
Por Juliana Vicentini*
Quando, em 2013, Jorge Mario Bergoglio tornou-se papa e adotou o nome Francisco, o gesto foi mais que simbólico: evocou a figura de São Francisco de Assis — padroeiro dos animais, dos pobres e do meio ambiente — e sinalizou uma orientação ecológica e social inédita no papado. A partir dali, cresceu a expectativa de que o Vaticano assumisse um papel ativo frente à crise climática. E foi exatamente isso que aconteceu.
Após dois anos como papa, Francisco redigiu a encíclica Laudato Si’ (Louvado sejas). Na carta, ele considera o planeta como a casa comum de todos e aborda temas importantes: crise ambiental; mudança climática; interligação entre meio ambiente, economia e sociedade; crítica ao consumismo; convite à ação individual e coletiva rumo à sustentabilidade.
Francisco apoiou eventos globais sobre o meio ambiente. Ainda em 2015, ele endossou o Acordo de Paris (tratado sobre mudanças climáticas) e incentivou líderes mundiais a assumirem compromissos nas Conferências das Partes (COP) da Organização das Nações Unidas. Inclusive, redigiu uma mensagem para a COP26 pedindo ações urgentes e concretas contra a crise climática.
O pontífice se reuniu com participantes do Encontro de Líderes das Principais Empresas de Petróleo e Gás Natural, como ExxonMobil, Shell, BP e Eni, realizado no Vaticano em 2018. O papa discursou sobre a responsabilidade socioambiental daquelas corporações e a respeito da importância pela busca por fontes de energias alternativas e limpas, em detrimento aos combustíveis fósseis.
No ano de 2019, o Papa Francisco convocou os bispos da Igreja Católica para a assembleia intitulada “Sínodo para a Amazônia”. O objetivo era discutir os desafios sociais, ambientais, culturais e econômicos enfrentados pelos povos amazônicos. Ele fez um apelo solicitando políticas públicas e colaborações entre diversos segmentos e atores para a preservação da floresta e proteção à sua gente.
“Fé e Ciência: Rumo à COP26” foi um encontro entre o papa e cientistas, realizado em 2021. O pontífice destacou a relevância do diálogo respeitoso entre Igreja e ciência na defesa da natureza e no cuidado com as pessoas. Um dos desdobramentos foi a assinatura de um documento que apelava ao mundo a emissão zero de carbono para evitar o aumento das mudanças climáticas.
O papa redigiu ainda uma segunda encíclica em outubro de 2023, chamada de Laudate Deum (Louvai a Deus). Nestes escritos, Francisco reforçou o conteúdo da Laudato Si’ e convocou líderes mundiais para ações mais concretas e urgentes em relação ao planeta. A carta contemplou a crise climática, criticou o paradigma tecnocrático, apontou a fragilidade da política internacional, sintetizou êxitos e fracassos das COPs e propôs motivações espirituais para a sustentabilidade.
Em 12 anos como papa, Francisco deixou um legado teológico, político e simbólico que demonstra como a Igreja pode exercer um papel relevante e mobilizador frente à urgência planetária. Com seu engajamento, ele sinalizou que as mudanças climáticas não devem ser abordadas do ponto de vista técnico, apenas, mas sim, incluírem aspectos morais e de justiça social. Lideranças religiosas devem aproveitar sua influência e a quantidade de devotos por todo o planeta para propagar ensinamentos, conscientizar as pessoas e mobilizá-las para a sustentabilidade.
Ao dizer que o planeta é nossa casa comum, Francisco não apenas fez teologia — ele fez um apelo civilizatório. O desafio agora é saber se ainda temos tempo para atendê-lo.
*Artigo publicado pela Agência Bori em 24/04/25. Juliana de Oliveira Vicentini é doutora em ecologia aplicada pela USP e especialista em jornalismo científico pela Unicamp.
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Foto de abertura: divulgação Vatican News (Papa Francisco no Fórum dos Povos Indígenas, no Peru, em 2018).