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Ely Macuxi, escritor indígena vítima de COVID-19, recebe homenagem em defesa de dissertação póstuma

O professor e escritor Ely Ribeiro de Souza, 59 anos, conhecido como Ely Macuxi devido à sua origem Povo Macuxi, da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima –, era defensor aguerrido e incansável da educação indígena de qualidade desde 1990.

Lutou para garantir boa formação para as crianças, integrando ensinamentos não-indígenas e a preservação da cultura e dos saberes dos povos originários.

Dirigiu o Núcleo de Educação Escolar Indígena na Secretaria Municipal da Educação de Manaus, que ajudou a fundar. Também se dedicou ao acompanhamento das primeiras comunidades indígenas na área urbana e sua luta por moradia.

Professor concursado de História da rede pública de ensino em Manaus, era graduado em Filosofia, mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia e especialista em Gestão e Etnodesenvolvimento, formado pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM).

Ely foi professor no curso de Licenciatura Indígena – ‘Políticas Educacionais e Desenvolvimento Sustentável‘ e atuou na formação de professores indígenas do Projeto PiraYawara, no município de São Gabriel do Rio Negro, no Amazonas.

Integrava o Conselho de Educação Escolar Indígena do Amazonas, vinculado à Secretaria Estadual da Educação.

O irmão que falava (e escrevia) bem

Nasceu no interior do Amazonas, mas foi registrado em Manaus. Devido a sua desenvoltura com as palavras, ficou conhecido entre os indígenas como o “irmão que falava bem”.

Mas seu dom não se limitava à palavra falada: dominava a escrita também. tanto que deixou que produziu considerável acervo de artigos e outros gêneros de textos. Era um ótimo contador de histórias.

Em 2010, publicou o livro Ipaty, O Curumim da Selva (Editora Paulinas), que narra a história de um menino e seu cotidiano de aventuras, entremeadas por lendas, mitos e tradições dos Macuxi e das serras próximas à fronteira do Brasil com a Venezuela, onde vive seu povo.

“Mergulho para sentir a areia fria no fundo do rio. Se eu não realizar uma caminhada na floresta, não consigo encontrar o equilíbrio. Para nós, indígenas, fé, crença, religiosidade é tudo e está em todos os lugares”, escreveu em seu livro.

Foi seminarista, educado na Paróquia de Santa Luzia, em Manaus, e, por isso, muito religioso. Amava à natureza como qualquer indígena e não perdeu o hábito de caminhar na mata e tomar banho de rio, o que fazia todos os dias.

“Ele deixa para nós a capacidade de lutar e acreditar que a cultura indígena poderá ser respeitada como uma forma de vida não arcaica, mas atual”, declarou seu filho Luiz Gustavo de Souza, 32 anos, à Folha de SP.

Homenagem póstuma

Ely Macuxi estava prestes a defender sua dissertação de Mestrado em Antropologia Social, na UFAM, quando contraiu o coronavírus e foi vencido pela COVID-19 em 21 de janeiro.

Intitulada Relações Interétnicas em Contexto Urbano: Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno – COPIME, a dissertação foi sua última colaboração acadêmica.

Em sua homenagem, o colegiado do Programa de Pós-graduação em Antropologia Social (PPGAS) da UFAM e seu orientador, Prof. Raimundo Nonato Pereira da Silva, decidiram realizar a defesa de seu trabalho em uma banca póstuma, da qual participaram docentes e discentes.

O encontro foi realizado hoje, 12/2, com transmissão ao vivo. Quem perdeu pode assistir no final deste post. E, quem tiver curiosidade pelo trabalho desenvolvido por Ely, segue a apresentação de sua dissertação, abaixo.

A dissertação

A partir da década de 1990, ampliou-se o processo de mobilização social e política protagonizada pelas lideranças indígenas residentes no estado do Amazonas e na capital amazonense.

Esse movimento se fortaleceu a partir das ações da Coordenação das Organizações da Amazônia Brasileira (COIAB) e por organizações como a Associação das Mulheres indígenas do Rio Negro (AMARN), Associação Indígena das Mulheres Sateré-Mawé (AMISM), o Movimento dos Estudantes Indígenas do Amazonas (MEIAM) e contou com o apoio de instituições de causas humanitárias, ONGs, entidades governamentais.

A ação conjunta das lideranças indígenas e de seus apoiadores resultou, a partir dos anos de 2000, na constituição de importantes organizações indígenas, entre elas, a Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (COPIME) em 2011, agregando 47 organizações indígenas de Manaus e mais 12 situadas nos municípios e entorno da cidade de Manaus, representando aproximadamente três mil indígenas.

Nesse contexto, a presente dissertação, intitulada Relações Interétnicas em Contexto Urbano: Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno – COPIME, teve por objetivo analisar a ação política da COPIME, no período de 2011 a 2018, com ênfase sobre as dificuldades enfrentadas pela mesma, na organização e defesa dos direitos indígenas em Manaus e entorno.

A hipótese que norteou a pesquisa é que tais dificuldades decorrem de dois fatores: a falta de unidade das organizações na luta política e o não reconhecimento étnico ao atendimento as reivindicações indígenas por parte do poder municipal.

Desse modo, partiu-se da preliminar de que os limites e possibilidades das ações da COPIME são de ordem étnica, política e administrativa no contexto das relações internas, mas também de ordem política de resistência por parte do poder público em não atender as demandas sociais indígenas na quantidade e qualidade desejadas.

Assim sendo, a presente pesquisa demonstra o protagonismo indígena através do processo de institucionalização da COPIME, enquanto elemento organizador, político e de decisão, na luta política étnica pelo acesso às políticas sociais, suas dificuldades e os ganhos políticos e sociais efetivos para os povos indígenas em Manaus e entorno.

Abaixo, o vídeo da defesa de dissertação póstuma:

Fontes: ISA – Instituto Socioambiental, Folha de SP

Foto: Divulgação

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