Agora, não será mais tão fácil diferenciar as cobras corais-verdadeiras das ‘falsas’ levando em conta apenas o padrão e as cores mais comuns, com anéis alaranjados e amarelos, combinados a pretos e brancos. Como revelam as imagens dos biólogos Paulo Berarde e Luiz Carlos Turci, que ilustram este post, a nova espécie fugiu desse padrão e apresenta outros desenhos e cores entremeando o preto. Os dois pesquisadores são responsáveis pela investigação e pela descoberta realizadas na Amazônia, e ganharam destaque internacional com a publicação de artigo em revista cientifica alemã.
A pesquisa de Berarde e Turci começou em 2001. Já nesse ano, junto com outros especialistas, eles coletaram o primeiro exemplar de Micrurus boicora (na foto que abre este post e na foto abaixo, ambas de Luiz Carlos Turci; o nome indígena tupi-guarani significa ‘cobra coral’). E os estudos sobre a nova cobra-coral continuaram por mais de dez anos. Turci contou que eles começaram a trabalhar na descrição em 2009 e contaram com a colaboração de outros pesquisadores que doaram espécimes. “Reunimos oito exemplares emprestados de corais-verdadeiras para a pesquisa”. Nessa etapa, o pesquisador trabalhou em parceria com outros três: Luiz Carlos Batista, Arthur Diesel Abegg e Fancisco Luís Franco.
Em entrevista ao site G1, Berarde falou sobre a importância de estudos como este, que ampliam o “conhecimento sobre a diversidade de serpentes no Brasil”, evitando que muitas espécies ainda não descritas ou catalogadas pela ciência se percam. “Elas podem estar desaparecendo antes mesmo de serem descobertas”, alertou. “Agora, temos mais uma espécie de serpente de interesse médico no país, apesar de os acidentes ofídicos com corais serem relativamente raros”.
E Berarde chamou a atenção para o fato que destaquei no inicio deste texto. Os “macetes populares” – como ele chama o sábio conhecimento do povo – não poderão mais ser levados em conta no caso das corais-verdadeiras. Agora, não é só a espécie mais conhecida (na foto abaixo, de Paulo Berarde) que representa perigo. Segundo o biólogo Turci, “a inexistência de anéis amarelos ou alaranjados ajudou a diferenciar a nova espécie das demais”, mas a identificação entre as cobras-corais nem sempre é fácil. A espécime da segunda foto abaixo (de Luiz Carlos Turci) – com anéis azuis -, encontrada na Amazônia, é um exemplo.
“Quando fui apanhar o primeiro exemplar, pensei que não se tratava de uma coral-verdadeira, devido ao padrão de colorido, que difere muito do defensivo de enrodilhar a cauda, comportamento de defesa ente as corais”, conta.
O pesquisador acrescentou: “Algumas espécies apresentam características bem evidentes, diferenciando-as das demais. Outras, no entanto, possuem diferenças sutis, o que dificulta a identificação e até demanda ferramentas adicionais para o processo de descrição, como estudos moleculares”. Seria como se a natureza aprontasse algumas “pegadinhas”. Por isso, é preciso disseminar muito essa descoberta.
Se a biologia e a composição do veneno das corais são pouco conhecidas, estudos já revelaram alguns detalhes de sua alimentação, que inclui pequenas cobras e lagartos. “Acreditamos também que o veneno tenha ação neurotóxica (que afeta o sistema nervoso e o controle muscular), assim como outras espécies próximas do gênero”, explicou Turci.
Fotos: Luiz Carlos Turci (abertura, segunda e última fotos) e Paulo Berarde (segunda foto)