Inverno carioca


Inverno carioca

Escrevo este post da varanda da casa da minha sogra. Sol, céu azul e temperatura de 27 graus. Dentro de casa faz friozinho. Pelo menos para os cariocas. Engraçado andar pelas ruas e ver gente vestindo calça jeans e casaco. Mas oficialmente é inverno no Rio de Janeiro. Estamos em julho.

Meu coração é carioca. Não tenho como negar. Meu pai nasceu aqui e por estas surpresas que a vida nos reserva, acabei casando com um carioca. Por dois períodos da minha vida, morei na cidade. Mesmo assim, não consigo imitar o sotaque deles. No meu dicionário, não se encaixam tantos “ssss” e “rrrr” numa palavra só. Então, apesar do coração bater mais forte aqui, quando abro a boca todo mundo nota que sou mais uma “estrangeira” que caiu de amores pela Cidade Maravilhosa.

Geralmente passo férias aqui no verão. Sol escaldante, temperatura batendo os 40 graus. Adoro! Me estiro na areia da praia e fico lá observando a vida na beira mar.

O carioca é um povo de sorriso fácil, papo descontraído. Para mim, parece que o ritmo da vida aqui corre de maneira diferente. Também, como não?!, quando eles têm esse marzão como cartão postal todos os dias?

Aqui ninguém te olha torto se você está usando sandália de dedo, aquela bermuda meio velha e o cabelo preso no elástico, afinal, aguentar o calorão de salto e maquiagem no rosto não combina com o Rio.

Mas aqui estou, em julho, no inverno carioca. E acabei de descobrir que ele é uma delícia. A praia fica vazia. Não é preciso disputar espaço na areia para colocar o guarda-sol e a cadeirinha. Nem por isso, caia no vacilo de achar que não é necessário passar protetor solar.

O “bixxxcoito Globo”, biscoito de polvilho que já é uma instituição do Rio de Janeiro, fica mais barato nesta época do ano. Lógico, tem que pechinchar. Prepare seu melhor sotaque carioca e chore por um preço mais baixo (sabe como é, quando os vendedores reparam que você não dobra os “s” e “r”, o valor inflaciona!). Tente uma frase como “Caraca, meu irrrrmão, tá caro demaissss!”. Ou então, abra um sorriso largo no rosto e logo o vendedor vai começar a bater papo, contar sobre a  vida dele e a desconfiança de que a mulher o está traindo (sim, aconteceu na praia hoje comigo… dei o maior apoio e disse que quem ia perder ela era por trocá-lo por outro).

Pra quem não curte o biscoito Globo, tem ainda o mate gelado, o picolé, o milho cozido, o queijo coalho, a empadinha, o sanduíche natural e a esfiha, afinal, a gastronomia da praia carioca é multicultural como nosso país e agrada a todos os gostos. Durante muito tempo, meu filho mais novo, que ainda não tinha ouvido apurado para o sotaque carioca, chamava o queijo coalho de “peixe com alho”. Hoje é um fã incondicional do queijinho tostado na brasa com orégano. O tempero especial é a brisa do mar.

Biscoito Globo e mate gelado: dupla que é instituição nas praias cariocas

Confesso que no inverno a água do mar está um pouco fria para os meus padrões. Mas aqui no Rio é sempre uma loteria, mesmo no verão, ela pode estar gelada. Todavia, diferentemente de mim, vejo muita gente mergulhando e se refrescando no mar.

Ali da cadeirinha, adoro apreciar a paisagem. Descobrir qual é a atual moda dos biquínis, ficar embasbacada com a habilidade dos jogadores da “altinha”. A modalidade futebolística na beira da água é impressionante. Deles e delas. O difícil é não se sentir deprimida olhando o corpo das cariocas – esportistas ou não. “Estar em forma” deve estar em negrito no dicionário delas.

As praias de Ipanema e do Leblon são “o” point. Mas, por questões logísticas, sempre vou à do Pepê, na Barra da Tijuca. Pessoal mais descolado, menos turistas e muita gente que curte surfe e agora, lógico, o SUP. Não conhece a sigla? Eu também não sabia o que era. Vem do inglês, o stand up paddle. Virou febre por aqui, surfar em pé na prancha com remo.

