Em exposição fotográfica na floresta do Museu da Amazônia, Renato Soares nos lembra que ‘esta terra tem dono’ e é indígena. Até final de abril!

Em exposição fotográfica na floresta do Museu da Amazônia, Renato Soares nos lembra que 'esta terra tem dono' e 'o Brasil é indígena'

Texto atualizado em 3/6/2022 ,12/12/2022 e 14/2/2023 para atualizar a data de término que foi adiada três vezes
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Escrevi sobre esta exposição linda e inédita em 18 de abril, ainda sob inspiração do Acampamento Terra Livre (ATL), que aconteceu na primeira quinzena de abril em Brasília, e reuniu mais de 7 mil indígenas de 276 povos de todas as regiões do Brasil.

Enquanto esse encontro movimentava a capital federal, o fotógrafo e indigenista Renato Soares se dedicava aos últimos retoques da exposição ‘Amazônia Indígena – Esta Terra tem Dono’, inaugurada em 19 de abril, Dia dos Povos Indígenas, no MUSA – Museu da Amazônia (Av. Margarita, 6305), em Manaus, com a presença de lideranças.

Montada ao ar livre, no meio da floresta, a mostra reúne 60 imagens registradas ao longo de mais de 20 anos de expedições a territórios de etnias diversas da Amazônia, como Ticuna, Kambeba, Tuyuka, Krahô, Kalapalo, Kuikuro, Yawalapiti, Bororo, Waiana Apalai, Kayapó, Kamayurá, Waurá e Ikpeng.

A belíssima mostra enfeitará a trilha do museu até final de abril de 2023, quando completará um ano. Mas não sairá do Amazonas: as obras seguem para o Instituto Thiago de Mello, que, desde agosto, está instalada numa casa da prefeitura no Centro Histórico de Manaus, na “casa amarela da Rua Bernardo Ramos”.

As imagens foram doadas pelo artista, que integra o Conselho Diretor da organização. “A ideia é tornar a exposição itinerante e viajar com ela pelo interior do estado”.

A seguir, saiba mais sobre a exposição na trilha do MUSA…

Em exposição fotográfica na floresta do Museu da Amazônia, Renato Soares nos lembra que 'esta terra tem dono' e 'o Brasil é indígena'

Uma viagem na floresta

As fotos exuberantes de Renato se fundem com a mata e ganham ainda mais “vida” na Trilha Branca do MUSA, que tem 1,8 km e passa por pontos-chave como a Torre de Observação. Elas estão aplicadas em telas com quase dois metros de altura (180 cm x 120 cm), produzidas com madeira apreendida em operações de fiscalização. 

O indigenista conta que, desde o início das conversas com Ennio Candotti, diretor do MUSA, lhe pareceu muito interessante usar a trilha como espaço de exposição

“É como uma viagem com os indígenas dentro da floresta, como se eles estivessem ali presentes, observando os visitantes e fazendo-lhes companhia”. 

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Renato Soares checando a montagem de uma das primeiras imagens de sua exposição

“Esse passeio imagético nos leva a refletir sobre nossa maneira de ver o outro: quando não somos vistos, corremos o risco de ser esquecidos. Nos lembra quem são os verdadeiros donos desta terra”, acrescenta. 

O convite para expor o trabalho único de Renato, no MUSA, foi feito por Candotti a partir da sugestão de Fábio Chateaubriand, conselheiro da instituição, que conhecia e admirava a obra do fotógrafo. 

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Candotti e Renato na foto que ilustra o convite para a exposição

“Em 2021, realizamos a primeira exposição de ‘arte e floresta’, que reuniu esculturas de oito artistas e arquitetos, que deverá se repetir no ano que vem , com artistas de toda a Amazônia”, conta o diretor. “Agora, com Renato Soares, inauguramos a primeira exposição de fotografias em grandes dimensões, na trilha do MUSA”.  

E completa: “Esta mostra é um prazer para nós”, diz ele. “E vem se juntar a outras duas exposições permanentes sobre temas indígenas e o Rio Negro”, salienta. 

