Quem disse que a caixa-ninho projetada para ajudar na reprodução e salvar da extinção a arara-azul também não pode virar lar de filhotes de falcão acauã? Ninguém! Exatamente. Pelo contrário, quantas mais espécies viverem em harmonia na natureza, melhor.
O flagrante feito esta semana pelo biólogo Bruno Henrique Carvalho, durante monitoramento em um ninho artificial no Refúgio São Francisco do Perigara, no Mato Grosso, é um exemplo disso. No vídeo compartilhado pelo Instituto Arara Azul em suas redes sociais é possível ver um lindo filhotinho dentro da caixa de madeira.
Esse não é o primeiro registro de um filhote da espécie nascido nesses ninhos. Chamado no Pantanal de macauã, a Herpetotheres cachinnans é um tipo de falcão, que coloca seus ovos em cavidades de árvores, assim como a arara-azul (Anodorhynchus hyacinthinus).
“Depois dos incêndios do Pantanal em 2020, intensificamos o trabalho com as caixas instaladas, ou seja, instalamos mais ninhos artificiais, justamente para suprir a demanda por cavidades, repor aquelas perdidas nas grandes árvores queimadas pelo fogo”, diz Bruno.
O filhotinho dentro do ninho
(Foto: Bruno Carvalho)
O biólogo explica que outras espécies acabam utilizando esses ninhos, como a acauã.
“Nessa região em específico nos últimos três anos encontramos filhotes de acauã em caixas próximas. Imaginamos que seja o mesmo casal que vive nessa área”, revela.
Acauã, cantado por Luiz Gonzaga
O falcão acauã tem em média 50 cm de comprimento e pesa pouco mais de 550 gramas. É uma ave de médio porte e a envergadura de suas asas pode chegar a 90 cm.
A espécie é encontrada em todo o Brasil e também do México à Argentina. Alimenta-se de lagartos, morcegos e cobras, mas também, de parasitas do gado.
O acauã foi inspiração para uma música do saudoso Luiz Gonzaga, com composição de Zé Dantas:
“Acauã, acauã vive cantando
Durante o tempo do verão
No silêncio das tardes agourando
Chamando a seca pro sertão
Chamando a seca pro sertão
Acauã, acauã,
Teu canto é penoso e faz medo
Te cala acauã,
Que é pra chuva voltar cedo
Que é pra chuva voltar cedo
Toda noite no sertão
Canta o joão-corta-pau
A coruja, a mãe-da-lua
A peitica e o bacurau
Na alegria do inverno
Canta sapo, gia e rã
Mas na tristeza da seca
Só se ouve acauã
Acauã, acauã…”
Um acauã adulto
(Foto: iNaturalist user: carnifex, CC BY 4.0 via Wikimedia Commons)
Monitoramento dos ninhos
Há mais de três décadas a equipe do Instituto Arara Azul, fundado pela bióloga Neiva Guedes, estuda a vida dessas aves, maneja e recupera ninhos naturais e instala artificiais, fazendo o acompanhamento desde a postura do ovo até o nascimento do filhote e seu primeiro voo (leia mais aqui).
Graças a esse trabalho, além do envolvimento da comunidade local e pesquisas científicas, quea arara-azul que ao final da década de 80 tinha uma população estimada em 1,5 mil indivíduos, hoje chega a 6,5 mil.
Ao longo desse tempo foram monitorados quase 500 ninhos naturais, além de cerca de 400 artificiais.
O trabalho feito com os ninhos no Refúgio São Francisco do Perigara é uma parceria com o Onçafari, e com apoio ao Loro Parque.
*Com informações adicionais do WikiAves
Foto de abertura: Bruno Carvalho