Este ano, mais de 700 mil hectares do Pantanal – área que é seis vezes maior que a cidade do Rio de Janeiro – foram consumidos pelo fogo, deixando grande rastro de destruição ambiental, que inclui muitos animais. Em visita ao bioma, na segunda-feira (1) a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente e Mudança do Clima, anunciou que a Polícia Federal já estava investigando entre 18 a 19 focos de incêndio para descobrir sua autoria. Segundo ela, a ação humana é o que tem causado a maior devastação já registrada no bioma, cerca de 85%.
“O que tem de concreto é que nós sabemos quais são os focos, de onde surgiu a propagação [do fogo]. Nós trabalhamos com tecnologia altamente avançada, que não permite que haja falha em relação à origem desses focos”, observou a ministra.
“A gente não faz esse julgamento a priori, espera que a Justiça faça esse indiciamento, aí nós vamos verificar quem são os proprietários, quais são as fazendas, se foi um processo culposo ou doloso”, completou.
Hoje (3), o Ministério Público do Mato Grosso do Sul (MP/MS) anunciou que instaurou 11 inquéritos civis para apurar os incêndios ocorridos em Corumbá. E que onze fazendeiros (um deles é responsável por duas propriedades) serão investigados por serem proprietários de imóveis rurais (todos com CAR – Cadastro Ambiental Rural) nos quais os focos de incêndios começaram.
Caso seja provado que houve incêndio intencional, o fazendeiro responderá por crime ambiental (saiba quem são eles mais adiante).
O MP/MS integra grupo criado para apoiar as investigações sobre incêndios ilegais que não param de ocorrer no Pantanal. Nesse trabalho, os promotores contam com a ajuda de satélites que monitoram e identificam os focos de fogo.
Os dados utilizados referem-se ao mapeamento realizado entre 1º de maio e 30 de junho, que identificou 20 pontos de início de chamas em fazendas, em uma terra indígena e áreas isoladas em unidades de conservação.
De acordo com os promotores, entre as fazendas identificadas estão quatro reincidentes, ou seja, que já estiveram envolvidas em incêndios em anos anteriores.
O fogo começou nas 12 propriedades e se alastrou rapidamente, atingindo mais de 177 fazendas em todo o Pantanal e indo além. Ultrapassou a fronteira, atingindo áreas do Pantanal na Bolívia, onde também se alastra.
Fazendeiros e fazendas
Luiz Gustavo Battaglin Maciel é advogado (atende o traficante Fernandinho Beira-Mar) e responsável pela Fazenda Asturias, propriedade que teve maior área queimada de acordo com imagens obtidas pelo MP/MS. Ao G1, seu advogado enviou a seguinte nota:
“A defesa de LUIZ GUSTAVO BATTAGLIN MACIEL vem esclarecer, a propósito de inquérito civil instaurado pela 2ª Promotoria de Justiça de Corumbá (MS) que não consta, no mencionado inquérito, pelo que a defesa teve acesso até este momento, qualquer acusação ou suspeita de que tenha ocorrido irregularidade jurídico-ambiental na Fazenda Asturias, em Corumbá/MS, tratando de averiguação preliminar. Muito pelo contrário. A informação constante de relatório da Polícia Militar Ambiental, é de que, tendo se deslocado ao local, “não obteve êxito em apurar as reais causas, tampouco imputar responsabilidades a possíveis autores do ato infracional ambiental”, sugerindo que tal apuração deva passar por oportuna perícia técnica, sem a qual não há como se determinar as causas e o início das queimadas.
Deve ser consignado que o Ministério Público instaurou onze procedimentos administrativos (inquérito civis) no mesmo sentido, em relação a diversas propriedades rurais da região, visando a apurar se há alguma irregularidade ou responsabilidade dos proprietários sobre a ocorrência de queimadas, sendo já constatada em tais documentos que em áreas próximas à Fazenda Asturias verificou-se a ocorrência de queimadas anteriores àquele objeto do procedimento. Tal circunstância confirma o fato de que a Fazenda Astúrias foi vítima de queimadas oriunda de outros locais, tendo os colaboradores acionado imediatamente as autoridades competentes para combater a queimada, no que lograram êxito parcial, de vez que na Fazenda Astúrias resultaram danos (queima) em construção e veículos.
Dessa forma, a defesa salienta que LUIZ GUSTAVO BATTAGLIN MACIEL não é suspeito de “incendiar” ou “suspeito de fogo” em relação a propriedade mencionada, tendo sido aquela Fazenda mais uma das vítimas de queimadas oriundas de outros locais”.
O MP acionou o pecuarista Rubens Vedovato de Albres pela Fazenda Campo Enepê, em Corumbá. Ele tem terras também em Campo Grande e Aquidauana.
Albres disse ao G1 “que o incêndio começou por uma fatalidade, em razão de uma “queima científica”, devidamente autorizada com presença de bombeiros e brigadistas”. Ele conta que cedeu área da fazenda para núcleo de estudos da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), mas, “no dia da queima, o fogo saiu do controle e consumiu mais de 170 hectares”.
Os demais proprietários são:
– Agrícola, Ambiental e Florestal Geotécnica LTDA e Machetto Empreendimentos, da Fazenda Pantaneira;
– AIP & LVP Holding e Participações, da Fazenda Angical;
– Décio Sandoval de Moraes, das fazendas Bahia Bonita e Ypê;
– Fabiano Fernandes Chagas, da Fazenda Piuvinha;
– Felizardo do Carmo Antar Mohammed, da Fazenda Mamoeiro;
– José Romero e José Arruda, da Fazenda Alegrete;
– Ricardo Augusto de Souza e Silva, da Fazenda Nossa Senhora das Graças;
– Tereza Cristina Ribeiro Ralston Botelho Bracher (esposa do ex-presidente do Banco Itaú), da Fazenda Santa Tereza, que também registrou grandes incêndios em 2020 e 2021, segundo a Repórter Brasil.
E ainda há uma propriedade em Dom Bosco, Corumbá, que não tem registro no CAR, por isso, o nome do proprietário ainda está sendo investigado.
Sem permissão
Segundo o MP/MS, os fazendeiros serão investigados por incêndio sem autorização ambiental no Pantanal. Isto porque algumas áreas têm permissão para fazer queimadas, mas, durante a temporada de seca, a atividade fica automaticamente suspensa.
Após a identificação, a Polícia Militar Ambiental foi acionada para executar as vistorias e apresentar relatórios ao MP. O órgão declarou que, de 14 vistorias, 12 não souberam identificar como o fogo começou. E ainda teve o caso de um proprietário que registrou B.O. (boletim de ocorrência) pois o incêndio, em suas terras, começou logo depois que um funcionário usou fogo para controlar abelhas.
De acordo com o MP, a dificuldade em identificar o início do incêndio acontece devido, principalmente, ao tempo entre o início das chamas e a fiscalização, que costuma ser de 14 dias. Mas, mesmo assim, desde que atua nas investigações de incêndios na região (2022), o MP já aplicou mais de R$ 24 milhões em multas.
Os fazendeiros têm dez dias úteis para procurar o MP/MS e explicar o que ocorreu em suas terras no Pantanal, a partir da data da notificação.
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Foto (destaque): Joedson Alves/Agência Brasil
Com informações do MP/MS, G1, Campo Grande News