Maureen Bisilliat por Laura Liuzzi

Homenagem à mestra

Renato dedica esta exposição – “que é a mais importante da minha carreira, pois busca um diálogo ainda mais direto com o público” a uma pessoa que marcou sua trajetória: a fotógrafa Maureen Bisiliat.

“Fui apresentado à Maureen pelo sertanista Orlando Villas-Bôas. Ela tinha visto fotografias minhas, gostou muito do que eu estava fazendo e me convidou para participar de um trabalho de museologia. O resultado está no livro ‘Pavilhão da Criatividade – A arte popular da América Latina’. Este foi o primeiro projeto que realizamos juntos”, conta o fotógrafo. 

“Esta homenagem é uma forma de reconhecer uma das fotógrafas mais criativas e engajadas na causa indígena que conheço e agradecer tudo que aprendi com ela”. 

Manifesto Amazônia Indígena 

Cacique Gerôncio Yanomami

Para além da exposição, Amazônia Indígena é um manifesto que “dá voz e rosto a esta gente que vem sofrendo muito com o governo atual. Não podemos ficar calados diante de tantos abusos e absurdos. Esta é a minha contribuição para os povos amazônicos, para que mostrem que existem e resistem”, explica Renato.

Esse compromisso com a causa dos povos originários está expresso em texto que acompanha a mostra e reproduzo a seguir: o Manifesto Amazônia Indígena.

“A exposição e o manifesto dialogam. Um sustenta o outro”, destaca Candotti. que celebra a data escolhida para a inauguração e a homenagem de Renato a um ícone da fotografia no Brasil, que também contribuiu para disseminar a causa indígena. Vamos ao texto:

Manifesto Amazônia Indígena

“’Co yvy oguerecó ijara” “Esta terra tem dono!“. dizia o chefe tupi Guairacá, em 1600. 

Na Amazônia, há milênios, povos indígenas cuidaram da floresta. Por toda parte há marcas da sua presença, do seu manejo. 

Sabemos hoje que, em 1500, aqui viviam mais de seis milhões de pessoas nas florestas, nos rios e lagos. Hoje são 300 mil. 

Essas pessoas foram – e continuam sendo – dizimadas por violências e doenças, promovidas pelos brancos. Doenças para as quais nunca desenvolveram resistência. 

Lembremos os ‘anticorpos’ que faltaram, a indígenas e brancos, para resistir à Covid-19. 

A devastação das florestas, a ocupação prepotente das terras públicas e dos territórios indígenas, ainda são marcas amazônicas. A contaminação dos rios por mercúrio de garimpos e agentes tóxicos também. 

Reparar é preciso. Respeitar as terras que os povos indígenas ocupam. As demarcadas e as não demarcadas. Defender os direitos estabelecidos na Constituição de 1988: viver de modos diferentes, falar línguas próprias – são mais de 150 – preservar a cultura, a memória, as crenças e os hábitos, a fraternidade com a natureza

As fotos em exposição cantam momentos felizes, entre sombras e luzes contam histórias. Renato Soares, maestro e fotógrafo, as ouviu e gravou com rara sensibilidade. Nas trilhas do Musa, deslumbrados, as vemos e ouvimos. Felizes por viver juntos”. 

Agora, mergulhe (mais um pouco) no universo encantador capturado pelo olhar de Renato Soares sobre os indígenas, em comunhão com a floresta do MUSA.

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Mônica Nunes

Jornalista com experiência em revistas e internet, escreveu sobre moda, luxo, saúde, educação financeira e sustentabilidade. Trabalhou durante 14 anos na Editora Abril. Foi editora na revista Claudia, no site feminino Paralela, e colaborou com Você S.A. e Capricho. Por oito anos, dirigiu o premiado site Planeta Sustentável, da mesma editora, considerado pela United Nations Foundation como o maior portal no tema. Integrou a Rede de Mulheres Líderes em Sustentabilidade e, em 2015, participou da conferência TEDxSãoPaulo.