
Nota do Conexão Planeta: Este texto foi produzido pelo Instituto Socioambiental (ISA) e publicado em 10/1/2020 em seu site. Ao reproduzi-lo, aqui, incluímos informações (e sinalizamos) no trecho sobre “O que você pode fazer“ porque julgamos necessárias para maior compreensão das ações propostas.
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Em 2019, assistimos a uma explosão do desmatamento na Amazônia. O desmonte de políticas públicas e o incentivo ao desmatamento por meio de declarações gerou o “efeito Bolsonaro”, estimulando ações ilegais de derrubada da floresta. Mas, nem tudo está perdido: na década passada, entre 2003 e 2012, o Brasil conseguiu reduzir o desmatamento e assim aproximar-se do cumprimento de tratados internacionais de redução de emissões de carbono.
Elencamos algumas ações que podem ser feitas para manter a floresta em pé:
1. Moratória da soja e do boi
A moratória da soja é um compromisso firmado pelas empresas do setor para não comprar o grão de áreas desmatadas da Amazônia. O acordo ajudou a reduzir o desmatamento relacionado à soja. Porém, está sob risco.
Apoiada pelo governo de Jair Bolsonaro, a Associação Brasileira de Produtores de Soja (Aprosoja) quer fazer uma reclamação junto ao Cade (Conselho de Defesa da Atividade Econômica) contra o acordo. Além disso, falta um acordo similar para a indústria da carne, condicionando a compra do boi apenas de áreas não desmatadas. Hoje, a pecuária é uma das principais causas do desmatamento na Amazônia.
2. Estabilidade legal das áreas protegidas
Outro ponto que estimula a grilagem e, portanto, o desmatamento, é a instabilidade jurídica em relação aos territórios. Cerca de 15 Unidades de Conservação que mais contribuem para o desmatamento já sofreram (ou sofrem) tentativas de redução, recategorização ou extinção.
Uma proposta de lei que vise alterar o status de um território pode gerar uma corrida por terras na região: os grileiros ocupam e desmatam a floresta com a perspectiva de ganhar essa terra no futuro. É um negócio lucrativo, que vive das incertezas legais. Atualmente, tramita no Congresso uma PL com a intenção de desproteger uma parte da Unidade de Conservação.
3. Código Florestal
A última versão do Código Florestal (Lei de Proteção da Vegetação Nativa Brasileira) aprovada em 2012, não foi benéfica para a floresta. Entre outros motivos, porque reduziu a dimensão das áreas de APPs (Áreas de Preservação Permanente), permitiu projetos habitacionais em mangues e restingas, anistiou quem desmatou ilegalmente antes de 22 de julho de 2008, permitiu atividades econômicas em áreas íngremes e permitiu a redução da Reserva Legal em algumas condições ou dispensa de sua recuperação.
O lobby do agronegócio deveria ver isso como uma grande vitória, mas eles continuam a boicotar e sabotar o Código Florestal. Mesmo assim, é importante que, ao menos o que está previsto na lei, seja implementado. Entre elas, a validação do sistema de cadastro online (Sicar), que agiliza o processo para os proprietários de terras registrarem os limites de suas propriedades e as informações ambientais correspondentes.
O sistema melhora o monitoramento e a documentação de mais de 5 milhões de propriedades rurais, o que pode impulsionar drasticamente os esforços para preservação do meio ambiente. Finalmente, para ser eficaz, o Sicar deve ser vinculado a incentivos econômicos para os proprietários que conservam a vegetação nativa.
4. Alternativas de produção sustentáveis
A floresta em pé também gera renda. E gera renda sustentável. Diversos estudos mostram que as cadeias produtivas florestais geram mais benefícios do que as cadeias da soja ou carne na Amazônia. Com planos de manejo adequados e organização dos produtores locais, os recursos florestais, incluindo a madeira, podem garantir o sustento dos moradores. É preciso fomentar cadeias de produtos da floresta. É o caso do cogumelo Yanomami, do óleo de pequi do Xingu, da pimenta Baniwa, entre muitos outros produtos.
5. Financiamento para a conservação
No primeiro semestre de 2019, houve a paralisação do Fundo Amazônia, de ao menos R$ 2,2 bilhões. Com isso, inúmeras associações indígenas e de produtores rurais e projetos com foco em atividades econômicas tradicionais ficaram travados.
As propostas do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para o combate ao desmatamento são exatamente as medidas que estavam sendo financiadas pelo Fundo Amazônia (ações do PrevFogo, operações de fiscalização como a Operação Awá no Maranhão, e a implementação de ações do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal etc).
É urgente que o governo estabeleça uma relação de confiança com os doadores do Fundo para que os recursos possam ser disponibilizados novamente.
6. Restaurar e reflorestar florestas degradadas
Conter o desmatamento é mais efetivo do que plantar novas áreas. Mesmo assim, iniciativas de restauração florestal são muito importantes. O Brasil possui uma área equivalente ao estado de Minas Gerais em pastagens degradadas, o que mostra que o país não precisa desmatar novas áreas. Muitos produtores rurais precisam recompor áreas desmatadas ou degradadas para cumprir com a legislação prevista no Código Florestal, por exemplo.
