estudo e a divulgação de informações sobre herpetofauna e que eles publicavam regularmente imagens de anfíbios e/ou répteis”, revela o pesquisador.
Com base nesses critérios, foram selecionados 71 perfis do Instagram que publicavam conteúdos sobre anfíbios e 69 sobre répteis. Em um período de seis anos, foram encontradas 3.859 fotos publicadas desses animais.

Fotos: reprodução Instagram
Uma das principais descobertas do grupo foi sobre a existência de um padrão nas fotos compartilhadas diariamente: a maioria retrata espécies nativas do Brasil, endêmicas – ou seja, que ocorrem apenas em nosso território -, descobertas há mais tempo pela ciência (mais antigas) e que não estão classificadas em categorias de ameaça segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN). Para os pesquisadores, isso indica que as fotos compartilhadas estão fortemente associadas à familiaridade que as pessoas têm com essas espécies.
E foi notada também uma prevalência maior de algumas espécies. “Anfíbios mais compartilhados são aqueles de distribuição mais ampla e descritos a mais tempo, como o sapo-ferreiro, sapo-cururu e a rã-cachorro, tendo também uma tendência pra divulgação de espécies mais carismáticas, como as pererecas-verdes ou perereca-macaco, e outras com cores fortes e chamativas.”
Já entre os répteis, as espécies mais compartilhadas foram serpentes, coloridas ou de maior porte e, assim como os anfíbios, que foram descritas há mais tempo. Entre os exemplos de serpentes populares na divulgação do Instagram estão jiboias, suaçúboia, sucuri, jararaca-verde e surucucu-pico-de-jaca. “Um pouco também é explicado pela curiosidade que as pessoas têm, embasadas nos mitos que existem sobre as serpentes”, sugere Werther.

Foto: Pedro Peloso
Divulgação da biodiversidade e ferramenta da conservação
Estima-se que globalmente 5,24 bilhões de pessoas no mundo inteiro façam uso regular das redes sociais, algo em torno de 64% da população global. Entre essas plataformas, o Instagram aparece em quarto lugar na preferência dos usuários (YouTube lidera o ranking, seguido por Facebook e WhatsApp).
No Brasil, estatísticas indicam que quase 135 milhões de pessoas utilizem o Instagram como forma de entretenimento ou informação. Com esse grande potencial para promover a biodiversidade da fauna e a sua conservação para um público tão amplo, o estudo também discutiu como as tecnologias digitais podem ser melhor empregadas em ações pró-ambientais e como pode ser feita a otimização dos mecanismos de busca.
“Por exemplo, para alcançar um público mais amplo e gerar maior engajamento no Instagram, é necessário adotar estratégias que ajudem a “furar” as chamadas “bolhas de filtro”, que limitam o alcance das publicações com base nos hábitos individuais de uso da rede. Dessa forma, orientamos os administradores de perfis a utilizar algumas práticas, como evitar textos muito longos, usar palavras-chave e hashtags relevantes“, ressalta Werther.
O pesquisador reforça ainda que, nas postagens, é sempre importante alertar sobre o tráfico de animais e usar frases-padrão nas legendas das fotos, como “Manter animais silvestres brasileiros como animais de estimação, sem a devida documentação, é crime. Ajude a combater o comércio ilegal de animais. Não compre, denuncie!”
“Encontramos uma proporção considerável de espécies, tanto de anfíbios quanto de répteis, que são alvo do comércio ilegal de animais silvestres. Assim, mesmo que os perfis tenham boas intenções ao realizar as publicações, podem acabar, sem querer, facilitando a localização dessas espécies ao indicar o local onde foram encontradas”, alerta.
Outro ponto levantado pelo levantamento é que seria importante divulgar não apenas espécies mais conhecidas e populares, mas também aquelas que estão ameaçadas de extinção, não só no Brasil, mas no mundo. “As pessoas precisam conhecer a riqueza e a beleza da nossa biodiversidade, partindo da premissa de que é necessário conhecer minimamente para poder conservar”, lembra o autor do estudo.
A principal constatação do grupo é que as redes sociais são ferramentas eficazes para a divulgação da biodiversidade. “Com estratégias bem direcionadas, elas podem atingir todo o seu potencial como aliadas na conservação da fauna”, destaca Werther.

Foto: reprodução Instagram ActaHerpeto
O estudo Discovering the richness of Brazilian amphibians and reptiles through images from Instagram profiles é assinado por Werther Pereira Ramalho, Tainã Lucas Andreani, Ana Clara Moreira de Melo, Larissa Moreira e Alessandro Ribeiro de Morais.
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Foto de abertura: Pedro Peloso