Houve um tempo, em um passado distante – há alguns poucos milhões de anos -, quando criaturas muito semelhantes às modernas Seriemas (Cariama cristata), mas, com até três metros de altura, eram os predadores dominantes na América do Sul.
No início do período Terciário, enquanto os mamíferos passavam por uma explosão evolucionária, diversos grupos de aves expressaram uma tendência ao gigantismo e, enquanto algumas famílias se tornaram herbívoras, outras deram origem a alguns dos animais mais vorazes do planeta.
Consegue imaginar como seria este mundo perdido? Não? Se imagine caminhando por um campo nos Pampas do Rio Grande do Sul, em uma bela manhã ensolarada de sábado e, ao longe, na linha do horizonte, você percebe duas ou três silhuetas maiores que a avestruz (Struthio camelus) mas, com enormes cabeças de águia e bicos que poderiam dilacerar seu corpo ao meio.
Bem-vindo a era das Aves do Terror, já compiladas em livros científicos como Neogene Birds of South America ou Living Dinosaurs. Eram espécies de aves que, para nós humanos, seriam mais próximas de seres literalmente criados para filmes de ‘terror’ do que de animais que, um dia, realmente existiram. É sobre elas que quero falar hoje. Das aves mais poderosas que, um dia, já caminharam sobre a Terra.
Paraphysornis
O Paraphysornis brasiliensis era uma gigantesca espécie de ave carnívora que viveu há, aproximadamente, 23 milhões de anos, no Sudeste do Brasil. Um animal impressionante que, segundo os pesquisadores, tinha um crânio de 60 centímetros de comprimento, chegava a medir até 2,40 metros de altura e a pesar até 180 quilos.
Estudos como o Supplemented feeding strategies for the osmoregulation of Paraphysornis brasiliensis, baseados em sua possível taxa metabólica e balanço hídrico, indicam que os Paraphysornis brasiliensis se alimentavam, basicamente, de algumas espécies já extintas de pequenos cavalos selvagens.
Na cidade do Rio de Janeiro, no Museu Nacional, está em exposição uma réplica do esqueleto completo dessa espécie. O original encontra-se depositado no Museu de Ciências da Terra, também no Rio de Janeiro, o mesmo que fora originalmente descoberto entre 1976 e 1978, no município de Tremembé, São Paulo e descrito pelo ornitólogo Herculano Alvarenga posteriormente, em 1982.
Kelenken
Em estatura, o Kelenken guillermoi é considerado a maior de todas as espécies de ‘Aves do Terror’ já descobertas pelos cientistas. Estes gigantes habitavam a província do Rio Negro, na Argentina, há aproximadamente 15 milhões de anos atrás.
Segundo a cientista Dra. Sara Bertelli, que descreveu a espécie, os Kelenken possuíam o maior crânio entre todas as aves do grupo, com 71,6 centímetros de comprimento, e seu bico media 45,7 centímetros.
Pesquisadores – como Ernesto Blanco, no artigo Terror birds on the run: a mechanical model to estimate its maximum running speed -, estimam que, graças à anatomia peculiar, os indivíduos desta espécie poderiam atingir velocidades acima dos 90 quilômetros por hora. Ou seja, eram praticamente tão rápidas quanto o mamífero terrestre mais rápido ainda vivo hoje, o Guepardo (Acinonyx jubatus).
Titanis
O Titanis walleri viveu aproximadamente entre 5 e 1,8 milhões de anos atrás, na América do Norte. É descendente direto de outras espécies de ‘Aves do Terror’ que se originaram na América do Sul e, posteriormente, migraram para a América do Norte após o surgimento do istmo do Panamá.
Seus fósseis foram descobertos nos depósitos do Rio Santa Fé, na Flórida, e descritos por Pierce Brodkorb, em artigo para a revista The Auk. Algum tempo mais tarde, um outro exemplar foi encontrado no Texas por Jon Baskin.
Segundo o artigo The giant flightless bird Titanis walleri (Aves: Phorusrhacidae) from the Pleistocene coastal plain of south Texas, publicado por Baskin, os Tinanis walleri alcançavam facilmente os 2 metros de altura e pesavam até 150 quilos.
Neste mesmo sítio, foram encontrados inúmeros fósseis de outras espécies, incluindo cavalos de pequeno porte do período Plioceno, possivelmente parte integral da dieta do colossal Titanis. Seu crânio media nada menos que 60 centímetros de comprimento e, curiosamente, possuía garras na ponta das asas, uma possível adaptação à caça.
Phororhacos
Os primeiros fósseis de Phororhacos longissimus foram descobertos na Formação de Santa Cruz, na Argentina. Estima-se que viveram há aproximadamente 9 milhões de anos, em planícies e planaltos, florestas e pastagens do sul da América do Sul.
Seus fósseis foram descobertos em 1887 por Florentino Ameghino e, inicialmente, descritos como partes da mandíbula de mamíferos da Megafauna, pertencentes a família dos Edentados. Já em 1891, após encontrar novos fragmentos de ossos, este mesmo autor descreveu a espécie como uma ‘gigantesca ave’.
Estas aves carnívoras apresentavam 2,5 metros de altura e pesavam até 150 quilos, tendo tamanho próximo ao do Avestruz (Struthio camelus), porém, com uma cabeça muito maior e um bico do mesmo formato e tão afiado quanto o das águias.
No artigo Remarks on the Stereornithes, a Group of Extinct Birds from Patagonia, publicado na revista científica The Ibis, o pesquisador Chas Andrews, ressalta que, com base nas características anatômicas dessa espécie (hoje, extinta), seus parentes mais próximos vivos, hoje, são as Seriemas (Cariama cristata).
Gastornis
O Gastornis giganteus habitava as planícies da América do Norte, tinha mais de dois metros de altura e um crânio proporcional ao dos cavalos atuais, medindo 70 centímetros de comprimento. Como as demais espécies de ‘Aves do Terror’, não voava, mas corria velozmente.
A espécie foi descrita pelo cientista Edward Drinker Cope, em 1876, como Diatryma giganteus, com base em material fóssil encontrado no Novo México, nos Estados Unidos.
Por seu tamanho de proporções gigantescas e seu bico robusto e extremamente poderoso, por décadas os cientistas consideraram a espécie como predadora, exclusivamente carnívora, capaz de esmagar sua presas com golpes proferidos por seu bico.
Entretanto, em 29 de Agosto de 2013, durante a “Goldschmidt Conference”, o pesquisador Thomas Tütken, da Universidade de Bonn, na Alemanha (uma das mais renomadas conferências científicas da Europa), apresentou evidências de que, na verdade, esta ‘Ave do Terror‘ seria um Gentil Vegano.
Graças ao avanço da tecnologia, através da análise de isótopos de cálcio presentes em ossos fossilizados, a equipe de Tütken obteve sucesso em quantificar, com precisão, a proporção de material animal e vegetal que compunham sua dieta.
Já em 2014, a paleontóloga Delphine Angst publicou o artigo Isotopic and anatomical evidence of an herbivorous diet in the Early Tertiary giant bird Gastornis. implications for the structure of Paleocene terrestrial ecosystems. Neste estudo, a pesquisadora confirmou, por meio da análise de isótopos de carbono, que o Gastornis era herbívoro.
Ficou curioso? Quer conhecer mais sobre estas magníficas aves que dominaram o continente americano? Então, assista abaixo ao documentário Terror Bird.
Show! Curti muito essa matéria.
Excelente matéria.
MUITO LÔCO