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Buá. Buá. Procura-se um peito forte

Buá. Buá. Procura-se um peito forte

Buá. Buá. Nenê quer peito forte que não tenha medo de quedas. Que não procure clones ou silicones. Quer peito de mãe que queira dar pérola nem que seja aos porcos, mortos tão bem em fotos. Peito de mãe que saiba o valor de cada gota. Peito de mãe que não se desmanche na teia tecida pela modernidade. Mãe (e pai) que não se embolem correndo em torno do próprio rabo, pensando que proteção e carinho se constroem com babá, vovó e seu xodó.  

Buá. Buá. Procura-se um peito forte

Esse peito que a artista Eunice Terres bordou me fez pensar em tanta coisa. Não é, claro, nenhum diagnóstico sociológico, baseado em pesquisas. É um livre pensar, só pensar. Essas opiniões que a gente dá na mesa do bar, sentado em frente ao mar, de bobeira no lar, vendo a sociedade sangrar.

Buá. Buá. Procura-se um peito forte

Queria saber até quando vai haver coração para aguentar ter filhos que não são criados pelos pais. Até quando os pais e mães vão ter que trabalhar oito, doze horas e sair correndo para pegar a criança na casa da sogra?

Essa história de colocar filho no mundo para ver só à noite e rapidinho na hora do almoço é triste demais. Quando se construirão arranjos sociais menos capitalistas em que as jornadas de trabalho sejam menores e que pai e mãe possam se alternar na educação, sem precisar mandar o filho para creche mal andando e falando…

Quando as agendas das crianças não serão preenchidas com aulas disso, daquilo e mais aquilo outro só para que elas não fiquem em casa sozinhas ou tenham que ser carregadas para os avós? Aulas em período integral. Uau que legal! Para os cofres das escolas…

Buá. Buá. Procura-se um peito forte

Não gostaria, não queria que fosse preciso bloquear convivência e amor para aumentar o tempo  de permanência na escola, no emprego. Deveria ser o contrário numa sociedade justa. Menos horas no emprego abrem possibilidade de vagas de trabalho nesse mundão de desemprego. Claro que o salário vai acabar caindo numa economia  em que todos os olhos se voltam para produtividade e lucro. Como o investimento no ser humano fica tão em segundo plano?

Buá. Buá. Procura-se um peito forte

Mas, dá para pensar que a economia com a escola, com os trezentos cursos e o gasto com a babá podem amenizar bem a perda salarial e melhorar a qualidade de vida das mãetoristas e paitoristas que passam horas no trânsito correndo do inglês para o balé, para o violão. Ô vida mais sem razão essa de leva e traz.

De mais a mais, numa sociedade ideal, justa, igualitária, salário de pai não é como acontece, tantas e tantas vezes, maior que o da mãe. Embora, é bom que se diga, tenha muita mãe se matando de trabalhar como diarista, fazendo um dinheiro equivalente ao do marido…

Acho mesmo que independe de profissão, classe. Tenho pra mim que de maneira geral, pais, mães e filhos têm convivido muito menos. Como ser família em época de chiques CEOs, trabalhando até no banheiro ou com a uberização social em que o trabalhador vai ficando, ficando na rua, sem tempo de ir ao banheiro, esperando que a função direcionamento do aplicativo resolva mandar para casa.

Depois de tanto trabalho, minguam, secam a vontade de conviver, de brincar, conversar com o filho, com o parceiro. É chegar em casa, comer qualquer coisa e despencar na cama, sem outono, inverno, primavera, verão.

Buá. Buá. Procura-se um peito forte

Que direção tomar, não? Parece tudo meio em vão. Como ficar são? Como não ficar alegre e triste ao ver uma cabeça cabeluda despontando ali no meio das pernas abertas, num útero em contração, faltando chão e mão para amparar? Coloco em discussão a sina da vagina. Vejo tanta beleza nas folhas-vaginas da Eunice Terres.

Já escrevi sobre elas aqui no Arte na Roda, quando ainda estavam verdes, sem nem conhecer Eunice direito, sem nem ter conversado com ela, sem nem as ter visto em exposição, sem nem saber que Eunice as chamava de vagina.

Dei um encontrão com as fotos na internet e a escrita veio de supetão.  Só bem mais tarde, fui numa exposição e ela me falou mais desse seu jeito que vê natureza no corpo humano, corpo humano na natureza. Quem sabe se víssemos essa conexão com mais frequência a destruição ambiental doiria mais na nossa carne.

Mas continuando. Vejo tanta coisa nessa moita de folhas-vaginas se moldando ao seco destino, bordadas de tempo…. Acabo achando que estão preferindo vento a rebento. Mas isso é minha suspeita opinião. Como é que elas vão querer colocar filhos no mundo para morrerem na luta básica por direitos humanos? 

Não vão querer que seu filhos sejam atacados pelas agulhas desses vodus. Que terminem vangloriados em missa de sétimo dia. Ou pregados na cruz da ignorância religiosa que faz questão de apagar imagens fortes responsáveis por bordar menos preconceito e racismo assassino nos teares que buscam nos ares dos buracos, dos vazios, pontos de razão equânime. 

Ah, essa TRAMA (nome também da exposição que, infelizmente, já acabou) toda que despedaça, há de tercer dias melhores… Está nas nossas mãos o nosso chão. Não podemos deixar puxarem os tapetes dos nossos pés. Comecemos por bordá-los. Por bordar-nos. É difícil. Dói. Exige. Mas, é mais do que necessário.

É vital deixar nascer, fazer crescer, abraçar o amadurecer de um espaço com credos outros, em que percebamos a proximidade de um céu, de um inferno bem real, bem do nosso lado, bem menos metafísico, com bem mais responsabilidade pela construção da desgraça e da graça. Se fosse para cair do céu um mundo melhor na nossa palma já haveria de ter caído, né, rebanho? Esperar até quando o provimento, em vez de arregaçar as mangas? Põe a tanga e pensa nisso aí na cadeira nessa praia de janeiro.

As fotos são do marido da Eunice, Marcos Guiraud, que estava sempre lá na exposição, ao lado dela, na luta.

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