
Na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla) é classificado como vulnerável à extinção, ou seja, a população da espécie está sendo reduzida gradualmente. Esse mamífero de focinho estreito e comprido e rabo longo pode ser observado em diversos países das Américas do Sul e Central, entre eles, o Brasil. Entretanto, em muitas regiões ele foi extinto localmente, como nos estados de Santa Catarina, Espírito Santo e Rio de Janeiro.
Onde o tamanduá-bandeira ainda é encontrado em território brasileiro, ele sofre com uma série de ameaças, como a perda de habitat, incêndios florestais, atropelamentos e a contaminação por agrotóxicos. E agora, para aumentar a preocupação de especialistas que trabalham pela proteção da espécie, um estudo revelou a ocorrência de vírus dos gêneros influenza A em amostras coletadas desses animais, de vida livre, no Pantanal do Mato Grosso do Sul.
É a primeira vez que se tem conhecimento da exposição e infecção natural de tamanduás-bandeira a esses vírus na vida selvagem. Apesar de todos os indivíduos que passaram por exames estarem assintomáticos, há uma probabilidade de que a espécie seja suscetível a subtipos de influenza de origem humana e aviária.
Existem quatro tipos de vírus A, B, C e D. A e B são responsáveis por epidemias sazonais, e o A, em geral, causador de grandes pandemias. O H5N1, por exemplo, é o que provoca a gripe aviária.
No monitoramento realizado com os tamanduás no Pantanal, os resultados mostraram um padrão de prevalência do subtipo H3N2.
“A exposição a novos patógenos pode ser mais um fator de estresse, comprometendo a saúde e capacidade de sobrevivência dos tamanduás”, alerta Isabella Amaral, aluna de mestrado da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), principal autora do estudo. Ela usou amostras coletadas por tamanduás monitorados pelo Projeto Órfãos do Fogo, criado pelo Instituto Tamanduá.
“A microbiota do Pantanal pode estar mudando por causa do impacto do fogo. Assim como temos vistos mudanças na vegetação, com o aumento de uma vegetação mais arbustiva após as queimadas, também pode estar ocorrendo uma alteração de patógenos – bactérias, vírus e fungos que antes existiam e agora não existem mais e o surgimento de outros mais adaptados a esse novo ambiente”, diz a médica veterinária Flávia Miranda, fundadora e presidente do Instituto Tamanduá, e orientadora do trabalho da pesquisadora.
Abaixo a entrevista com Isabella, que nos contou maiores detalhes sobre o estudo.
Como aconteceu essa descoberta? Exames de rotinas em tamanduás?
Ocorreu a partir da coleta de amostras biológicas de tamanduás-bandeira na sub-região do Pantanal de Aquidauana, como parte do Projeto Órfãos do Fogo. Foram realizados testes laboratoriais, incluindo RT-PCR e inibição da hemaglutinação (HI), para detectar a presença do vírus da influenza A. O estudo tinha como objetivo investigar a ocorrência dos vírus da influenza A em tamanduás-bandeira, sendo motivado pela necessidade de entender a presença desses vírus em mamíferos silvestres e suas possíveis implicações para a conservação da espécie.
Apesar de os animais não apresentarem sintomas, há motivos de preocupação? Por que?
Mesmo que os animais estivessem assintomáticos, há motivos de preocupação, pois a presença do vírus da influenza A em tamanduás-bandeira pode representar um risco para a conservação da espécie. Esses animais já enfrentam diversas ameaças, como perda de habitat, atropelamentos e incêndios florestais.
A exposição a novos patógenos pode ser mais um fator de estresse, comprometendo sua saúde e capacidade de sobrevivência. Além disso, a falta de estudos sobre o impacto da Influenza A e outras doenças em tamanduás-bandeira dificulta a avaliação dos riscos a longo prazo para as populações.
Existem outros relatos na ciência de casos de influenza A em animais silvestres?
Já foram documentadas infecções por influenza A em várias espécies de mamíferos silvestres, incluindo as famílias Mustelidae, Procyonidae, Sciuridae, Viverridae, Canidae, Felidae e Suidae. Em 2007, tamanduás-bandeira do zoológico de Nashville, nos Estados Unidos, foram diagnosticados com influenza A do subtipo H1N1 humano (com sinais clínicos do sistema respiratório).
No entanto, até o momento, não havia registros na literatura sobre a exposição natural de tamanduás-bandeira ao vírus da influenza A na natureza, tornando a pesquisa um dos primeiros relatos nesse contexto.
Há alguma suspeita de como os tamanduás se contaminaram ou se passam para outros indivíduos da espécie?
O contato com ambientes onde há circulação do vírus ou contato indireto com animais domésticos e humanos infectados pode ser uma possível fonte de transmissão.

Foto: divulgação Instituto Tamanduá
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Foto de abertura: Diogo Luiz, CC BY-SA 4.0 via Wikimedia Commons