Temer mente na ONU ao afirmar que ”desmatamento na Amazônia diminuiu” graças ao seu governo

Temer mente na ONU ao afirmar que “desmatamento na Amazônia diminui”, afirmam autores de estudo citado

“O desmatamento é questão que nos preocupa, especialmente na Amazônia. Nessa questão, temos concentrado atenção e recursos. Trago a boa notícia de que os primeiros dados disponíveis para o último ano já indicam diminuição de mais de 20% do desmatamento naquela região. Retomamos o bom caminho e nesse caminho persistiremos”. Foi o que teve coragem de afirmar ontem (19/09), o presidente Michel Temer, em seu discurso de abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, diante de quase 200 líderes internacionais.

Que vergonha!

Rapidamente, os autores do estudo citado por Temer vieram a público desmentir a informação descabida apresentada pelo presidente. Usando de má fé, ele usou dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), divulgados no dia 22 de agosto, que em comunicado de imprensa rebateu: “O papel do SAD é alertar para os focos mensais de desmatamento para demandar e subsidiar uma ação rápida dos órgãos de fiscalização e indicar tendências de queda e crescimento do desmatamento. É um erro grave comparar os dados do SAD (Imazon) com dados do Prodes (governo), sobretudo, porque ambos utilizam metodologias diferentes”, diz Paulo Barreto, pesquisador sênior do Imazon.

É bom deixar claro que houve sim, queda no desmatamento da Amazônia, como revelou o levantamento realizado pelo instituto, mas ele foi provocado por fatores de mercado, principalmente, a queda no preço da arroba do boi, que entre 2015 e 2017, caiu 15%. “Vários estudos científicos comprovam a relação direta entre o preço da carne e o desmatamento. Quando o boi fica mais caro, há mais desmatamento, assim como quando o preço cai, a taxa de destruição da floresta diminui”, explica Barreto.

Diversas organizações e lideranças da área socioambiental criticaram o discurso de Temer nas Nações Unidas, ainda mais agora, quando o governo federal tem sistematicamente tentado reduzir as reservas de proteção da Amazônia para abrí-las para a exploração mineral e a expansão do agronegócio. O presidente chegou a dizer em Nova York que seu governo está “comprometido com o desenvolvimento sustentável”.

“Como todos imaginavam, o presidente Michel Temer tentou passar aos líderes mundiais uma imagem do Brasil sobre meio ambiente e mudanças climáticas que só se sustenta em páginas de discursos. Ele escondeu as altíssimas taxas de desmatamento, os números absurdos de incêndios florestais em todas as regiões do país e a escalada de violência contra povos indígenas e lideranças comunitárias, batendo recordes de assassinatos, que são resultado direto da destruição da agenda socioambiental do país em troca de votos da bancada ruralista. Retrocessos que só podem ser comparados aos promovidos pelo governo de Donald Trump nos Estados Unidos”, lamentou Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima.

“Ao afirmar que o Brasil deve se preocupar em desenvolver uma economia de baixo carbono e com a proteção da cobertura de florestas, o presidente Temer oculta as recentes atividades realizadas por seu governo. Nossas florestas e áreas protegidas nunca foram tão ameaçadas como nos últimos meses, seja por medidas provisórias que propõem a redução de unidades de conservação, seja por decretos que permitem atividades de mineração em plena floresta amazônica”, alertou André Ferretti, gerente na Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, coordenador-geral do Observatório do Clima e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.

“Essas ações atendem ao interesse de uma pequena parcela da sociedade, que se beneficia com a atividade agropecuária e minerária e que detém poder no Congresso. No entanto, o que não se enxerga no governo é que atender a esses pedidos põe em risco justamente o que se diz ser a maior riqueza do Brasil – o agronegócio. São exatamente os produtores rurais que necessitam dos serviços prestados por áreas naturais preservadas. Não se pode ignorar também a questão de segurança da sociedade, diante dos recentes eventos climáticos extremos. A melhor maneira de prevenir e precaver sua ocorrência é por meio de medidas de proteção e restauro de ecossistemas. E a conduta de Temer não parece estar alinhada com seu discurso”, completou Ferreti.

Não bastasse a péssima repercussão mundial sobre a tentativa do governo Temer em extinguir a Reserva Nacional de Cobre e Associadas (Renca), uma área de 47 mil quilômetros quadrados entre o Pará e o Amapá – o equivalente ao tamanho do estado do Espírito Santo, para permitir a exploração de minério na região, como mostramos aqui, e que já foi barrada pela Justiça Federal, agora novamente o Brasil aparece nas manchetes internacionais depois do vergonhoso e mentiroso discurso nas Nações Unidas. Entre os jornais que destacaram a notícia até o momento estão BBC Brasil, NY Daily News e a agência Reuters.

“As políticas públicas do governo Temer são todas contrárias à conservação. O efeito das medidas que ele está tomando agora não será visto imediatamente, mas é como se ele estivesse ‘contratando o desmatamento para o futuro”, alerta Paulo Barreto, do Imazon.

*com informações do WWF-Brasil 

Foto: UN Photo/Cia Park

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Suzana Camargo

Jornalista, já passou por rádio, TV, revista e internet. Foi editora de jornalismo da Rede Globo, em Curitiba, onde trabalhou durante 6 anos. Entre 2007 e 2011, morou na Suíça, de onde colaborou para publicações brasileiras, entre elas, Exame, Claudia, Elle, Superinteressante e Planeta Sustentável. Desde 2008 , escreve sobre temas como mudanças climáticas, energias renováveis e meio ambiente. Depois de dois anos e meio em Londres, vive agora em Washington D.C.