Sidiney de Oliveira Silva, de 44 anos, conhecido como Neném ou Nenê, era ambientalista e atuava como brigadista no Programa do Centro Nacional de Prevenção e Combate a Incêndios Florestais (PrevFogo) e, também, presidente da Associação de Brigadistas da Brigada Federal (Brif) Nordeste do Ibama, até a manhã do último sábado (15), quando foi morto a tiros.
O crime aconteceu em frente à sua casa, na Aldeia Imotxi II, em Formoso do Araguaia, um dos municípios que integram a Ilha do Bananal, no Tocantins. Ele era descendente do Povo Karajá, habitantes seculares das margens do rio Araguaia em Goiás, Tocantins e Mato Grosso.
Segundo informações divulgadas pela Secretaria de Segurança Pública (SSP) do Tocantins, Sidiney acordou por volta das 7h30 e checava água e óleo do carro quando foi alvejado por um tiro disparado “de um imóvel abandonado localizado em frente à sua residência” e “aparentemente desferido por uma espingarda cartucheira”.
“Um vizinho contou à polícia que, mais cedo, enquanto ainda estava escuro, avistou uma motocicleta parada na esquina e havia um homem de jaqueta e capacete. Segundo consta, essa pessoa teria ficado um tempo no local e, logo depois, sobreveio o disparo que atingiu Sidiney”, informou a SSP.
A 84ª Delegacia de Polícia Civil de Formoso do Araguaia está encarregada de investigar o caso, mas, de acordo com a SSP, para não atrapalhar as investigações, só serão divulgadas informações em “momento oportuno”, quando estiverem mais avançadas.
Mas, segundo o jornal O Globo, ele vinha sendo ameaçado por fazendeiros e grileiros por impedir queimadas e invasões em terras indígenas na Ilha do Bananal. Portanto, sua morte pode ter sido encomendada. O brigadista chegou a prestar depoimento no Ministério Público Estadual (MPE) sobre invasões de pecuaristas em terras indígenas da Ilha, mas, questionado pelo O Globo, o órgão não respondeu.
Wallace Lopes, diretor da Associação de Servidores do Ibama (Ascema Nacional), contou à Rádio Nacional que Sidnei “sempre denunciava crimes ambientais” e “tinha muitas inimizades” por isso. E ainda destacou: “Hoje, a gente tem uma ilha do Bananal praticamente toda cercada por pastos, por cercas, coisas que não existiam poucos anos atrás. Então, é uma região que tem, sim, um conflito social ocorrendo nesse momento”.
Em nota, a entidade declarou: “Nenê era um símbolo na luta contra os incêndios florestais e na proteção da ilha. Ele dedicou sua vida a proteger nossas florestas, a fauna e os indígenas. A Ascema Nacional lamenta profundamente essa perda irreparável e destaca a urgente necessidade de que crimes contra ambientalistas, como o caso do Nenê, sejam solucionados com agilidade e que os responsáveis sejam exemplarmente punidos. Que o legado de Nenê inspire a todos na contínua luta pela preservação do meio ambiente e pelos direitos dos povos indígenas”.
Vale lembrar que Sidiney morreu em meio ao movimento dos agentes do Ibama por melhores salários e melhores condições de trabalho, entre elas, segurança.
Relatos de ameaças a servidores ambientais começaram a crescer no governo Bolsonaro e nunca pararam, ganhando ainda mais força após os assassinatos de Maxciel Pereira dos Santos, servidor da Funai, em Tabatinga, no Amazonas (cidade que faz fronteira com Colômbia e Peru), em 2019, e do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, em 2022, no Vale do Javari, quando estavam a caminho de Tabatinga.
Em abril deste ano, entidades que representam a categoria dos servidores ambientais foram ao Senado reivindicar urgência na tramitação do PL n° 2934/2022 (a ex-deputada federal Joênia Wapichana que, hoje, é presidente da Funai, assina a autoria com outros colegas), que altera a Lei do Estatuto do Desarmamento (10.826/2022) para autorizar o porte de arma de fogo para os servidores do Ibama, da Funai e do ICMBio.
Expertise reconhecida
De acordo com o Ibama, Sidiney tinha ampla experiência no manejo integrado do fogo e operava equipamentos especiais de combate a incêndios como o Sling Dragon, utilizado a partir de helicópteros.
Leandro Milhomem Costa, superintendente do Ibama do Tocantins, contou, ao O Globo, que o ambientalista era “brigadista experiente e qualificado no manejo do fogo preventivo”. E acrescentou: “Ele já foi contratado em outros anos pelo Prevfogo do Ibama Tocantins e estava selecionado para atuar junto à Brigada Nordeste da Ilha do Bananal este ano. Não temos informações sobre a motivação do crime”.
Segundo a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), o ambientalista era um dos principais conhecedores da região e deu apoio logístico ao órgão quando, em sobrevoo em helicóptero de combate a incêndio, em outubro de 2019, avistou oito integrantes do povo indígena isolado Avá-Canoeiro, antes dado como extinto em uma área da ilha conhecida como a Mata do Mamão.
Defensor incansável dos povos indígenas
Bolivar Xerente, coordenador da unidade da Funai localizada em Palmas, no Tocantins, destaca o legado de Nenê para a questão indígena. “Ele era uma pessoa prestativa, atuando pela Funai como colaborador. Ele apoiava a gente como um guia porque conhecia bem a Ilha do Bananal. Em todas as nossas ações de indígenas isolados na região, ele era a primeira pessoa que procurávamos. Ele contribuiu muito para a questão ambiental e para os direitos indígenas”.
Guilherme Martins, coordenador de Política de Proteção e Localização de Indígenas Isolados da Funai e amigo de Sidiney, ressalta a importância de Nenê para a região e lamenta o assassinato de mais um defensor de causas ambientais, lembrando também a morte de Bruno Pereira e Dom Phillips.
“Nenê era um defensor incansável da Ilha do Bananal, este verdadeiro santuário de sociobiodiversidade. Infelizmente a cobiça de alguns destrói a vida na maior ilha fluvial do planeta, despedaçando agora, também, a vida do nosso amigo”. E questiona: “No segundo país que mais mata ambientalistas do mundo e apenas dez dias após o Estado Brasileiro prestar homenagem ao nosso amigo Bruno Pereira, prometendo que isso jamais iria se repetir, temos que enterrar mais um camarada. Até quando?”.
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Foto (destaque): arquivo pessoal
Com informações da Agência Brasil, Rádio Nacional, O Globo
Até quando teremos que ver os nossos defensores da natureza e dos povos originários mortos covardemente por esses predadores do meio ambiente? Onde está a punição exemplar para essa gente? Revoltante!