A morte da ciclista Marina Kohler Harkot por atropelamento é a terceira na cidade de São Paulo, em trinta dias. E, certamente, não será a última.
Marina tinha 28 anos, era cicloativista, era feminista, especialista em gênero, desigualdade e mobilidade. Formada em Ciências Sociais pela USP, era mestra e doutoranda pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da instituição (FAU-USP), onde atuava como pesquisadora colaboradora do LabCidade (Laboratório Espaço Público e Direito à Cidade). Sua dissertação de mestrado, apresentada em 2018, teve como tema:A bicicleta e as mulheres.
Foi coordenadora da Associação de Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade, organização da qual participava, agora, como suplente), consultora de projetos no Banco Mundial, devido à sua especialidade. Também participou do Conselho Municipal de Trânsito e Transporte da capital paulista e de movimentos por melhores políticas de mobilidade urbana.
Seu currículo Lattes, ainda no ar, em sua pesquisa de doutorado ela vinha se aprofundando no tema da “segregação socioterritorial a partir de abordagens de gênero, raça e mobilidade“.
Mas sua voz foi calada na noite de domingo, 8/11, por volta das 23h50, na zona oeste de São Paulo, próximo ao cruzamento da Avenida Paulo VI (mais conhecida como Avenida Sumaré) com a Rua Lisboa.
Marina foi atropelada e o motorista fugiu. Uma policial que estava de folga e passava pelo local presenciou o atropelamento. Logo que anotou a placa do carro do agressor, tentou reanimá-la, enquanto a ambulância do Samu estava a caminho, mas a jovem não resistiu e faleceu no local.
É inadmissível que ciclistas e pedestres continuem morrendo no trânsito, como se esse ritual macabro tivesse que fazer parte da rotina de cidades como São Paulo.
O desaparecimento de Marina – uma das mais aguerridas cicloativistas da capital – deveria ser um marco, deveria ser a semente que dará início a um grande movimento – o maior – para debater e legislar definitivamente a mobilidade nas grandes cidades brasileira, pela vida, pela liberdade e humanidade no ‘ir e vir’ e contra a impunidade. Em homenagem a ela e a todos que já morreram nas mesmas condições.
Se você concorda, não se cale! Não foi acidente!
Fale sobre o assunto sempre que tiver oportunidade, converse com todos que você conhece e que dirigem veículos para que se conscientizem de que é preciso respeitar todas as pessoas que circulam pelas cidades. Que, apesar do incentivo das autoridades – em lodos os aspectos – o carro não é o dono do espaço público. E que dirigir não é brincadeira.
Faça isso pessoalmente e pelas redes sociais. E, neste caso, adote as hashtags #NãoFoiAcidente #JusticaPorMarina #MarinaPresente #BastaDeMortesNoTrânsito em homenagem a Marina e a todos que morreram nas mesmas condições.
Aproveite para consultar os planos de seus candidatos a prefeito/a e vereador/vereadora nas próximas eleições. Eles consideram mobilidade urbana entre as principais prioridades de seu mandato? Defendem a vida e não o carro? Desejam uma cidade mais humana e mais justa para todos?
Tá mais que na hora de escolher políticos que priorizam o bem-estar do povo e não de meia dúzia de eleitores ou de corporações.
Prefeitos deveriam ser responsabilizados pelas mortes no trânsito
No mesmo dia em que Marina faleceu, 8/11, às 17h, na Praça do Ciclista, no início da Avenida Paulista, movimentos cicloativistas organizaram ato em sua homenagem para reivindicar Justiça e segurança no trânsito.
Nas redes sociais, diversos foram os ativistas e amigos de Marina que se pronunciaram, como Daniel Guth, diretor executivo da organização Aliança Bike, em seu Twitter:
“Passou da hora de incluir prefeitos e secretários como corresponsáveis pelas mortes no trânsito. Talvez, desta forma, as coisas mudem. Uma via ampla em declive, sem fiscalização e com limite de 50 km/h não é condizente com a vida. E as blitz da lei seca? Viraram lenda urbana”.
Em seu Instagram, Renata Falzoni, uma das primeira cicloativistas da cidade e candidata a vereadora, tornou clara sua revolta:
“Nossa voz PRECISA ser ouvida Não dá para chamar de “acidente” algo que é planejado, premeditado ou que poderia facilmente ser evitado. A morte por atropelamento é planejada em São Paulo. Planejada para se repetir todos os dias”.
Bastante combativa, desde o início de sua carreira política, como vereadora em São Paulo, a deputada federal Sâmia Bomfim também lamentou a morte de Marina e pediu Justiça em seu Facebook:
“Muito triste com a notícia do falecimento da querida Marina Harkot. Jovem pesquisadora e ativista em defesa da mobilidade urbana, Marina foi vítima da violência no trânsito. Aos familiares, colegas e amigos, expresso meus sentimentos de profundo pesar. Contem comigo na luta por justiça. Marina presente!”.
Atropelamento e fuga
O atropelamento de Marina está sendo investigado pelo 14º Distrito Policial do bairro de Pinheiros como “homicídio culposo na direção de veículo automotor e fuga de local de acidente“.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, o delegado responsável pelo caso encontrou o proprietário do veículo (Hyundai Tucson, cor prata, com placas de Campinas), que alegou tê-lo vendido há dois anos, mas ainda precisa apresentar o documento de transferência.
Estamos de olho! Este crime não vai ficar impune.
Foto: Reprodução de post no Instagram