Peixe-boi-marinho é monitorado com tecnologia brasileira inédita

Extremamente dócil, o peixe-boi-marinho (Trichechus manatus) é um gigante das águas. Pode chegar a pesar 600 quilos e medir até quatro metros de comprimento. Infelizmente, a espécie está ameaçada de extinção. Segundo a organização internacional União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), que classifica animais em risco de desaparecer, o peixe-boi-marinho é considerado vulnerável.

No Brasil, o peixe-boi-marinho pode ser encontrado ao longo do litoral Norte e Nordeste, do Amapá até Alagoas. Entretanto, especialistas estimam que existam apenas mil indivíduos neste trecho da costa, um número bastante pequeno, que gera preocupação.

Mas desde o começo de 2016, a Fundação Mamíferos Aquáticos, de Recife, em parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e pescadores locais, começou a usar um sistema inédito de monitoramento para poder melhorar o trabalho de proteção e conservação da espécie.

Em parceria com a empresa brasileira de tecnologia Nortronic, foi desenvolvido um  aparato que monitora os peixes-boi via satélite. “Tratam-se de terminais satelitais, operados por meio do sistema da GlobalStar. Todos os componentes eletrônicos permanecem dentro de um housing, e atrelados aos animais por meio de um cinto”, explica João Carlos Gomes Borges, veterinário e responsável pelo projeto. “Por meio deste sistema de transmissão, em período de tempo previamente estabelecido, a posição geográfica dos animais é transmitida via satélite. Estas informações são acessadas remotamente por meio de um sistema integrado com o Google Maps e Google Earth”.

Peixe-boi-marinho é monitorado com tecnologia brasileira inédita

Tecnologia brasileira de monitoramento em uso

Tudo é feito com muito cuidado para que os animais não fiquem estressados. “O cinto fica preso ao pedúnculo caudal do peixe-boi-marinho. Atrelado a este cinto, existe um “tether”, o qual funciona promovendo a ligação entre o cinto e o housing. Todas as atividades dos animais são realizadas com tranquilidade”, garante o veterinário. “Caso este equipamento se enrosque em alguma estrutura (mangue, cordas de embarcações, ancoras, etc), os acessórios de marcação são confeccionados com “pontos de quebra” e com o movimento mais brusco dos animais, estes pontos são rompidos”.

Borges ressalta que o equipamento de monitoramento via satélite pesa em média 1,9 kg, ou seja, representa uma proporção inferior a 1% do peso do peixe-boi-marinho.

Peixe-boi-marinho é monitorado com tecnologia brasileira inédita

Monitoramento do peixe-boi-marinho no litoral da Paraíba

Esta é a primeira vez que este equipamento é fabricado no Brasil. Em países como Estados Unidos, México, Colômbia e Austrália, o sistema satelital utilizado para este tipo de atividade é outro, com custo muito mais alto. “Conseguimos desenvolver aqui uma tecnologia de baixo custo e com acurácia para o monitoramento dos peixes-bois-marinhos. Assim, uma das vantagens deste projeto é evitar a morosidade dos processos de importação, reduzir os custos com a aquisição de equipamentos desta natureza, tornando-os disponíveis futuramente para outras atividades ambientais semelhantes”, destaca Borges.

Inicialmente estão sendo usados seis equipamentos no acompanhamento de peixes-bois-marinhos no litoral da Paraíba. A intenção é ampliar o número de animais monitorados e assim, possibilitar contribuições ainda maiores para a conservação da espécie. “Outro aspecto importante a ser destacado é que os sinais emitidos por estes equipamentos, além de possibilitar dados sobre os animais e o incremento do conhecimento cientifico, em muitas ocasiões, são determinantes para os resgates dos peixes-bois-marinhos recém-reintroduzidos e que ainda encontram-se em processo de readaptação em vida livre”.

Com este acompanhamento, a equipe da fundação está conseguindo entender melhor o comportamento da espécie, como por exemplo, áreas de habitat, preferências alimentares, relacionamento entre os indivíduos. Caso seja constadada algum problema de saúde no mamífero, ele é conduzido para o tratamento necessário. “Nestas ocasiões, realizamos a captura e o submetemos à avaliação clínica, sendo posteriormente definido o tipo de tratamento terapêutico que será instituído”.

O projeto de monitoramento dos peixes-bois-marinhos realizado pela Fundação Mamíferos Aquáticos tem o apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.

A vida do peixe-boi-marinho

Foi graças a seus hábitos alimentares, que a espécie Trichechus manatus ganhou seu nome popular. Herbívoros, os peixes-bois-marinhos comem, principalmente, uma planta chamada capim-agulha, encontrada em algumas praias e estuários. Um indivíduo chega a consumir até 60 kg de plantas por dia.

Com cara arredondada, olhos pequenos e corpo roliço, estes animais podem ter sua cor variando entre cinza e marrom-acinzentado. Não possui orelhas, mas escuta muito bem. Os ouvidos são dois pequenos orifícios, localizados um pouco atrás dos olhos.

Sua comunicação é feita através de pequenos “gritos”, as chamadas vocalizações. Esta forma de interação é muito importante entre o filhote e a mãe, que é capaz de reconhecer a “voz”da prole entre outros indivíduos da mesma espécie.

Em geral, os peixes-bois-marinhos vivem sozinhos ou em grupos pequenos. A expectativa de vida é de aproximadamente 50 a 60 anos. Possuem baixa taxa de reprodução, sendo comum que cada fêmea tenha um filhote a cada três anos, o que contribui para colocar a espécie em risco de extinção.

Além deste fator, a atividade humana é uma das principais ameaças a este mamífero, que não tem predadores naturais. “O peixe-boi é manso e, muitas vezes, interage com pessoas que o machucam para afugentá-lo”, diz Borges. Ele também relata que, embora não sejam alvo de caça, é comum que sejam capturados acidentalmente em redes de pesca, lançadas em locais inapropriados. O atropelamento por embarcações é outro risco, visto que os animais tendem a ficar próximos de áreas costeiras.

Fontes: Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza e Programa Viva o Peixe-Boi-Marinho

 

Fotos: divulgação Edson Acioli e Luciano Candisani

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Suzana Camargo

Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.