Saudoso Cerrado

Sou fascinado pelo Cerrado. Este, que é um dos mais importantes biomas do planeta, sempre foi palco dos meus principais trabalhos de documentação. Não é à toa que já publiquei dois livros sobre a Serra da Canastra – coração do Cerrado mineiro -, além de ter publicado inúmeros artigos científicos e reportagens em revistas, sempre em torno da biodiversidade deste bioma que é conhecido como a Savana Brasileira.

Não é à toa também que um dos mais importantes estudos mundiais, conhecido como hotspots e organizado pela CI – Conservation International, catalogou o Cerrado e a Mata Atlântica como os biomas mais imprescindíveis do país, no que tange à riqueza de sua fauna e de sua flora. Mais até do que a tão bajulada Amazônia.

O Cerrado é berço de uma infinidade de plantas medicinais, insetos, aves e anfíbios endêmicos. Acolhe-me há 25 anos, quando comecei a documentar as pesquisas com a onça-pintada e o lobo-guará, que se materializaram em livros, e o raríssimo pato-mergulhão.

Trabalhei no diagnóstico do Cerrado do Tocantins, quando o Estado tinha acabado de ser criado. Documentei o que é considerada a mais extensa área de Cerrado no Brasil, na região do Jalapão. Tive o privilégio de documentar áreas de Cerrado no meio da Floresta Amazônica, em áreas desconhecidas de Rondônia. Vi lírios multicores brotarem logo após a primeira chuva. Documentei os povos indígenas do Cerrado Matogrossense – Nambikwara, Manoki, Pareci, Xavante.

O Cerrado não tem uma beleza fácil de ser percebida. É preciso olhar além, focar nas miudezas, na simplicidade. Pois os campos são monocromáticos, os bichos são camuflados e o horizonte é tão plano que os desavisados se distraem facilmente.

O que mais posso dizer do Cerrado? Em nenhum outro lugar senti a vida se renovando, a cada dia, de forma tão intensa, como um milagre.

Em tempo…
Se, porventura, este texto pareceu desconectado à foto, é isto mesmo! Esta é a imagem que o valoroso Cerrado brasileiro está se tornando, na monotonia desagregada e triste das grandes plantações maquinizadas. Só desejo que as futuras gerações possam ver o que outrora ali existiu, em algum lugar deste Brasil imenso.

Foto: Adriano Gambarini

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Adriano Gambarini

Geólogo formado pela USP e especializado em Espeleologia, é fotógrafo e escritor desde 1992 e um dos mais ativos profissionais na documentação de projetos conservacionistas e etnográficos da atualidade. Autor de 13 livros fotográficos, dois de poesia e centenas de reportagens publicadas em revistas nacionais e estrangeiras. Ministra palestras e encontros sobre fotografia, conservação e filosofia de viagem.