Ataques de tubarão a seres humanos sempre geram muita comoção. Não poderia ser diferente, já que, em geral, as vítimas acabam morrendo ou ficando com graves sequelas. É o caso, por exemplo, do que ocorreu com uma criança de 8 anos, que visitava a ilha de Fernando de Noronha com a família e foi atacada na Praia do Sueste, no final de janeiro. Infelizmente, a menina precisou ter a perna amputada.
Esta não é a primeira vez que um acidente assim acontece em Noronha. Em 2015, um turista perdeu o antebraço direito depois de também ser atacado por um tubarão. Todavia, episódios assim são raros, mas não impossíveis, já que o local é um parque marinho, onde há presença de vida selvagem.
Desde o ataque, a Praia do Sueste foi fechada. E segundo empresários locais, o turismo teria sentido o impacto do ocorrido. As pessoas estariam temerosas de frequentar as praias de Noronha.
Mas esta semana, o ministro do Turismo, Gilson Machado Neto, acompanhado do presidente do Instituto Chico Mendes da Biodiversidade (ICMBio), Marcos Castro Simanovic, esteve na ilha e anunciou que o governo estuda a colocação de telas de contenção em Sueste para evitar a aproximação de tubarões e assim, garantir a segurança dos banhistas.
O engenheiro de pesca Léo Veras, que estuda tubarões há mais de 30 anos, defende a ideia. “É uma medida defensiva para proporcionar segurança para as pessoas. É uma tecnologia com mais de 50 anos de uso e tem baixo impacto ambiental. O equipamento não interfere no sistema ecológico do ambiente”, afirmou ele em entrevista ao portal de notícias G1.
O pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco e doutor em Ecologia Marinha, André Sucena Afonso, esclarece que o dispositivo em estudo não seria uma rede, mas uma tela, o que evitaria que peixes e outros animais ficassem presos nele, sem riscos de mortalidade para a fauna marinha.
Seria criada uma espécie de curral ou cercado na praia para impedir o acesso dos tubarões. “Acredito que é uma solução benéfica porque a área delimitada na Praia de Sueste seria pequena e haveria pouco impacto ambiental. Seria uma forma de garantir a segurança dos turistas”.
Todavia, outros especialistas ouvidos pelo Conexão Planeta, questionam a possível solução.
“Sou absolutamente contra às telas pois constituem uma restrição ao habitat dos peixes. Além disso, são de difícil manutenção pois exigem constantes reparos e limpeza. Melhor é a utilização de placas educativas e restrição ao uso da praia”, diz o biólogo Ricardo de Souza Rosa, professor aposentado da Universidade Federal da Paraíba e pesquisador de biologia de tubarões e raias.
O professor do Departamento de Oceanografia da Universidade Federal do Rio Grande Norte, Guilherme Longo, também questiona o uso das telas de contenção. “Os acidentes com tubarão são sempre grandes fatalidades e entendo todo o impacto e a dor que causam, assim como a nossa percepção como sociedade. Mas se dermos um passo atrás e tentarmos compreender essa situação com um olhar biológico, Fernando de Noronha é uma arquipélago oceânico, isolado, e protegido parcialmente por um parque nacional. É normal um tubarão entrar nessas águas, numa baía, se alimentar e descansar. Faz parte do ciclo natural do animal”.
Para Longo, quando se visita um lugar como Noronha é preciso entender que ali é um ambiente natural e esse tipo de risco realmente existe, apesar de estatisticamente ser muito baixo.
Ainda segundo ele, nos últimos anos há um discussão sobre o possível aumento da observação de tubarões nas praias da ilha. “Na verdade, esse fato que tem gerado grande preocupação, deveria ser visto com grande alegria, se é que a população de tubarões cresceu de verdade, já que não há ainda nenhum trabalho científico que prove isso. A volta dos tubarões, após muito tempo em que esses bichos foram caçados, deveria ser celebrada, comprovando que esse é um ecossistema equilibrado”.
Diante desse cenário, o biólogo pergunta se é realmente necessário liberar a visitação nessa determinada praia. Para ele, o debate deveria estar focado na quantidade de turistas que visitam Noronha. “Há uma taxa de visitação muito maior do que havia anos atrás e não há um debate amplo sobre isso – o número de voos para a ilha, a visitação excessiva… Para mim o debate deveria ser inverso. Acho que o modelo de turismo e exploração de Fernando de Noronha precisa ser repensado ao invés de se adotar um modelo intervencionista, que impede a passagem natural dos tubarões na baía, sem ao menos ter um estudo de impacto sobre essa ação”.
Composto por 21 ilhas e ilhotas, o arquipélago de Fernando de Noronha foi declarado Patrimônio Natural da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). A Praia do Sueste fica localizada dentro do Parque Nacional Marinho, onde estão ainda alguns dos mais famosos pontos de visitação, como as Praia do Leão, da Atalaia, do Sancho e a Baía dos Porcos.
A Praia do Sueste, na imagem acima, continua fechada para os turistas
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Fotos: Marion Kraschl/Creative Commons via Wikimedia Commons (abertura tubarão tigre) e Bruno Lima – MTUR/Flickr (Praia do Sueste)