2018: o ano que mal começou e a mobilização pela economia solidária

Já no início de 2018, me dei conta de que teremos 365 dias fragmentados entre dois acontecimentos: eleição presidencial e Copa do Mundo.

Não me parece que será um ano fácil. Como não o foi 2017, em que muita resistência foi necessária no dia a dia. Em que a má política não nos deu trégua, nos assombrando com a perda de direitos e retrocessos na área social e trabalhista e com revelações, sem precedentes, de processos de corrupção que nos deixaram estupefatos pela ousadia, seletividade da justiça e impunidade.

O meu primeiro post de 2018 é um convite a ficarmos alertas e a resistir. Na economia solidária, o ano passado terminou já com uma possibilidade nesse sentido, que continua aberta: opinar sobre a relevância do Projeto de Lei PLC 137/2017, que dispõe sobre a Política Nacional de Economia Solidária e os empreendimentos econômicos solidários, estabelecendo definições, princípios, diretrizes, objetivos e composição dessa política. Cria, ainda, o Sistema Nacional de Ecosol e qualifica os empreendimentos como sujeitos de direito, visando fomentar essa economia e assegurar o direito ao trabalho associado e cooperativado.

Se você me acompanha, aqui, no pode ter uma sensação de déjavù com este post porque já falei sobre o tema, mais de uma vez, é verdade. Mas a tramitação de um Projeto de Lei segue várias etapas. Assim, abordei o assunto para pedir ajuda para pressionar parlamentares a votarem a matéria na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara Federal. E, agora, volto a pedir a sua participação, desta vez na consulta pública aberta pelo Senado, apoiando este Projeto.

De iniciativa de um grupo de deputados composto por Paulo Teixeira, Eudes Xavier, Padre João, Luiza Erundina, Miriquinho Batista, Paulo Rubem Santiago, Elvino Bohn Gass e Fátima Bezerra, o Projeto de Lei foi elaborado a partir de um processo de ampla mobilização, envolvendo entidades e pessoas que trabalham com economia solidária em todo o país, e trará um marco importante para essa economia, garantindo segurança jurídica a políticas públicas.

A partir de conferências, debates no Fórum Brasileiro de Ecosol e em centrais de cooperativas e audiências públicas em todo o país, ficou clara a necessidade de criação de uma política pública. Ela começou a ser desenhada com a criação da Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), em 2003, órgão que, por muito tempo, na verdade em quase toda a sua existência, foi conduzido por Paul Singer. Publiquei entrevista com ele, aqui no blog.

Levantamento realizado pela Fundação Perseu Abramo, em 2017, mostra que cooperativas e empreendimentos solidários são responsáveis por cerca de 3% do PIB nacional, envolvendo mais de três milhões de pessoas. Apesar disso, quem move essa economia no dia a dia tem muitas dificuldades, seja porque ela não é reconhecida e respaldada por políticas públicas que definam princípios e parâmetros para seu funcionamento, ou pelas dificuldades que isso gera em relação a obtenção de crédito e incentivos governamentais.

O PLC 137/2017, batizado com esse número ao seguir para o Senado, é, na verdade, do ano de 2012, e demorou todo esse tempo para tramitar. E essa tramitação tem acontecido sob o olhar atento e ativo do movimento da economia solidária.

Por essa razão, por um processo que veio se desenvolvendo desde o início dos anos 2000, é importante que a acompanhemos. Neste momento, isso significa participar da consulta pública no Senado.

Boa notícia vinda de Sampa

Trago também uma boa nova, que vem da capital do estado de São Paulo. A Câmara Municipal aprovou, no finalzinho de 2017, o Projeto de Lei 485/2016, que estabelece diretrizes para o Programa Ponto de Economia Solidária, Comércio Justo, Cooperativismo Social e Cultura.

De autoria de Eduardo Suplicy e Juliana Cardoso, consiste no apoio e no desenvolvimento de projetos de geração de renda e empreendimentos econômicos solidários, buscando fortalecer a autonomia econômica e social de pessoas em situação de vulnerabilidade. E deverá ser sancionado pelo prefeito até meados de janeiro.

Hoje, São Paulo conta com dois Pontos de Ecosol em funcionamento: o Benedito (localizado na Praça Benedito Calixto, em Pinheiros, gerido pela Associação Vida em Ação) e o Butantã (localizado na Avenida Corifeu, no Butantã, vinculado à Secretaria Municipal de Saúde). Em funcionamento desde 2016, os dois integram a Rede de Atenção Psicossocial, atendendo usuários dos serviços de saúde mental, da atenção básica e da assistência social, e promovem oportunidades de formação, trabalho e renda em diferentes áreas como alimentação, artesanato e cultura. Essa legislação trará mais segurança jurídica ao funcionamento dos Pontos e permitirá a expansão mais segura do modelo para outras áreas da cidade.

Já recomendei em outro post, e volto a reiterar, uma visita a esses dois Pontos em funcionamento. A programação permanente de eventos, formações e debates, o convite à inclusão, produtos de design muito bonito, como cadernos, roupas, bijuterias, e comida gostosa preparada com muito cuidado pela Comedoria Quirim – no caso do Butantã (já falei dela, aqui). Uma conversa regada a cerveja Guerrilheira (Guerrilheira puro malte) é também uma boa pedida, nos dois Pontos.

A aprovação dessa legislação em São Paulo é uma conquista muito importante também para a Saúde Mental, tendo em vista os retrocessos promovidos pelo Ministério da Saúde em relação à Política Nacional resultante da luta antimanicomial, que completou 30 anos em 2017. Essa Política tem sido reconhecida internacionalmente como modelo, garantindo o atendimento integral no lugar da internação compulsória e a emancipação social no lugar do enclausuramento. Falei sobre isso em meu último post de 2017.

Ao longo do ano, acompanharei as tramitações legislativas relacionadas à economia solidária pelo país e contarei tudo aqui, no blog: conquistas e retrocessos. Em ano eleitoral, é tempo também de ficar de olho nos candidatos aos governos dos estados, às assembleias e à Câmara Federal. De olho em seus programas, na atenção que dão e/ou têm dado às políticas inclusivas para brasileiros e brasileiras.

Foto: Neil Bates/Unsplash

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Mônica Ribeiro

Jornalista e mestre em Antropologia. Atua nas áreas de meio ambiente, investimento social privado, governos locais, políticas públicas, economia solidária e negócios de impacto, linkando projetos e pessoas na comunicação para potencializar modos mais sustentáveis e diversos de estar no mundo.