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A escola como espaço de vida


Durante muitas décadas, as crianças viveram a experiência escolar alimentadas pela esperança de viver do lado de fora quando o sinal batesse. Afinal, havia a rua como espaço público e de relações, onde encontravam os vizinhos e os amigos. A rua, o bairro e a cidade eram os lugares de reunião, de convívio com o outro, de expansão para além do conforto e da segurança da casa.

Territórios para explorar, exercitar a autonomia, flertar com o risco benéfico, ter contato com a natureza. A rua era o lado de fora da escola, e a escola era o lugar de ficar sentado, quieto, comportado, aprendendo o que era esperado. Eram tempos de cisão, divisão e separação.

O tempo passou e não se pode negar significativos avanços na educação, sobretudo a partir da Constituição Federal de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases de 1994, que garantem como direito o acesso à educação básica. Entretanto, a educação baseada no conteúdo em detrimento da experiência, na fragmentação de tempos e conhecimentos, em projetos educativos desconectados do território e na baixa participação dos estudantes e da comunidade no cotidiano escolar ainda prevalece, e faz com que milhares de crianças vivenciem uma experiência de perda: a profunda desarticulação entre o processo de aprendizagem e a própria vida.

Mas, e hoje? Por um lado, a experiência da rua quase não existe mais. Dificilmente encontramos crianças de diferentes idades e contextos culturais e sociais do lado de fora, depois da aula. Muitos espaços abertos foram ocupados por construções ou tornaram-se sujos. As praças e parques estão vazios de crianças durante a semana. Há muitos carros, é perigoso. Ninguém tem tempo e o mundo digital oferece alternativas ao que antes satisfazíamosdo lado de fora: a necessidade de estar no controle de nossa própria vida, de formar laços sociais e de nos sentirmos competentes.

Simultaneamente, projetos e experiências voltados à integração entre comunidades, escolas e territórios se fortalecem, seguindo a trajetória de propostas pioneiras como a Escola Parque de Anísio Teixeira e os Parques Infantis de Mario de Andrade. São programas que propõem a ampliação da jornada escolar e a reorganização curricular, apostando na ampliação dos tempos, espaços, linguagens e na constituição de comunidades de aprendizagem formadas por atores que estão dentro e fora da escola.

E, assim, emerge a necessidade de fortalecer a escola como espaço de vida, de relações, de brincar, de se movimentar, de significado e de interesse. Espaços de sentir-se bem. Porque, ao longo do tempo e das novas formas de organização da sociedade, as crianças passaram a ficar cada vez mais na escola e em outros espaços institucionais ou fechados, e também porque, se as algumas experiências fundamentais da infância não acontecerem na escola, talvez elas não aconteçam em outro espaço-tempo.

Estudos recentes apontam que ambientes ricos em natureza, incluindo as escolas com pátios e áreas verdes, praças, parques e espaços livres para o brincar, ajudam na promoção da saúde física, mental e no desenvolvimento de habilidades cognitivas, sociais, motoras e emocionais das crianças. Urge pensarmos no desemparedamento da infância para que todas as crianças possam ter um desenvolvimento saudável e com maior liberdade nos espaços abertos das cidades.

Essa situação coloca um desafio para as escolas: como elas podem contribuir na garantia do direito que as crianças têm de conviver com a natureza durante o seu crescimento? Pelos quatro cantos do Brasil e do mundo há experiência de escolas que ousaram sair das salas de aulas e permitiram que as crianças aproveitassem os pátios escolares e outros territórios educativos como ambientes de aprendizado e brincar livre. Há também muitas pesquisas e estudos sobre o tema.

Inspirando-se nessas fontes, o programa Criança e Natureza, do Instituto Alana, sistematizou alguns caminhos do processo de ressignificação dos espaços escolares como locais potentes para o aprender com a – e na – natureza, e lançou em maio a publicação Desemparedamento da Infância: a escola como lugar de encontro com a natureza (clique no link para baixar o PDF) destinada aos gestores das secretarias de educação, educadores e todos os demais interessados em ampliar suas possibilidades de fazer uma educação conectada com a vida que pulsa do lado de fora.

A publicação conta com prefácio de Lea Tiriba, educadora ambientalista e professora da Escola de Educação da UNIRIO, e reúne informações conceituais, exemplos de experiências nacionais e internacionais, sugestões de materiais de referência, além de princípios orientadores para possibilitar o contato com elementos e ambientes naturais em processos educativos.

Conta, também, com o apoio institucional da Aliança Internacional de Espaços Escolares (International School Grounds Alliance – ISGA), e é o nosso convite para embarcarmos juntos no movimento mundial que advoga por espaços mais amplos, mais verdes, mais naturais, com tempo e liberdade para usufruí-los na vida escolar de todas as crianças, de todas as idades.

Foto: Rinaldo Martinucci/Divulgação

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MARIA CLARET RIBEIRO COUTO
MARIA CLARET RIBEIRO COUTO
5 anos atrás

Aqueles que já praticam esta integração se sentem privilégiados…

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