Praia do Pepê, com vista para a Ilha Pontuda e as Tijucas

Com o metrô, que liga a zona sul à oeste, fica bem mais fácil e rápido circular pela cidade. Quem vai querer enfrentar congestionamento, quando em menos de 20 minutos dá para deixar Ipanema e chegar na estação do Jardim Oceânico?

Quando você achar que já “deu de sol”, é hora do almoço, que não deve ter horário pré-determinado. Quanto mais tarde, mais carioca. Não gosto de fazer propaganda, mas neste caso, vou quebrar a minha própria regra. Vou recomendar dois lugares que são a cara do Rio de Janeiro. O restaurante Gula-Gula tem as saladas mais incríveis que você pode imaginar, afinal praia e depois, salada, são uma combinação imbatível. Pra acompanhar, peça um torta de queijo minas e qualquer suco natural. De sobremesa, caso você queira se permitir este prazer – afinal, são férias! -, vá pela torta de limão. Receita dos Deuses! Aqui abro um parênteses: em qualquer lugar fechado no Rio – restaurante, café, cinema, teatro – tenha sempre um casaquinho na bolsa. Inverno ou verão. Carioca gosta do ar-condicionado igual ao chopp, estupidamente gelado.

Se você preferir uma refeição rapidinha, tem o Polis Sucos. Aqui você pode combinar qualquer tipo de fruta imaginável em sucos que poucas vezes na vida você vai tomar igual. Suco de fruta de verdade, nada de polpa! Tem o “alegria” (abacaxi, gengibre, hortelã e laranja), o “folia” (laranja, extrato de guaraná e hortelã) e o “ressaca (maçã, melancia e melão). Ou então, vai de açaí! E para rebater, um sanduíche natural!

Para encerrar o dia, dou três sugestões. A primeira é alugar uma bicicleta e simplesmente passear pela ciclovia, apreciando a paisagem. O Rio é realmente lindo!

Minha cara de felicidade, pedalando pela orla carioca

Segunda sugestão. Assista o pôr-do-sol na areia da praia. O mais famoso deles acontece no Arpoador, onde muita gente até bate palma quando o sol desaparece no horizonte, mas de qualquer ponto da orla, ele é sempre um show.

Por último, se você estiver mais animado, pegue o bondinho do Pão de Açúcar ou suba o Cristo Redentor para ver o espetáculo do final do dia do alto da cidade e descobrir porque Tom Jobim se inspirou aqui para escrever a música “Samba do Avião”…

“Minha alma canta
Vejo o Rio de Janeiro
Estou morrendo de saudades
Rio, seu mar

Praia sem fim
Rio, você foi feito prá mim
Cristo Redentor
Braços abertos sobre a Guanabara
Este samba é só porque
Rio, eu gosto de você
A morena vai sambar
Seu corpo todo balançar
Rio de sol, de céu, de mar
Dentro de mais um minuto estaremos no Galeão
Copacabana, Copacabana

Cristo Redentor
Braços abertos sobre a Guanabara
Este samba é só porque
Rio, eu gosto de você
A morena vai sambar
Seu corpo todo balançar
Aperte o cinto, vamos chegar
Água brilhando, olha a pista chegando
E vamos nós
Pousar…”

Braços abertos sobre a Guanabara


Do alto, a beleza da geografia do Rio de Janeiro

Não deixe de conhecer:

Bondinho do Pão de Açúcar – compre os ingressos online para evitar filas. A última viagem sai às 20h;

Morro do Corcovado – também compre o ingresso pela internet, com hora marcada. Saídas são a cada 30 minutos e a última acontece às 19h;

Restaurante Gula-Gula

Polis Sucos 

 

P.S. Apesar de toda minha paixão pelo Rio, sei que a cidade enfrenta uma situação dificílima. É muito triste ver um lugar tão lindo castigado pela falta de segurança e investimento em infraestrutura.

Fotos: domínio público/pixabay (abre, Cristo Redentor e vista aérea do Rio), reprodução Facebook Biscoito Globo Distribuição e demais arquivo pessoal 

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Suzana Camargo

Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.