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Em carta à Mourão, deputados europeus declaram preocupação com controle sobre ONGs que atuam na Amazônia

O Vice-Presidente da República, Hamilton Mourão coordena a 2ª Reunião do Conselho Nacional da Amazônia Legal (CNAL).

Ontem, 26/11, 68 parlamentares de vários países europeus enviaram uma carta ao vice-presidente, general Hamilton Mourão, para declarar sua preocupação com o cerceamento e o controle das organizações da sociedade civil que atuam na região amazônica.

A iniciativa partiu da deputada alemã Anna Cavazzini, do Partido Verde, que é vice-presidente da Delegação do Parlamento Europeu nas relações com o Brasil.

Tal proposta faz parte de documentos do Conselho Nacional da Amazônia, que Mourão preside, e foi revelada , no início deste mês, pelo jornal O Estado de SP. Ela seria implementada por meio de um marco regulatório exclusivo para ONGs da Amazônia, criado com o objetivo de controlar suas ações até 2022 e autorizar a atuação apenas das que “atendam os interesses nacionais“.

Quais seriam os critérios para classifica-las nessa categoria e excluir as que não se encaixam nela?

Como é de costume no governo Bolsonaro, a priori, o general negou conhecer tais documentos, mas, em seguida, alegou que houve má interpretação de quem teve acesso a documentação,

“Quem teve acesso à parte dessa documentação – porque essa documentação não foi distribuída em caráter público, ela é uma documentação interna de planejamento estratégico do Conselho – teve uma interpretação errada a respeito dessa questão de marco regulatório para organizações não governamentais”.

E completou: “Essa questão de marco regulatório das organizações não governamentais não passa por nenhum estudo mais sério nesse momento”. Comentou o assunto de forma evasiva, sem confirmar se o conselho pretende aprofundar a questão já que parece existir um interesse por esse controle, declarado inúmeras vezes por este governo.

Constituição já contempla legislação de ONGs

Foto: Instituto Socioambiental/Carol Quintanilha

Ao tomar conhecimento das informações dessa reportagem e da possibilidade de que as ONGs tenham seu trabalho restringido pelo governo, os deputados europeus resolveram agir. E agem com propriedade já que declaram que consideram o papel da sociedade civil imprescindível “na boa governança da União Europeia, além de ser fundamental como parceira para o desenvolvimento“.

Só não vê quem não quer ou tem interesses escusos.

Assim, a carta que não foi enviada somente para Mourão, mas para todos os integrantes do Conselho da Amazônia, deixa claro a preocupação dos parlamentares com o controle das ONGs, já que estes defendem sua independência para atuar na região.

É bom que se esclareça – antes que alguém declare apoiar a ideia do conselho -, que ONGs NÃO SÃO organizações que exploram as comunidades e reúnem pessoas interessadas em usufruir do dinheiro público, como declaram Bolsonaro e membros do seu governo, sempre que têm uma oportunidade.

As ONGs são porta-vozes da sociedade. Fiscalizam e cobram a atuação de governantes e também atuam onde os governos não querem ou não podem porque não têm estrutura, nem especialistas. Em alguns casos, podem se configurar como parceiras dos governos em determinadas questões – conservação do ambiente (que inclui animais) e justiça social são algumas delas – e a única forma de garantir a criação e a execução de politicas públicas.

A carta ressalta isso: “elas ajudam a tornar as políticas públicas mais transparentes e eficazes ao exercer a crítica livre“. A estrutura e os critérios que determinam a existência das ONGs no país já estão contemplados na Constituição.

“Consideramos essa proposta, bem como outras tentativas de restringir ou controlar a sociedade civil como muito preocupantes. O processo de autorização para ONGs já está bem regulamentado pela legislação brasileira“.

Cenário preocupante

Foto: Ronan Frias Semas/Fotos Públicas

O texto reforça a importância das organizações não governamentais no combate ao desmatamento, à proteção do meio ambiente e à implementação de práticas do desenvolvimento sustentável nas comunidades que vivem no bioma.

Na carta, os parlamentares também pontuam que a proposta de um marco regulatório pode se configurar como “um ataque à independência de ONGs”, restringindo “indevidamente o espaço da sociedade civil”.

Os deputados também destacam o recorde de queimadas e o aumento do desmatamento na Amazônia, este ano, e acrescentam: “limitar as operações de grupos sociais e organizações pode ter consequências devastadoras”.

Por fim, declaram apoio às ONGs brasileiras que atuam na Amazônia e estão na mira do governo Bolsonaro e se colocam à disposição para atuar na luta contra a destruição do meio ambiente e a crise climática para que a floresta, clima e as comunidades que nela vivem sejam protegidos.

“Neste contexto, gostaríamos de expressar nosso total apoio às organizações não governamentais que atuam para proteger a Amazônia. Manter sua independência e sua ampla gama de atividades é fundamental para nosso meio ambiente e clima. Portanto, instamos o senhor (general Mourão) a repensar o papel da sociedade civil, entendendo que, como a liberdade de imprensa, ela é vital para democracias saudáveis“.

Denúncias na Corte Internacional

Foto: Divulgação/Tribunal Penal Internacional, Haa

Os parlamentares europeus acreditam que, a carta dá visibilidade internacional às intenções do governo Bolsonaro, o que pode fazê-lo recuar. E esperam uma resposta de Mourão. Muito otimistas.

Marisa Matias, deputada portuguesa do Bloco de Esquerda, justifica seu apoio à carta devido às “permanentes violações do Direito Internacional por parte do governo brasileiro, seja na destruição da Amazônia, seja nos ataques às ONGs, seja na perseguição dos povos indígenas”. E completa: “São crimes contra a humanidade que a todos nós dizem respeito”.

Não é à toa que, pelo menos, três processos foram registrados por advogados brasileiros no Tribunal Penal Internacional (TPI) ou Corte Internacional de Haia, sediada na cidade holandesa de Haia, para que Bolsonaro seja julgado por “crimes contra a humanidade”.

Uma foi em agosto do ano passado, outra em novembro: nesta foi acrescentada a acusação de genocídio contra os povos indígenas.

Em julho deste ano, profissionais de saúde denunciaram Bolsonaro no mesmo tribunal internacional por genocídio e crimes contra a humanidade devido à sua conduta na pandemia. E, em setembro deste ano, estudo indicava ao Parlamento Europeu levar o Brasil à Corte Internacional devido às ameaças aos ativistas, aos povos indigenas e governos locais.

bolsonaro
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil/Fotos Públicas

A pressão está ficando cada vez mais forte. Mas os ataques do governo não param: durante a Cúpula da Biodiversidade das Nações Unidas, em setembro, Bolsonaro proferiu acusações levianas, sem provas, contra as ONGs, por crimes ambientais.

“Na Amazônia, lançamos a Operação Verde Brasil 2, que logrou reverter, até agora, a tendência de aumento da área desmatada observada nos anos anteriores. Vamos dar continuidade a essa operação para intensificar ainda mais o combate a esses problemas que favorecem as organizações que, associadas a algumas ONGs, comandam os crimes ambientais no Brasil e no exterior”.

Vale lembrar que a Operação Verde Brasil 1, liderada por Mourão com o apoio das Forças Armadas, gastou quase o dobro do orçamento anual do Ibama para fiscalização.

Leia também:
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Fonte: DW, Congresso em Foco e Folha de SP

Foto: Romério Cunha/Agência Brasil

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