A pedido do Ministério Público Federal, o TRF1 determina a retirada de garimpeiros da Terra Indígena Yanomami devido à pandemia

Esta é a melhor notícia desta semana!! A situação dramática enfrentada pelo povo indígena Yanomami há anos e que tem se agravado com a pandemia do coronavírus, foi finalmente compreendida e acatada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que, hoje, 3/7, determinou a retirada imediata de garimpeiros de suas terras.

Por meio dessa determinação, a União, a Funai, o Ibama e o ICMBio devem apresentar aos órgãos públicos, em cinco dias, um plano emergencial – e seu respectivo cronograma – para conter o avanço da Covid-19 na Terra Indígena Yanomami, principalmente a partir da expulsão dos garimpeiros. Após sua conclusão e aprovação, o plano deverá ser executado em dez dias e durante todo o período da pandemia.

A atuação de garimpeiros ilegais na maior terra indígena do país – que também abriga índios isolados – é histórica, desde os anos 1970. Hoje, são cerca de 20 mil que, mesmo com a pandemia, não cessaram suas atividades, muito ao contrário. Parecem se sentir legitimados e incentivados pelo presidente Bolsonaro, e se transformaram-se o principal vetor de disseminação da doença.

Além da retirada de garimpeiros, o plano emergencial deverá contemplar o monitoramento territorial efetivo da TI Yanomami para “combater ilícitos ambientais”.

Ameaça histórica

Foto: Chico Batata/Greenpeace

De acordo com nota publicada pelo MPF, em seu site, a determinação do TRF1 é uma “decisão proferida pelo desembargador federal Jirair Aram Meguerian em ação civil pública, que deferiu em parte pedido de tutela de urgência do MPF, para impor obrigações, solidariamente, à União, à Fundação Nacional do Índio (Funai), ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). 

A nota ainda destaca que o desembargador não nega a adoção de ações por parte dos órgãos, mas reconhece que as medidas, até então implementadas, têm sido insuficientes e inefetivas à tutela da TI Yanomami e da população indígena em questão. “(…) além da TIY não ter sido inserida, até 4/6/2020, como alvo prioritário do Grupo de Combate ao Desmatamento da Amazônia, no planejamento anual de 2020, há aparente contradição quando afirma, ao final, que será incluído como prioritário no mês de julho, quando os requeridos afirmam que as ações do Plano Anual de Proteção Ambiental, na região, ocorreriam no mês de junho”, afirma.

Alisson Marugal, procurador da República que atuou na ação na 1a instância, relatou que a presença de milhares de garimpeiros legais no território (mais de 20 mil mineradores contra uma população de cerca de 26,7 mil indígenas Yanomami) e a urgência de ações mais efetivas foram evidenciadas por documentos anexados ao processo e informações fornecidas pelos órgãos envolvidos.

O Ministério Público Federal destaca ainda que os povos da TI Yanomami são vítimas da omissão estatal na contenção de garimpeiros desde a década de 1970. E lembra que, em 1985, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos expediu a Recomendação 12/1985, na qual aconselhou o Estado brasileiro a adotar “medidas sanitárias de caráter preventivo e curativo a fim de proteger a vida e a saúde dos índios expostos a adquirir enfermidades infectocontagiosas”.

Passaram-se 35 anos dessa recomendação e, destaca o MPF, “persiste a mora do Poder Público em instalar e operar, de modo contínuo, uma rede de proteção e monitoramento territorial hábil a inibir a ação de garimpeiros na região, em face do consenso internacional de que à TI é devida especial atenção estatal”.

Por tudo isso, no início de junho, lideranças do povo Yanomami, com o apoio do Instituto Socioambiental (ISA), lançaram a campanha #ForaGarimpoForaCovid, composta por uma petição destinada a autoridades do Legislativo e do Executivo e por um vídeo tocante (que você pode assistir no final deste post), como noticiamos, aqui, no Conexão Planeta

Esta é apenas uma das etapas desta luta. Lembremos que a determinação do TRF1 se refere apenas ao período da pandemia e o governo está nas mãos de um sujeito que incentiva a exploração econômica das terras indígenas a qualquer custo. Portanto, é preciso continuar reivindicando a proteção desses territórios e a demarcação das terras que ainda estão sem esse registro. Só assim, protegendo os verdadeiros guardiões da floresta, será possível fazer justiça e garantir um futuro digno e saudável para todos os brasileiros.

