A Mostra Internacional de Cinema já passou pelo Rio de Janeiro e agora está em São Paulo. Como sempre, tem cinema de qualidade para todos os gostos e estilos. Você pode “se jogar” na programação de olhos fechados, acompanhar os bons críticos na mídia tradicional e alternativa ou aguardar alguns filmes – nem sempre os mais aclamados – entrarem no circuito comercial.
Aqui, não tenho a pretensão de fazer crítica, mesmo porque só assisti a um dos filmes que indicarei. Quero apenas destacar os três que considero imperdíveis por suas temáticas de resistência. Porque esse é o espírito do momento, nosso zeitgeist para prosseguir em um cenário tão turbulento politicamente. Cenário este que já vem influenciando nossas vidas há um bom tempo e que promete sacudir a produção cultural e o cinema – no pior sentido da palavra – daqui pra frente.
Resistir é preciso. E estes três filmes – Martírio, O Jabuti e a Anta e Era o Hotel Cambridge – não nos deixam nada confortáveis, por isso, são boas inspirações. Não perca!
Martírio
Assisti ao filme de Vincent Carelli, do lindo projeto Vídeo nas Aldeias, na Bienal do Cinema Indígena (idealizada por Ailton Krenak e que aconteceu em São Paulo no início deste mês) -, mas já tinha lido muito sobre ele, principalmente os textos do cientista social e jornalista Felipe Milanez.
Saí da sala de exibição dilacerada e com mais certeza de que todo brasileiro PRECISA assistir a este documentário. Pra saber o que está acontecendo, para entender sua origem e o processo histórico que culminou com o genocídio que ameaça todas as etnias e outros povos tradicionais pelo país.
Levando em conta tudo que está registrado por Carelli e pelos próprios Guarani Kaiowaa, me parece impossível imaginar que os índios brasileiros sobreviverão a tanto desenvolvimento sem critério, a tanta ganância. Nesse cenário, é fácil prever que, num futuro não tão distante, eles serão apenas conhecidos por fotografias ou ilustrações, como acontece com os índios Xetás (leia post no blog Arte na Roda, aqui no site).
Por tudo isso, queria muito escrever sobre Martírio, mas optei por reproduzir um dos artigos que Milanez escreveu para o site da revista Carta Capital, com o título de outro artigo dele também. Portanto, se você ainda tem dúvida se vale sair de casa para sentir o coração apertado ao ver na telona parte da barbárie sofrida por este povo, leia Martírio: um filme que o Brasil precisa ver.
Ontem, domingo, teve exibição do filme na Mostra, com ingressos esgotados tão logo a programação foi anunciada, mas ainda há duas exibições programadas:
– 25/10, às 15h50, no Espaço Itaú de Cinema/Frei Caneca 2 e
– 29/10, às 15h40, no Cine Belas Artes, Sala 1/Vila Lobos.
O Jabuti e a Anta
A seca no sudeste e a necessidade de “produzir” mais água para consumo é o fio condutor do filme de Elisa Capai. A partir desse ponto, ela sai em busca de respostas para a sanha desenvolvimentista que planeja construir complexos hidrelétricos faraônicos na Amazônia, sem levar em conta os impactos.
Encontra Belo Monte, que ainda iria detonar boa parte da paisagem que conheceu e registrou. Depois segue para as fronteiras da Amazônia brasileira e peruana para encontrar os índios Ashaninka e sua líder, Ruth Buendia, que liderou a luta para barrar a construção de uma obra gigantesca (parceria entre os dois países) em suas terras e no rio Ene. De lá Capai e sua equipe partiram para a bacia do rio Tapajós, região para a qual há projetos de 40 usinas, algumas já em construção, e onde conheceram os índios Munduruku e a história de O Jabuti e a Anta.
Recentemente, a licença ambiental da obra que impactaria o território dessa etnia foi cancelada. Completamente irregular, se realizada a obra alagará a região e colocará em risco sua forma de vida, como também de outras comunidades tradicionais.
– 30/10 (estreia), às 19h15, no Reserva Cultural 2;
– 31/10, às 15h20, no Espaço Itaú de Cinema/Frei Caneca 6 e
– 2/11, às 19h30, no Espaço Itaú de Cinema/Augusta, Anexo 4.
Era o Hotel Cambridge
Esta é uma criação coletiva do Movimento Sem Teto do Centro de São Paulo (MSTC), o Grupo de Refugiados e Imigrantes Sem Teto (GRIST) e a Escola da Cidade. Com direção de Eliane Caffé, o documentário narra a trajetória de um grupo de refugiados que divide com os sem-teto uma ocupação no centro de São Paulo: o ex-Hotel Cambridge.
Nesse cenário e ameaçados diariamente pelo despejo, os ocupantes/moradores dividem dramas, alegrias e diferentes visões de mundo.
Na programação da Mostra, serão três exibições:
– 25/10, às 21h50, no Cinearte 1;
– 27/10, às 15h, no Cinesesc e
– 1/11, às 18h10, no Espaço Itaú de Cinema/Frei Caneca 3.
Os três filmes, por enquanto, participam de mostras e festivais. Ainda não há informações sobre sua entrada em circuito comercial, então, o melhor é ficar atento a seus sites para acompanhar as notícias.
Agora, assista ao trailer de O Jabuti e a Anta e às primeiras cenas de Era o Hotel Cambridge:
https://www.youtube.com/watch?v=sfrDosU7jNQ