Os ursos polares (Ursus maritimus), maiores carnívoros terrestres do planeta, vivem no Ártico. Eles passam a maior parte do ano no gelo marinho, onde caçam focas, sua dieta quase exclusiva, e também, onde se acasalam. É durante o inverno que se alimentam mais para ter reservas calóricas e poder sobreviver aos meses de verão, quando há menos oferta de comida.
Mas o que acontecerá aos ursos polares com o aumento crescente do degelo no continente ártico? Desde a década de 70, essa região do planeta registra um aquecimento duas vezes acima da média global.
Para responder a essa pergunta, pesquisadores do Alaska Science Center, Centro de Ciências do Alasca, e do Centro de Estudos de Ursos da Universidade Estadual de Washington, decidiram investigar os impactos das mudanças climáticas sobre o comportamento desses animais. Para isso, acoplaram colares equipados com câmeras GPS em 20 ursos na Baía de Hudson, no Canadá – oito fêmeas e cinco machos adultos, além de quatro fêmeas e três machos jovens.
A escolha do local se deu porque o período sem gelo ali aumentou em três semanas entre 1979 e 2015, o que significa que na última década os ursos estiveram em terra durante aproximadamente 130 dias.
Com as imagens obtidas, os cientistas conseguiram estudar o comportamento deles durante o período do ano que é mais quente, com menos gelo, e quando esses animais são obrigados a passar mais tempo em terra.
No artigo científico publicado na revista Nature Communications, os cientistas relatam preocupação com a análise. Através das imagens, eles conseguiram avaliar a dieta, a movimentação e a despesa calórica dos ursos durante um período de aproximadamente 20 dias, de agosto a setembro, época do verão no Hemisfério Norte, ao longo de três anos.
Nos vídeos é possível ver os animais comendo frutas vermelhas, carcaças de aves e até uma baleia beluga. Há ainda momentos em que brincam como se fossem cachorros, ou então, nadam longas distâncias no mar. Um deles percorreu 175 km. E muitas vezes, eles apenas descansam.
Até então, biólogos acreditavam que, com a pouca demanda de alimentos nesse período do ano, ursos polares ficariam mais inertes, poupando energias, ou buscariam outras presas para compensar a falta das focas, que têm alta quantidade de proteína e gordura. As imagens das câmeras indicam que as duas estratégias são utilizadas, entretanto, não são suficientes para manter o peso corporal, que é, em média, de 500 kg para um macho.
Todos os 20 ursos polares que fizeram parte da pesquisa emagreceram. Um deles chegou a perder 36 kg.
“Houve poucos benefícios do forrageamento terrestre, já que 19 em cada 20 ursos perderam massa (0,4–1,7 kg por dia). Embora os ursos polares em terra exibam uma plasticidade comportamental notável, as nossas descobertas reforçam o risco de fome, particularmente em subadultos”, dizem os pesquisadores no artigo.
Eles explicam que embora a maioria dos ursídeos, família de mamíferos à qual os ursos polares fazem parte, sejam onívoros oportunistas, eles são altamente especializados, alimentando-se quase exclusivamente de focas.
“Nenhuma das estratégias permitirá que os ursos polares existam em terra além de um determinado período de tempo. Mesmo os ursos que estavam em busca de alimento perderam peso corporal na mesma proporção que aqueles que descansaram”, relata Charles Robbins, co-autor do estudo. “Os ursos polares não são ursos pardos que usam casacos brancos. Eles são muito, muito diferentes.”
Para os autores do estudo fica claro que, quanto mais tempo esses animais passarem em terra, maiores as chances deles morrerem de fome.
“Nossos resultados indicam que, enquanto estão em terra, os ursos polares não respondem uniformemente em seu comportamento, dieta ou respostas energéticas, mesmo dentro da idade, sexo, classes reprodutivas ou entre níveis semelhantes de condição corporal. No entanto, os declínios na massa corporal foram consistentes entre 95% dos ursos do nosso estudo, o que enfatiza que nenhuma das estratégias energéticas foi mais benéfica para sobreviver no período em terra”, afirmam.
“Com o aumento do uso da terra, a expectativa é que provavelmente veremos um aumento na fome, especialmente entre jovens e fêmeas com filhotes”, prevê o biólogo especialista em vida selvagem, Anthony Pagano, principal autor do estudo.
Estima-se que a população global de ursos polares seja de 25 mil indivíduos e a principal ameaça para a sobrevivência da espécie é a crise climática.
Abaixo um clipe com alguns dos momentos gravados pelos colares colocados nos ursos polares do Canadá:
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Foto de abertura: David-McGeachy / Washington State University