Quanto custa ao governo manter a floresta em pé? É preciso avançar nessa quantificação para que o governo possa pensar um modelo mais sustentável para a Amazônia.
E o que você pode fazer?
Pequenas atitudes e mudanças de hábito contam, são importantes, imprescindíveis. Não pense que você é muito pequeno para fazer diferença. Faz, sim! Todos fazemos. Listamos abaixo, seis ações que podem ajudar a transformar o mundo e a evitar que a Amazônia se transforme em Savana, como profetiza o climatologista Carlos Nobre, há mais de dez anos. Ele já falou sobre isso em entrevistas para veículos diversos: National Geographic Brasil, BBC Brasil, e Carta Capital.
1. Consumo consciente
Informe-se antes de comprar móveis e joias e certifique-se que eles não vêm de nenhuma cadeia de produção ilegal, que envolva extração e garimpo A maior parte do ouro e da madeira retirados da Amazônia é ilegal. Busque produtos que fortaleçam cadeias de produção sustentáveis, como os produtos da floresta.
2. Apoie a luta dos povos da floresta
Povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais são os principais guardiões da floresta.
Nota do Conexão Planeta: Se há mata viva ainda é, certamente, porque os povos tradicionais as protegem, sabem conviver com ela, extraindo apenas o que precisam e respeitando seus ciclos, inclusive ao transferir suas aldeias, periodicamente, para não esgotar os recursos de uma determinada região.
3. Coma menos carne
Muitas áreas desmatadas da Amazônia acabam virando pasto para a produção agropecuária.
Nota do Conexão Planeta: Assista ao maravilhoso e necessário documentário Sob a Pata do Boi: como a Amazônia vira pasto. Ele está disponível na plataforma VideoCamp para exibições públicas – escolas e universidades, especialmente – a partir de inscrição. Se vocé quiser exibir o filme para um grupo de amigos ou em sua comunidade, justifique. Acompanhe a atualização dos espaços de exibição pela página do filme no Facebook. Ele também está disponível em plataformas on demand como NOW, iTunes, Google Play e Vivo Play.

4. Não compartilhe fake news
Ajude a combater a desinformação. Cheque antes de compartilhar qualquer notícia.
Nota do Conexão Planeta: Se desconfiar, pesquise as informações de forma incansável. Em geral, tudo que é exagerado, tanto em texto como em ilustração e fotografia, é falso. E, se quiser aprofundar sua pesquisa, consulte as agências de checagem, como a Lupa, a primeira especializada em fact-checking do país.
A Agência Pública também mantém um projeto de fact-checking – Truco -, desde 2014, para “verificar frases de políticos e de personalidades e ajudar a qualificar o debate público e aprimorar a democracia”. Vocé pode enviar sugestões de checagens por WhatsApp (11) 96488-5119 ou para o e-mail truco@apublica.org . Assista ao vídeo que a Pública produziu para explicar como funciona e porque esse a checagem de dados é importante.
5. Vote com consciência!
Se informe sobre as posturas e os votos do seu candidato.
Nota do Conexão Planeta: O governo Bolsonaro é um exemplo de como é imprescindível conhecer a fundo a trajetória do seu candidato para elegê-lo. Também é importante checar as condições de sua vitória num cenário em que o pior deles pode ser eleito, como aconteceu em 2018, na eleição presidencial. Por isso, estar bem informado sobre as opções que mais têm a ver com sua vida e com o que você acredita é vital. Sua cidade, seu estado e seu país podem cair nas mãos de pessoas inescrupulosas, que apostam em projetos desenvolvimentistas, o que vai contra os quatro pilares da sustentabilidade: ambiental, social, cultural e econômico.
6. Junte-se às organizações que fazem a diferença”
Conheça e apoie organizações que buscam combater as mudanças climáticas, proteger as florestas e defender os direitos humanos.
Nota do Conexão Planeta: As organizações não governamentais são imprescindíveis em qualquer sociedade democrática, consciente e sustentável. Elas realizam o trabalho que os governos não querem ou não têm capacidade (pela especialização) pra fazer. Mais: na maioria das vezes – e isso no âmbito federal, estadual ou federal – desenvolvem ações complementares às politicas publicas e podem checar se os governos estao atuando de maneira correta em determinados assuntos.
Sabemos que, desde que assumiu o governo e sempre que tem uma oportunidade, Bolsonaro procura desqualificar o trabalho realizado por ONGs, chamando-as de exploradoras, interesseiras e corruptas. Ele costuma usar a expressão “a farra das ONGs”, que é incansavelmente lembrada por admiradores nas redes sociais do Conexão Planeta, sempre que falamos do trabalho de alguma organização não-governamental. Pura falta de conhecimento.
Como em tudo na vida, é claro que existem ONGs mal intencionadas, mas, aqui, também, é preciso checar dados e informações para poder separar as organizações que trabalham de forma séria (e são inúmeras) das inescrupulosas. Apoiar o trabalho das ONGs – seja com divulgação, trabalho ou dinheiro – é uma forma de garantir a perenidade de sua atuação em beneficio da sociedade.
Foto do destaque: Instituto Socioambiental/Carol Quintanilha
Fotos: créditos indicados nas próprias imagens