A noite da quarta-feira, 24/05, marcou um retrocesso na área ambiental brasileira. Depois de todas as expectativas colocadas sobre a nova gestão federal, alavancadas pela promessa do presidente Lula em fortalecer a questão ambiental, os parlamentares conseguiram “passar a boiada” no Congresso. Uma comissão mista aprovou por 15 votos a 3 o relatório que altera a Medida Provisória (MP) 1154 – sobre a estrutura administrativa do governo -, tirou a Agência Nacional de Águas (ANA) e o Cadastro Ambiental Rural (CAR) do Ministério do Meio Ambiente e a demarcação de terras do Ministério dos Povos Indígenas. Com isso ficam esvaziadas as pastas das ministras Marina Silva e Sônia Guajajara (leia mais aqui).
Ex-ministros do Meio Ambiente criticaram com veemência a punhalada dada pelo Congresso. E alertam sobre o impacto que a notícia terá no cenário internacional, onde Lula afirma que o Brasil voltará a ser uma liderança na área ambiental.
“É um desastre para a reputação [do Brasil]”, lamentou Izabella Teixeira, que comandou a pasta entre 2010 e 2016, em entrevista à coluna de Chico Alves no portal UOL. “Um esvaziamento grave na possibilidade de ocupar a liderança mundial na questão ambiental”.
Ela considera a MP 1154 um erro.
“Fragiliza a gestão ambiental pública federal, em particular, na agenda de recursos hídricos e da integridade dos instrumentos de Política Nacional de Meio Ambiente, como o CAR”, analisa.
Ministro do Meio Ambiente no período de 2008 a 2010, o atual deputado estadual pelo Rio de Janeiro, Carlos Minc, afirma que a aprovação da medida provisória é um balde de gelo nas expectativas geradas após a posse de Lula. Deixam de fazer parte ainda do Ministério do Meio Ambiente o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir) e o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (Singreh).
“A lógica disso é enfraquecer a questão ambiental, o ministério e a Marina. É um péssimo sinal para o mundo. Depois do período de governo de Jair Bolsonaro, em que o Brasil foi pária ambiental, a expectativa era grande com a volta de Lula e Marina”, ressalta.
O desgaste não cairá apenas sobre o Brasil, mas também sobre a ministra.
“Como percorrer o mundo inteiro e dizer que vai ser a defensora do clima, pedir recursos para o Fundo Amazônia? Vão dizer que o Ibama decide uma coisa e todo mundo contesta, que o ministério foi desestruturado… É uma situação muito ruim”, acredita Minc.
Outro que repudiou o comportamento antiambiental do Congresso foi Rubens Ricúpero, que foi ministro entre 1993 e 1994.
“É praticamente uma volta ao tempo do Ricardo Salles. São transformações de fundo bolsonarista, com a exclusão de várias áreas, como CAR e a ANA. É uma forma de amarrar as mãos do novo governo, que ganhou a eleição e tem o direito de se organizar como deseja. O Poder Legislativo não tem o direito de impor uma estrutura, isso é algo condenável, uma ação bolsonarista em associação com o Centrão”, destaca.
Para Ricúpero a Câmara é dominada por parlamentares reacionários, nem um pouco preocupados em proteger a biodiversidade do país. “É um grupo que não representa a opinião pública brasileira. As pesquisas mostram que quase 90% da população é a favor da preservação ambiental”.
*Com trechos de entrevistas concedidas ao jornalista Chico Alves
Fotos de abertura: Izabella Teixeira e Carlos Minc, reprodução Instagram, e Rubens Ricúpero UNCTAD/Creative Commons/Flickr