Risco de extermínio dos isolados

Dados divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), recentemente, reforçam, ainda mais, o crescimento do número de evidências de garimpo ilegal na TI Yanomami a partir de fevereiro de 2020.

Além de graves questões ambientais e de segurança, tais ataques vieram acentuar o risco de transmissão comunitária da nova doença, já que esses povos têm maior vulnerabilidade biológica, em especial às infecções respiratórias. E, apesar de deixar a desejar em várias localidades onde atua, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), órgão do Ministério da Saúde, reconhece essa situação.

A vulnerabilidade dos Yanomami nesta pandemia ganhou repercussão internacional com reportagem do The New York Times, que relatou o caso da primeira vítima fatal de Covid-19, o adolescente Alvaney Xirixana, de 15 anos.

O fato de haver povos isolados, como os Moxihatëtea, nessas terras, torna a presença de garimpeiros ainda mais preocupante: o contágio por Covid-19 pode levar a seu extermínio, alerta o MPF. “Há perigo concreto de morte de mais indígenas por dupla ameaça: a invasão de garimpeiros na terra indígena e a pandemia do coronavírus. Essa decisão obriga o governo a sair de sua inércia e a salvar muitas vidas do povo Yanomami e de outros povos que habitam a região”, destacou o procurador Regional da República, Felício Pontes.

Abaixo, conheça as medidas determinadas pelo TRF1, que o plano emergencial deve contemplar.

Medidas do Plano Emergencial

Foto: Vinícius Mendonça / Ibama

Fixação de equipes interinstitucionais formadas por forças de comando para a contenção dos ilícitos em pontos estratégicos onde há garimpo na TI – como fiscais do Ibama, do ICMBio, Força Nacional, militares das Forças Armadas e das Polícias Militares Ambientais, Policiais Federais e servidores da Funai;

– Efetivo suficiente e adequado para ações estratégicas repressivas e investigativas; 

– Disponibilização de meios materiais essenciais (alimentos, insumos, serviços e equipamentos); 

– Apresentação de relatórios quinzenais que comprovem o cumprimento da liminar;

– Garantia de imediata retirada de todos os garimpeiros não indígenas e seu não retorno, mantendo-se a presença estatal de forma permanente durante todo período em que reconhecida a pandemia da covid-19; e

– Medidas para não agravar o risco de contaminação na TI, de forma que as equipes designadas para execução do plano adotem medidas sanitárias rígidas de prevenção, como quarentena prévia e não aproximação de populações indígenas.

A União fica obrigada, ainda a:

– promover a coordenação para mobilizar as forças de comando e controle de diferentes ministérios (Ministério da Justiça, Ministério da Defesa, Ministério do Meio Ambiente) para apoio ao exercício de poder de polícia necessário à implantação do plano;
– viabilizar os meios de pessoal e orçamentários necessários; e
– promover o acompanhamento da execução do plano, entre outras imposições.

Agora, assista ao vídeo da campanha #ForaGarimpoForaCovid:

Foto (destaque): Victor Moriyama/Instituto Socioambiental

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Mônica Nunes

Jornalista com experiência em revistas e internet, escreveu sobre moda, luxo, saúde, educação financeira e sustentabilidade. Trabalhou durante 14 anos na Editora Abril. Foi editora na revista Claudia, no site feminino Paralela, e colaborou com Você S.A. e Capricho. Por oito anos, dirigiu o premiado site Planeta Sustentável, da mesma editora, considerado pela United Nations Foundation como o maior portal no tema. Integrou a Rede de Mulheres Líderes em Sustentabilidade e, em 2015, participou da conferência TEDxSãoPaulo.