Justiça brasileira suspende registro de três tipos de agrotóxicos, entre eles, o glifosato


Justiça brasileira suspende venda de três tipos de agrotóxicos, entre eles, o glifosato

*Atualizado em 29/08/2018

Depois da condenação histórica da Monsanto, gigante multinacional fabricante de pesticidas, transgênicos e sementes, nos Estados Unidos, vários países decidiram rever a comercialização de agrotóxicos que têm efeitos nocivos à saúde humana já comprovados pela ciência.

A Monsanto terá de pagar uma indenização de US$289 milhões ao jardineiro californiano DeWayne Johnson, de 46 anos, diagnosticado com um câncer terminal, em consequência da exposição constante ao herbicida, a base de glifosato, Roundup, que ele aplicava nos jardins das escolas onde trabalhava.

Aqui no Brasil, na semana passada, uma decisão da 7ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal suspendeu o registro dos agrotóxicos abamectina, glifosato e tiram no país.

“Está mais que suficientemente demonstrada a toxidade dos produtos para a saúde humana, não restando dúvidas à necessidade da proibição”, afirmou a juíza federal substituta Luciana Raquel Tolentino de Moura, que proferiu a ordem, embasada em diversos estudos científicos.

Segundo a determinação, “os produtos já licenciados devem ser retirados do mercado em até 30 dias; novas licenças estão suspensas. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) tem prazo até o final do ano para concluir reavaliação toxicológica”.

A decisão de Luciana Moura atendeu uma ação do Ministério Público Federal (MPF), de 2014, contra a União e a Anvisa, pedindo uma reavaliação toxicológica de diversos ingredientes de agrotóxicos por um prazo de 180 dias, além da suspensão de registros atuais e da concessão de novos até que esse trabalho tivesse sido feito.

A lentidão de um parecer se deve ainda à tentativa das empresas Monsanto, Nortox, FMC, além da Aprosoja Brasil e do Sindicato da Indústria de Defensivos Agrícolas, em barrarem a iniciativa.

Glifosato: o veneno no olho do furacão

O herbicida a base de glifosato é o mais utilizado no mundo todo. Registrado em 130 países, tem seu uso aprovado para mais de 100 cultivos diferentes. No Brasil, a quantidade considerada aceitável na lavoura é 5 mil vezes maior do que na Europa, conforme relatamos aqui, nesta outra reportagem sobre agrotóxicos no país.

Em um relatório publicado em 2015, a Organização Mundial de Saúde (OMS) afirmou que o glifosato pode causar câncer em animais tratados em laboratório e que é um potencial causador de alterações na estrutura do DNA e cromossomos das células humanas.

A condenação da Monsanto gerou um movimento mundial de alerta sobre o agrotóxico. Na Inglaterra, as principais lojas que comercializam o produto RoundUp anunciaram que irão rever a venda do herbicida.

Na França, o ministro do meio ambiente Nicolas Hulot afirmou, no último domingo (12/08), que o país entrará em uma “guerra contra os agrotóxicos”. No ano passado, entretanto, o governo tentou proibir o uso do glifosato, mas sua proposta foi derrotada, já que fazendeiros franceses dizem não haver outro herbicida alternativo para ser usado na lavoura.

No Sri Lanka, a importação do glifosato foi proibida em outubro de 2015, depois de forte pressão sofrida graças a uma campanha contra o produto iniciada por um monge budista. Todavia, em julho último, o governo cedeu ao lobby de organizações do setor agropecuário e revogou a decisão, mas apenas para os cultivos de chá e borracha.

#PL do Veneno

Enquanto isso, na mesma Brasília onde a justiça suspendeu o registro de alguns agrotóxicos, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 6299/2002, chamado de PL do Veneno, que como principal objetivo afrouxar o registro dessas substâncias químicas no país, incluindo aquelas com potencial ou comprovadamente cancerígenos e que causem mutações genéticas, malformações fetais, problemas reprodutivos e hormonais.

Atualmente a liberação desses produtos no Brasil depende de autorização de órgãos do Ministério da Agricultura, Saúde e Meio Ambiente, processo este que pode levar até cinco anos. O PL do Veneno faria com que o prazo fosse diminuído para 12 meses, caso nenhuma autoridade tenha se mostrado contrária a ele neste período.

Vale lembrar que o projeto de lei foi apresentado pelo ex-senador e atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, coincidentemente um dos maiores produtores de soja do Brasil.

Ou seja, seu autor e seu relator são dois empresários ruralistas, extremamente interessados em sua aprovação, que caso aconteça, fará com que seus negócios faturem muito mais milhões por ano.

Infelizmente, nem toda a mobilização realizada pelo meio acadêmico e pela sociedade civil contra o PL do Veneno conseguiu impedir que o texto do projeto fosse aprovado na Comissão Especial da Câmara, e agora, será votado pelo plenário (leia mais aqui).

Mais de 1,6 milhão de brasileiros já assinaram a petição online #ChegaDeAgrotóxicos para defender a aprovação de outro projeto de lei, mas este do bem ! O PL 6670/2016 quer instituir a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNaRA). A proposta tem como meta reduzir gradativamente o uso de agrotóxicos no Brasil, desenvolver alternativas biológicas e naturais de defensivos agrícolas e controlar esses produtos.

Se você ainda não aderiu à esta causa, participe! Assine já a petição neste link.

*Com informações do Amigos da Terra Brasil e do site Phys.Org 

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*Em 22/08/2018, a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com recurso contra a liminar que suspendeu a concessão de novos registros e de todos os registros já concedidos aos agrotóxicos citados acima. Segundo a entidade, “… a suspensão é grave lesão à ordem administrativa e à ordem econômica e impõe “drásticos impactos” no setor que faz uso da substância”. No dia seguinte, 23/08/2018, a justiça acatou o pedido e suspendeu a liminar. A decisão foi comemorada pelo ministro do Meio Ambiente, Blairo Maggi, que não por acaso, é o autor do #PL do Veneno. 

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Foto: domínio público/pixabay

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Suzana Camargo

Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.