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Pesquisadoras encontram antas em regiões da Caatinga onde a espécie era considerada extinta

Em 2012, a anta brasileira (Tapirus terrestres) foi declarada extinta na Caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro e talvez o mais frágil do país

Alguns mistérios envolviam o desaparecimento desta espécie muito ameaçada no Cerrado,na Mata Atlântica e no Pantanal, mas foram desvendados pelas pesquisadoras da INCAB – Iniciativa Nacional para a Conservação da Anta Brasileira do IPÊ -Instituto de Pesquisas Ecológicas (INCAB-IPÊ) durante três expedições de campoem três anos consecutivos: 2023, 2024 e agora, em março.

E, finalmente, elas podem afirmar: a anta não está extinta na Caatinga! Ameaçada, sim; extinta, não.

Foto: INCAB-IPÊ / divulgação

Patrícia Médici, uma das maiores especialistas da espécie no mundo e coordenadora da INCAB-IPÊ, e a veterinária Alexandra Tiso, acompanhadas por Raquel Alves, que registrou tudo para divulgação, encontraram populações da espécie na Caatinga do norte de Minas Gerais, do oeste da Bahia e do sul do Piauí

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Alexandra Tiso, Raquel Alves e Patrícia Médici, a equipe da terceira expedição no Piauí
Foto: Alexandra Tiso / INCAB-IPÊ / divulgação

Trata-se de uma importante descoberta para o status de conservação da espécie no Brasil e para a atualização da Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas de Extinção do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (Imbuo), que será realizada este ano. Afinal, a anta não está ‘localmente extinta’ na Caatinga, como indica a publicação. 

E os dados coletados ainda devem ser utilizados para o estabelecimento de estratégias do PAN Ungulados, o Plano de Ação Nacional (PAN) para Conservação dos Ungulados – grupo que inclui a anta, o porco-do-mato (ou queixada) e veados (campeiro, cervo-do-pantanal etc) -, também do ICMBio, que realizará o segundo ciclo este ano. 

“Uma extinção local, para qualquer espécie, é uma situação muito seria. Declínios populacionais e extinções locais apontam para o comprometimento do estado de conservação de uma dada espécie”, explica Patrícia Medici. 

“Os dados coletados durante as expedições trouxeram evidências robustas de que a anta não está extinta na Caatinga. Sabemos que devem ter ocorrido declínios populacionais importantes, mas tudo indica que a anta nunca se extinguiu, de fato, na região”, declara a pesquisadora.

Em busca da anta perdida

O envolvimento da INCAB-IPÊ com a anta na Caatinga teve início em 2012, quando um grupo de pesquisadores, incluindo integrantes da organização, foi convidado pelo ICMBio para avaliar o status de conservação dos ungulados brasileiros para a elaboração da Lista Vermelha Nacional. 

“Realizamos uma avaliação nacional e outra por biomas. Os profissionais que estavam presentes, eu incluída, listaram a anta como ‘Regionalmente Extinta’ na Caatinga, pois os poucos dados disponíveis apontavam para isso”, conta Patrícia.

“A partir daí, refletimos muito sobre essa tomada de decisão com base em tão poucas informações e surgiu o desejo de percorrer a Caatinga em busca de dados mais consistentes sobre o histórico da anta na região, seu passado, mas, também, seu presente”, arremata.

Foram necessários 11 anos após a avaliação da Lista Vermelha para que a ideia saísse do papel e uma equipe de pesquisadores realizasse a primeira viagem com recursos financeiros obtidos por meio de crowdfunding (como contei aqui). Ao projeto foi dado um título muito simpático: Em Busca da Anta Perdida. 

A primeira expedição 

O objetivo da primeira expedição era resgatar a memória das pessoas sobre a anta no bioma e coletar informações sobre a potencial presença atual da espécie na região. 

A equipe formada por oito pessoas percorreu cerca de 10 mil km em 31 dias, passando por diferentes regiões da Caatinga nos estados de Minas Gerais, Bahia e Piauí. 

Todas as localidades onde havia indícios da existência histórica ou atual da anta, tanto no centro quanto nas bordas do bioma, foram visitadas, e a pesquisa foi baseada em entrevistas com moradores locais, em grande parte idosos, que tinham histórias para contar ou poderiam resgatar relatos de seus antepassados. 

A equipe chegou à conclusão de que a anta esteve presente no bioma no passado. Por meio dos relatos de moradores locais mais antigos, foi possível retroceder até cerca de 400 anos na história. 

Ela vivia em regiões mais centrais da Caatinga, tais como a Chapada Diamantina, na Bahia, mas suas populações foram dizimadas devido à perda de habitat, à caça e à diminuição da disponibilidade de água. 

Nesta expedição também foi possível coletar indícios sobre a presença atual da espécie nas bordas do bioma, na interface com o Cerrado, mas os pesquisadores voltaram para casa cheios de dúvidas. 

A segunda expedição

Em 2024, o objetivo era investigar mais a fundo algumas áreas especificas pelas quais os pesquisadores haviam passado durante a primeira viagem. 

Fernanda Jacoby, Patrícia Medici, Zé Preto – mateiro que as acompanhou -,
Alexandra Tiso e Raquel Alves, durante as descobertas da segunda expedição
Foto: Raquel Alves / INCAB-IPÊ / divulgação

Durante 20 dias, a equipe – reduzida a quatro pessoas (foto acima) – percorreu cerca de 6 mil km na região oeste da Bahia e no entorno do Parque Nacional da Serra das Confusões, no Piauí, e a presença atual da anta pode ser determinada devido a sinais do animal detectados pela própria equipe e por meio de vídeo proveniente de armadilha fotográfica. 

Como contei aqui, esta foi a expedição que comprovou que a anta não está extinta na Caatinga!

Patricia Médici apresenta a pegada de anta
Foto: INCAB-IPÊ / divulgação

A terceira expedição 

Na última expedição, realizada no mês passado, as pesquisadoras levantaram informações ainda mais consistentes sobre as populações atuais da espécie nas três regiões exploradas na primeira viagem: norte de Minas Gerais, oeste da Bahia e sul do Piauí.

Patrícia Médici na expedição à Bahia
Foto: INCAB-IPÊ / divulgação

Na Bahia e no Piauí foram encontradas quatro potenciais populações de antas, duas em cada estado. Mas, a feliz descoberta da anta no bioma deixou evidentes as principais ameaças: a caça, o fogo e a crise climática, que podem colocar a espécie em risco novamente.

Além disso, a viagem deste ano indicou que as antas encontradas na Caatinga são residentes e não estão apenas de passagem pelo bioma. 

Pegadas de anta na Bahia
Fotos (acima e abaixo): INCAB-IPÊ / divulgação

Agora, com todas as informações coletadas, as pesquisadoras poderão se estabelecer no bioma por um tempo para compreender melhor a situação da anta na região. E, a partir daí, definir o que pode ser feito em prol de sua conservação, pra que nunca mais ela corra o risco de extinção

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Leia também:
– Pesquisadoras encontram vestígios e avistam anta na Caatinga: espécie não está extinta no bioma!
– Em busca da anta perdida: pesquisadores querem descobrir porque espécie sumiu da Caatinga
Pesquisadores identificam presença histórica da anta em região conhecida como Boqueirão da Onça/BA

Foto: Raquel Alves (pegada de anta na Bahia)

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