É preciso apurar os olhos, ter vocação para ver os detalhes. E quem vê se encanta. Na imensidão dos raros rios que mantem suas águas claras, transparentes, entre correntezas e cachoeiras insiste no árduo exercício da sobrevivência uma ave delicada, treinada a se dividir entre voos leves e mergulhos precisos.
O dono de um penacho atrevido e da vocação ancestral para encontrar o que resta de rios límpidos em um mundo cada vez mais poluído.
Uma das aves aquáticas mais adaptadas e ameaçadas do mundo. Uma raridade. O pato-mergulhão. Dizer raro não é exagero.
A estimativa é que só existam 250 indivíduos no planeta!
Na linguagem científica é classificada como Criticamente em Perigo em nível mundial, o que significa dizer que a espécie enfrenta risco extremamente elevado de extinção na natureza, segundo critérios estabelecidos pela União Internacional para a Conservação da Natureza (em inglês, IUCN).
Só se sabe tanto sobre eles, só se tem ovos mantidos a salvo em cativeiro para o caso da espécie desaparecer por causa do trabalho de cientistas como Flávia Ribeiro.
Ela nasceu na cidade grande, acostumada às buzinas, ao corre-corre, às ladeiras de Belo Horizonte. Aliás, nasceu predestinada a ser uma defensora da vida, vindo ao mundo em 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente.
Estudou biologia, fez mestrado em Ecologia e se encontrou mesmo nas margens dos rios da Serra da Canastra. Atravessou corredeiras caminhando só para proteger as maiores riquezas daquelas montanhas em forma de baú.
Fez rapel em barrancos para acompanhar o nascimento dos filhotes, acompanhou ninhadas inteiras até que os patinhos se despedissem dos pais para voar com suas próprias asas. Comemorou cada ovo, cada passo, cada mergulho.
Neste 5 de junho, celebremos a Terra e a vida de Flávia, que garantiu o nascer dessas joias raras, tesouros que merecem e precisam ser conservados.
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Fotos: Adriano Gambarini