Rodrigo Pacheco descumpre promessa e deixa passar o ‘combo da morte’ no Senado; organizações cobram

Rodrigo Pacheco descumpre promessa e deixa passar o 'combo da morte' no Senado;  organizações cobram

Organizações da sociedade civil pediram, esta semana nas redes sociais, ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), que cumpra a promessa feita em março, durante o Ato Pela Terra, de não pautar de forma açodada nenhum dos projetos sobre meio ambiente em tramitação na Casa.

Na ocasião, Pacheco recebeu Caetano Veloso e um grupo de artistas que se manifestavam contrários a uma série de mudanças na atual legislação ambiental, e pediam que nenhum dos projetos fosse votado até que estivessem alinhados com a ciência, com as demandas das populações tradicionais e à luz da emergência climática.

Rodrigo Pacheco descumpre promessa e deixa passar o 'combo da morte' no Senado;  organizações cobram

Em ano eleitoral e pouco antes do recesso parlamentar, pelo menos três projetos que alteram o Código Florestal, liberam mais agrotóxicos e esvaziam a fiscalização agropecuária entraram em pauta, sem passar nem mesmo pela Comissão de Meio Ambiente.

Após pressões, dois deles foram adiados para a semana que vem. Um terceiro, porém, foi aprovado de forma terminativa – ou seja, sem necessidade de ir a plenário – e pode virar lei se nada for feito. A seguir, entenda o que prevê cada um dos Projetos de Lei.

PL das Áreas de Proteção Permanente (1.282/2019)

O projeto: é mais um PL que visa alterar o Código Florestal ao permitir desmatar Áreas de Proteção Permanente (APPs) para a construção de reservatórios e obras de irrigação.

A perda de vegetação nessas áreas pode colocar em risco outros usos da água, como o abastecimento humano e a pesca (já que é a vegetação nativa que garante a qualidade e a disponibilidade de água), provocar assoreamento e erosão, entre outros.

Em nota técnica, as organizações Observatório das Águas, Instituto Socioambiental (ISA) e Fundação SOS Mata Atlântica explicam que a flexibilização da delimitação e do regime de proteção das áreas de preservação permanente, especialmente para fins de barramento de cursos d’água, pode ocasionar novos desmatamentos, agravar as crises hídrica e energética e “conflitar com os instrumentos de regulação, planejamento e gestão dos recursos hídricos brasileiros, com ameaças à Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei no 9.433/1997), vindo a gerar impactos negativos para a agricultura familiar, pequenos produtores e todos os demais usos múltiplos da água garantidos por lei”.

Tramitação: De autoria do senador Luís Carlos Heinze (PP/RS), o projeto estava na pauta na Comissão de Agricultura (CRA) do Senado, em regime terminativo; se aprovado, vai direto à Câmara dos Deputados sem passar pelo plenário do Senado.

Ele seria apreciado na comissão hoje, quinta-feira, 23, mas a votação foi adiada para a próxima semana. Mesmo antes de este projeto ser aprovado, no final de 2021, o governo já havia flexibilizado o Código Florestal ao aprovar a Lei 14.285, que transferiu aos municípios a competência para definir o tamanho das APPs às margens de cursos d’água nas zonas urbanas.

PL do Veneno (1459/2022)

Rodrigo Pacheco descumpre promessa e deixa passar o 'combo da morte' no Senado;  organizações cobram
Foto: Creative Commons/Pixabay

O projeto:
prevê alterações importantes na legislação, inclusive com a revogação da lei atual de agrotóxicos. Ele transfere o poder de decisão de aprovação de um novo agrotóxico para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, tornando praticamente consultivas partes fundamentais do processo de avaliação e aprovação, como Ministério do Meio Ambiente e Anvisa;
facilita a liberação de substancias cancerígenas ao considerar que qualquer ingrediente pode ser liberados desde que não apresentem “risco inaceitável”, sem se quer definir o que seria aceitável ou inaceitável, nem quem determinaria isso;
muda o termo “agrotóxico” para “pesticida” mascarando a nocividade dessas substâncias; e
inclui conferir registro temporário sem avaliação para os pesticidas que não forem analisados no prazo estabelecido pela nova Lei.

