Há quase um ano Rita Lee nos deixou, deixando conosco um legado de amor à natureza e aos animais. A rainha do rock, como era conhecida carinhosamente, falou da urgência de protegermos o planeta nos anos 80, quando criou uma coleção de livros infantis com o personagem Dr. Alex, um ratinho pacifista e ambientalista, e anos mais tarde, escreveu sobre a emocionante história da ursa Rowena.
Mas Rita também tinha uma ligação com serpentes. Na década de 70, resgatou duas jiboias usadas no show do roqueiro Alice Cooper, em São Paulo, pois acreditava que elas estavam sendo mal-tratadas, e nos anos 2000, ela se vestiu de naja para cantar um de seus maiores sucessos, Erva Venenosa. Quem não lembra do refrão:
“Venenosa, ê
Erva venenosa, ê
É pior do que cobra cascavel
Seu veneno é cruel”
Pouco mais de um mês após Rita falecer, em maio de 2023, o Museu Biológico do Instituto Butantan, em São Paulo, recebeu um casal de víboras-de-lábios-brancos (Trimeresurus insularis), que tinha sido apreendido pela Polícia Rodoviária Federal, junto com mais de 50 animais, dentro de um ônibus na Bahia.
As serpentes não são nativas do Brasil, mas da Indonésia, na Ásia. Entraram no país ilegalmente. Medindo cerca de 65 centímetros e pesando em torno de 60 gramas, a espécie arborícola (que vive em árvores), a grande maioria dessas víboras são esverdeadas, entretanto, em algumas ilhas da Indonésia elas podem ser azuis.
Foi o caso do casal do Butantan. E logo que a fêmea e o macho chegaram ali a equipe do museu logo reparou nos olhos avermelhados das cobras, que faziam lembrar o cabelo da mesma cor da nossa rainha do rock. E o que dirá então da cor azul do corpo, a mesma dos olhos de Rita?
“Essa serpente é a nossa ‘ovelha azul’, porque ela é muito diferente, assim como a Rita, que foi inovadora nas ideias, na música e na conservação do meio ambiente através de seus livros. Quisemos fazer essa homenagem pela influência tão importante dela na nossa cultura, especialmente para as mulheres, e para incentivar as meninas a se interessarem mais por ciência”, diz Erika Hingst-Zaher, pesquisadora e diretora do Museu Biológico do Butantan.
O azul é resultado de um polimorfismo de cor, ou seja, uma variação por questões ambientais e evolutivas
Foto: José Felipe Batista/Comunicação Butantan
Espécie venenosa
Infelizmente, a fêmea da víbora-de-lábios-brancos do Butantan morreu. Assim como outros animais vítimas do tráfico, as duas cobras estavam em péssimas condições. Contudo, o macho conseguiu se recuperar.
“Montamos um espaço com galhos de árvores e vegetação semelhante ao habitat natural da espécie para ajudar na adaptação. Ele ficou uns dias sem querer se alimentar e praticamente não se locomovia até se sentir seguro. Mas agora já está se alimentando normalmente”, conta Silvia Cardoso, pesquisadora científica e coordenadora de manutenção animal do museu.
Ela explica ainda que a espécie é venenosa. A picada pode causar uma ação local, como a necrose na pele, ou hemorragias, mas não tem efeito neurotóxico, que afeta o sistema nervoso.
O Butantan, maior produtor de soros antivenenos da América Latina, agora tem algumas ampolas de antídoto para a picada da víbora asiática porque possui um espécime. Do contrário, o instituto só produz imunizantes contra venenos de espécies que ocorrem no Brasil.
“É uma grande irresponsabilidade trazer estas serpentes dessa forma, sem qualquer cuidado com o animal e com risco de ocorrer acidentes sem o devido antiveneno disponível”, alerta Silvia.
O Museu Biológico, localizado no Parque da Ciência Butantan, fica aberto ao público de terça a domingo, das 7h às 17h.
Em seu habitat original, a espécie vive no topo das árvores, raramente descendo ao chão
Foto: José Felipe Batista/Comunicação Butantan
*Com informações e entrevistas contidas no texto de divulgação do Portal Butantan
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Foto de abertura: José Felipe Batista/Comunicação Butantan