Iniciativas que aproximam consumidor e agricultor se multiplicam

iniciativas que aproximam consumidor e produtor

Passei por uma experiência nonsense há muitos anos, quando cursava o então ensino médio. Era chegado o momento de divulgar a estudantes as opções e oportunidades de cursos e profissões. Dentre eles, estava a área de produção de laticínios, e para demonstrar as oportunidades proporcionadas por ela na cidade – mineira, urbana -, nos levaram uma vaquinha, que permaneceu assustada no meio da quadra esportiva concretada do colégio, para que pudéssemos admirar – e no meu caso, e de muitas outras pessoas, ver de perto pela primeira vez – o estupendo animal.

Me pego pensando nesse caso também quando o assunto é agricultura. Muita gente mal sabe de onde vem o alimento que consome e em que condições ele é produzido. E tem quem só consuma caixas de congelados e alimentos processados e ultra processados. Na época em que dava aulas para crianças pequeninas, de 6 a 7 anos, ouvia perguntas divertidas sobre isso. Elas não tinham a menor ideia da origem do que comiam. Muitas achavam que as mães magicamente criavam tudo.

Crianças ou adultos, temos informações de sobra para entender de onde vem o alimento que chega à nossa mesa e como é produzido. Há alguma coisa mágica em entender a comida, uma alquimia em perceber a transformação do alimento que sai da terra em uma experiência de sabor. E falo isso até do nosso querido arroz com feijão, prato mais querido do brasileiro, que é uma verdadeira delícia quando bem preparado. Conhecer a procedência do alimento é também importante para a saúde.

Tenho uma intuição de que o contato com quem produz e com o modo como se produz faz diferença nessa mágica. Até mesmo para motivar as pessoas a olharem mais para o que consomem. Comprar direto de quem faz, ter acesso às histórias e processos de cultivo da terra, da origem dos alimentos, dicas de preparo, tudo isso abre um mundo novo.

As feiras, que tenho memória de frequentar desde pequena, quase sempre são espaços bacanas para propiciar esse contato. E outras iniciativas têm surgido como modo de dar oportunidade à experiência da compra direta com produtores e produtoras. São cestas, grupos de consumo, mercados e quitandas, que vendem a produção dos pequenos a preço justo.

Semana passada, quando escrevi aqui no Conexão sobre o Plano Municipal de Economia Solidária do Rio de Janeiro, descobri a Junta Local, iniciativa que promove feiras como ponto de encontro de uma comunidade que se mobiliza em torno da comida, ocupando o espaço público de modo festivo e valorizando a comida local e justa.

A proposta é tornar visível as pessoas que produzem a comida que comemos, ao mesmo tempo em que, valorizar o que é cultivado e produzido localmente, colocando pessoas e valores no centro do sistema alimentar. Para isso, além das feiras físicas, a Junta Local criou também a Sacola Virtual. As duas são plataformas que permitem conhecer e comprar diretamente de pequenos produtores, proporcionando acesso à comida boa, local e justa.

Propostas conectoras surgem nas mais diversas cidades do país. Como em Belo Horizonte, onde a Feira Terra Viva acontece às terças e sábados, no bairro de Santa Tereza, reunindo cerca de 30 produtores que comercializam verduras, legumes e frutas orgânicas, dentre outros itens. A Rede Terra Viva surgiu em 2005, buscando o fornecimento de alimentos saudáveis. Desde 2007, evoluiu para o formato de feira e é um ponto fixo de comercialização da economia solidária.

Em Juiz de Fora, também em Minas Gerais, toda semana acontece a feira É Daqui – alimentação inclusiva e orgânica. Criada pela Associação de Inclusão Alimentar e Bem-Estar da Zona da Mata Mineira (Bem-Te-Vida), junto com a Secretaria de Agropecuária, comercializa orgânicos e outros alimentos como pães, doces e queijos. Além disso, às terças, quintas e sextas, a Feira da Agricultura Familiar acontece em diferentes pontos da cidade, oferecendo verduras, legumes, bolos, pães, biscoitos, queijos, doces, café moído e outros itens produzidos exclusivamente pelos pequenos produtores.

Com certeza, iniciativas semelhantes são realizadas em várias cidades do país. E nas cidades menores, a compra direta já costuma ser uma prática entre vizinhos. Se você tem interesse pelo consumo de orgânicos, o Mapa de Feiras Orgânicas do IDEC mapeou centenas delas pelo Brasil.

Muitas vezes, o tempo é um limitador para a ida à feira. Por isso, existem também opções online, que promovem a compra de alimentos orgânicos diretamente do produtor. Uma busca ligeira pela internet mostra várias opções, nos mais diversos locais. Nesses casos, a dica é checar se as cestas são feitas diretamente pelos produtores, ou ainda, por iniciativas que cobram um percentual mínimo para administrar a operação de pedidos e entregas, praticando o preço justo para os agricultores e valorizando a agricultura familiar.

Há também espaços que atuam nessa lógica, como o Instituto Chão, o Instituto Feira Livre e o Armazém do Campo, em São Paulo. Ou ainda o Projeto Vegânica, que itinera pela capital paulista e agora terá um espaço fixo.

Quando você opta por comprar diretamente do pequeno produtor, seja em feiras, por meio de grupos de consumo ou cestas, está trocando a ida ao supermercado – que na maioria das vezes paga um valor bem menor ao produtor – pela valorização da agricultura familiar, pagando um preço justo a quem produz o alimento que vai para a sua mesa. Com esta mudança de atitude, é possível ainda criar uma relação mais pessoal com os produtores e produtoras, cheios de histórias, dicas e receitas para compartilhar.

Foto: reprodução Facebook Junta Local

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Mônica Ribeiro

Jornalista e mestre em Antropologia. Atua nas áreas de meio ambiente, investimento social privado, governos locais, políticas públicas, economia solidária e negócios de impacto, linkando projetos e pessoas na comunicação para potencializar modos mais sustentáveis e diversos de estar no mundo.