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A Distância que nos Une: relatório da Oxfam revela o retrato (cada vez mais cruel) da desigualdade no Brasil

 

Ao tomar conhecimento do novo relatório sobre desigualdade no Brasil, lançado esta semana pela ONG britânica Oxfam, três palavras me vieram à mente: imoral, indecente, pornográfico. Talvez ainda influenciada pelo estardalhaço recente que um bando de jovens conservadores fez, em Porto Alegre, contra a exposição Querrmuseu, no Santander Cultural – que consideraram as obras dignas dessas ‘qualidades que acabo de citar – e que resultou no seu cancelamento.

Ora, indecentes não são os costumes e intimidades de séculos revelados nas paredes de uma galeria, mas o que nos mostra o estudo A distância que nos Une: Um Retrato de Desigualdades Brasileiras! Então, por que não há manifestações acaloradas da sociedade contra esta realidade?

Apenas seis brasileiros, os mais ricos do país, detêm riqueza equivalente a dos 100 milhões de pessoas mais pobres, ou seja: metade dos da população (hoje, somos 207,7 milhões). Para se ter ideia da dimensão da fortuna que acumulam, basta dizer que Carlos Alberto Sicupira (AB Inbev),  Eduardo Saverin (Facebook), Ermírio Pereira de Moraes (Grupo Votorantim), Jorge Paulo Lemann (AB Inbev), Joseph Safra (Banco Safra) e Marcel Hermmann Telles (AB Inbev) levariam 36 anos para liquidar com seu patrimônio, se gastassem um milhão de reais por dia. Pasme!

Eis alguns dados estarrecedores da discrepância social em que está mergulhado o país:
– os 10% mais ricos pagam menos tributos que os 10% mais pobres. Por aqui, quem ganha menos é punido e paga mais impostos indiretos, advindos de produtos e serviços: são 28% contra 10% pago pelos ricos. Reforma tributária, já! A sociedade tem que se engajar nessa causa;
– em um mês, os muuito ricos (1% da população brasileira) recebem o mesmo que uma pessoa que ganha um salário mínimo (937 reais) levaria para acumular em 19 anos seguidos. Estes representam cerca de 23% dos brasileiros;
– a diferença de salários entre mulheres e homens só diminuirá daqui 30 anos, ou seja, em 2047 (de acordo com dados do IBGE e do Pnad), Já a diferença entre salários de negros e de brancos vai demorar um pouco mais: só em 2089 poderá ser resolvida! Ou daqui 72 anos….;
– homens brancos representam 2 em cada 3 dos 10% mais ricos, enquanto que mulheres e negros representam 3 em cada 4 brasileiros desfavorecidos;

Quer saber mais? O estômago aguenta? Lá vai!

Voltando aos tributos… acredite se quiser: o ‘leão’ do Imposto de Renda é generoso com os ricos. Aqueles que ganham 320 salários mínimos (mais de R$ 252 mil), por exemplo, pagam para o fisco o mesmo que quem recebe 5 salários. E sabe por que isso acontece? Porque a alíquota do IR estaciona para quem ganha acima de 40 salários mínimos. Mas tem mais, peraí: quem recebe acima de 80 salários mínimos mensais (mais de R$ 63 mil) tem isenção média de 66% no imposto. Para quem ganha 320 salários, a isenção é maior: 70%. Juro que gostaria de entender a lógica disso…

E sobre lucros de empresas e dividendos de ações? Nadica de nada é descontado!!

E a classe média, tem direito a alguma isenção? Tem!!! Ah… mas é de 17% para quem recebe de R$ 2.364 a R$ 15.760 e de apenas 9% para quem ganha de 1 a 3 mínimos por mês (de R$ 788 a R$ 2.364).

A diretora executiva da Oxfam, durante a transmissão online do lançamento do relatório, lembrou que o Brasil avançou muito contra a desigualdade nos últimos dez anos, por conta de programas sociais – Bolsa Família, entre eles -, mas ressaltou que isso, na verdade, não leva o país a vencer a desigualdade e a miséria. Explicou: não adianta aumentar a inclusão dos mais pobres sem redistribuir o que circula no topo da pirâmide social. E não há interesse em que isso seja feito.

Entre as indicações da executiva para começarmos a trilhar esse caminho foi uma reforma tributária mais justa e fez comparações com países da Europa: “França e Espanha, por exemplo, têm mais impostos do que o Brasil, mas a nossa tributação penaliza os mais pobres e a classe média. Precisamos rever nosso imposto de renda, acabar com os paraísos fiscais e cobrar tributo sobre dividendos”. E isso só poderá ser feito com a participação ativa da sociedade. Todos sabem que pagam muito imposto sobre qualquer produto, mas é preciso pressionar o Governo pela reforma. Do jeito que vamos, me parece uma missão impossível.

Por último, Kátia Maia lembrou da PEC do teto de gastos – popularmente conhecida como PEC do fim do mundo -, chamando-ade uma medida equivocada, que deveria ser revertida já. Afinal, limitar o gasto social só nos leva à paralisação. Já estamos vivendo isso.

Depois de toda a ‘imoralidade’ revelada pelo levantamento da Oxfam, quero saber: onde estão as manifestações contra tanta injustiça? Esta injustiça que se repete diariamente a olhos vistos, sem maquiagem, e que tem sido ainda mais promovida, com grande empenho, pelo governo Temer e seus aliados e pelo Congresso? Este, depois do golpe (no qual todos clamaram por ética e contra a corrupção) rapidamente desmascarado como um ninho de corruptos representado por uma bancada apelidada de BBB: do boi (ruralistas e seu nada pop agronegócio), da bala (que representa a indústria de armamentos) e da Bíblia (evangélicos extremistas) -, que tudo faz para eliminar direitos, a educação, a cultura, para manter e aumentar todas as desigualdades.

Injustiça que se revela também em governos conservadores de estados e cidades pelo Brasil afora, que promovem ações violentas de higienização dos centros urbanos, jogando a pobreza e a miséria pra bem longe ou pra ‘debaixo do tapete’, que não lida com suas questões ambientais e culturais, privilegiando uma elite soberba e cega. Injustiça que está na porta das nossas casas, no elevador, nos corredores dos hospitais, nas salas de aula, na fila do ônibus, no metrô, nas esquinas, toda hora em qualquer lugar.

Não foi à toa que, este ano, o Brasil caiu 19 posições no ranking de desigualdade social da ONU, o que lhe garantiu estar entre os 10 países mais desiguais do mundo. Na América Latina, só fica atrás da Colômbia e de Honduras.

Que país podemos projetar para o futuro diante destes números e desta realidade?

Leia também:
Desigualdade: 1% da população mundial detém maior patrimônio mundial. E o Fórum Econômico Mundial com isso?

 

Foto: Danielle Pereira/Creative Commons/Flickr

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