TRAMITAÇÃO: De autoria do senador Blairo Maggi (PLS 526/99), o projeto tinha inicialmente apenas dois artigos e havia sido aprovado na CAS (Comissão de Assuntos Sociais) de forma terminativa em 2002. Ficou anos sem movimentação, até que em 2015 sofreu profundas modificações e foi aprovado na Comissão Especial em 2018, sob relatoria do Dep. Luiz Nishimori e presidência da Comissão pela Deputada Tereza Cristina.

Em fevereiro deste ano foi votado e aprovado no Plenário da Câmara dos Deputados e retornou ao Senado Federal, onde tramita desde junho. Foi despachado, por decisão do Presidente Rodrigo Pacheco exclusivamente para a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA).

Em 2021, enquanto o projeto estava parado no Congresso, o presidente Jair Bolsonaro acelerou o processo de liberação de agrotóxicos via decreto, em um texto que permitia a liberação dos pesticidas caso exista um “limite seguro de exposição” e que criava um rito de “tramitação prioritária” para aprovação de novos produtos. Também seria votado nesta quinta-feira, 23, mas foi adiado.

PL do Autocontrole Agropecuário (1293/2021)

Em linhas gerais, o projeto realiza uma série de mudanças no controle sanitário vigente no país, permitindo que produtores rurais e a indústria exerçam o autocontrole de suas atividades, esvaziando a fiscalização existente atualmente.

Dinheiro que financia soja, pecuária e consequente desmatamento na Amazônia vem de paraísos fiscais
Foto: Kate Evans/Cifor/Creative Commons/Flickr

Ao criar um programa de “autocontrole”, em que as atribuições do fiscal agropecuário, como por exemplo a inspeção sanitária e industrial dos produtos de origem animal e o controle de agrotóxicos em sementes e mudas, são transferidas para o próprio produtor rural, o PL retira o Estado da atividade de fiscalização de produtos agropecuários.

O texto não deixa claros quais são os critérios que as empresas devem adotar para promover autocontrole e possibilita a contratação de especialistas, por parte do próprio produtor, para realizar as avaliações. Setores que se posicionam contra o projeto afirmam que ele pode colocar em risco a saúde da população.

O projeto também pretende tornar automático o registro de produtos que já tem padrões normatizados e dispensar a necessidade de registro dos insumos fabricados pelo produtor para uso próprio.

TRAMITAÇÃO: O projeto foi aprovado hoje, 23 de junho, por 9 votos a 2 na Comissão de Agricultura do Senado, também em caráter terminativo. Como veio da Câmara, pode ser encaminhado a qualquer momento à sanção presidencial e virar lei.

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*Este texto foi publicado originalmente no site Observatorio do Clima (OC) em 23/6/2022. Foto (destaque): Solange Barreira/OC (artistas e ativistas protestam no Senado contra retrocessos legislativos, durante o Ato pela Terra, em 9 de março de 2022)
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NOTA DO CONEXÃO PLANETA: Reveja um dos momentos mais emocionantes do Ato pela Terra, no qual Caetano e amigos cantam ‘Terra’ para Rodrigo Pacheco, no Salão Negro do Senado. Seu olhar frio – apesar da promessa – parecia denunciar que seu compromisso não iria além daquele momento.



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Observatório do Clima

Fundado em 2002, o OC é a principal rede da sociedade civil brasileira sobre a agenda climática, com mais de 70 organizações integrantes, entre ONGs ambientalistas, institutos de pesquisa e movimentos sociais. Seu objetivo é ajudar a construir um Brasil descarbonizado, igualitário, próspero e sustentável, na luta contra a crise climática. Desde 2013 publica o SEEG, a estimativa anual das emissões de gases de efeito estufa do Brasil