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Supremo mantém anistias a desmatadores no Código Florestal

supremo mantem anistia a desmatadores

*Por Oswaldo Braga de Souza

O mais importante julgamento sobre meio ambiente da história do país chegou ao fim, na tarde da quarta (28/2). O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou constitucional a maior parte dos pontos questionados judicialmente da Lei de Proteção da Vegetação Nativa (12.651/2012), que revogou o Código Florestal de 1965.

De 23 tópicos analisados, o tribunal considerou 18 constitucionais. Em alguns desses casos, estabeleceu interpretações que pouco alteraram o sentido da legislação. Os ministros acataram apenas cinco pontos listados nas quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) apresentadas pelo a Procuradoria-Geral da República e PSOL contra a lei, em 2013. Ou seja, os magistrados corrigiram apenas pontualmente os retrocessos ambientais por ela consolidados.

Foi referendada pela corte a anistia à obrigação de reflorestar, a multas e outras sanções para quem desmatou ilegalmente antes de 22 de julho de 2008. O STF também considerou constitucional a redução das Áreas de Preservação Permanente (APP), fundamentais para a manutenção do abastecimento de água e energia e para prevenir desastres climáticos, como inundações e deslizamentos (saiba mais sobre o novo Código Florestal e veja o placar completo do julgamento).

O caso terminou hoje com uma única manifestação, a do decano da corte, o ministro Celso de Mello. Na semana passada, votaram nove ministros. O julgamento começou em setembro, quando o ministro Luiz Fux leu seu relatório. Em novembro, ele deu seu voto.
“As correções feitas pelo STF não serão suficientes para reverter a retomada do desmatamento decorrente do enfraquecimento da lei”, analisa o sócio fundador do ISA Márcio Santilli. Pesquisadores e organizações ambientalistas argumentam que a mudança da legislação foi um dos fatores responsáveis pela retomada das taxas de devastação da floresta na Amazônia, após 2012, depois de quase 10 anos de quedas sucessivas nos índices.

O ISA fez parte do processo na qualidade de “amicus curiae”, o que permitiu apresentar petições e memoriais aos ministros e fazer uma sustentação oral no plenário do STF, em setembro. A organização defendeu a inconstitucionalidade do novo Código Florestal.

Votação apertada

Apesar do placar desfavorável ao meio ambiente, a votação foi apertada em vários temas importantes. Muitos foram decididos por um voto. Depois da sessão da semana passada, sete tópicos ainda estavam em disputa e foram dirimidos, hoje, pelo voto de Mello (saiba mais).
Na sessão de hoje, acabaram sendo considerados constitucionais, entre outros pontos: a anistia da obrigação de recuperar a Reserva Legal (RL) desmatada ilegalmente antes de 22 de julho de 2008 em pequenos imóveis rurais; a possibilidade de que produtores rurais que desmataram ilegalmente suas APPs antes daquela data possam ter novas autorizações para desmatamento; a possibilidade de redução da RL na Amazônia Legal nos municípios ou Estados ocupados por Terras Indígenas (TIs) e Unidades de Conservação (UCs) em certa extensão do território; a permissão para atividades agrícolas em encostas com mais de 45º e topos de morros.

“A corte mostrou-se dividida. Ficou claro que muitos ministros acabaram chancelando dispositivos da lei não porque não causem danos ambientais, mas pela complexidade técnica dos temas em jogo e pelo respeito à separação de poderes”, analisa o advogado do ISA Maurício Guetta. “Alguns ministros inclusive reconheceram que as escolhas dos congressistas não foram adequadas à proteção ambiental, mas isso não não resultou em declaração de inconstitucionalidade”, completa.

Expectativa

Havia expectativa pelo voto de Celso de Mello, mas ele acabou decepcionando os ambientalistas. Como já fez em outros processos, defendeu o direito ao meio ambiente, repetindo que ele é fundamental, beneficia gerações presentes e futuras e deve prevalecer sobre interesses empresariais e econômicos. Também reconheceu o princípio da proibição de retrocesso em direitos socioambientais.

“A Constituição instituiu entre nós um verdadeiro estado de direito ambiental”, chegou a afirmar. “Nada mais perigoso do que se fazer a Constituição, sem cumpri-la”, continuou. E lembrou que o desmatamento tem assumido “proporções gravíssimas” no país, com consequências como a perda de biodiversidade, o comprometimento de mananciais de água, a desertificação e agravamento do efeito estufa.

Ao final de sua manifestação, no entanto, Mello acabou acompanhando grande parte do relatório do ministro Luiz Fux e as poucas divergências listadas por Dias Toffoli. Os dois ministros rejeitaram boa parte dos argumentos apresentados nas ADIs.
“Apesar do ministro Celso de Mello ter rejeitado grande parte das ADIs, seu voto reconhece o princípio da proibição de retrocessos em matéria socioambiental e serve como referência ao Legislativo e ao Executivo”, analisa Guetta.

“O julgamento respeitou o processo democrático, a posição do Congresso. O Código Florestal foi o assunto mais discutido desde a Constituição de 1988”, avaliou Rodrigo Justus, assessor de Meio Ambiente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Ele elogiou o voto de Celso de Mello.

“Acho que agora podemos partir para a aplicação da lei, que estava praticamente paralisada nos últimos quatro anos. Com essa decisão do Supremo, esperamos que os Estados façam a análise dos Cadastros Ambientais Rurais (CAR), chamem os produtores que têm passivos ambientais e deem as certidões de regularidade para aqueles que completem o processo de regularização”, finaliza.

*Texto publicado originalmente em 28/02/2018 no site do Instituto Socioambiental 

Foto: Eduardo Souza/Creative Commons/Flickr

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