Pesquisadores fazem registro raro de tatus-canastra em reserva ambiental do Mato Grosso do Sul


No Brasil, o tatu-canastra vive na Amazônia, no Pantanal, no Cerrado e na Mata Atlântica. Nos demais biomas, ou é considerado extinto, como nos Pampas, ou não há qualquer registro de sua existência, como na Caatinga.

No Cerrado e no Pantanal, como boa parte dos animais, a espécie tem sofrido com a pressão do agronegócio, com desmatamento e queimadas e, por isso, desde 2010, o Projeto Tatu-Canastra – fruto de parceria entre o IPÊ (Instituto de Pesquisas Ecológicas) e o The Royal Zoological Society of Scotland tem realizado pesquisas científicas na região para protegê-lo.

E foi por conta dessa empreitada que os pesquisadores do projeto registraram – com armadilhas fotográficas – o raro aparecimento do tatu-canastra na Reserva Cisalpina, no Mato Grosso do Sul, onde atuam desde 2014. Que maravilha! O primeiro registro, na verdade, aconteceu em novembro desse ano, mas só agora, em 2017, o trabalho foi concluído e pode ser divulgado.

Até então, o que existiam eram apenas relatos orais sobre sua passagem pela região. A descoberta foi relatada em artigo científico publicado na revista Edentata, periódico de divulgação do Grupo de Especialistas em Tamanduás, Preguiças e Tatus da IUCN/SSC. E, agora, a espécie faz parte do Plano de Manejo para a região, elaborado pela CESP em 2006.

Paisagem

Vale destacar que a Reserva Cisalpina é a maior do leste do estado e integra importante área do Corredor de Biodiversidade tri-nacional do Rio Paraná, garantindo a conservação da fauna local. De acordo com o IPÊ, esta é a maior amostra deste tipo de ecossistema que restou após o enchimento da hidrelétrica Sérgio Motta, em 1995.

A paisagem belíssima resulta de um mosaico com lagoas, córregos e canais interligados ao canal do rio Paraná, áreas abertas inundáveis e manchas florestais naturais. É certo que a área sofreu grande impactos com desmatamento e inundações mas, hoje, é considerada o maior remanescente de floresta protegida, tendo se tornado um grande refúgio para a biodiversidade que vive ao longo daquele rio.

“Esta é a única área, em território brasileiro, desse corredor tri-nacional onde a espécie é agora conhecida”, comenta o biólogo Gabriel Fávero Massocato, que conduziu a pesquisa e faz parte da equipe do projeto. “Essa aparição é importante porque mostra que um novo enchimento da hidrelétrica poderá afetar a reserva e a fauna ali existente, até bichos que ainda não foram registrados na região, como era o caso do tatu-canastra. Por isso, a proteção dessa reserva se mostra ainda mais fundamental para a conservação da espécie, considerada vulnerável na lista vermelha das espécies ameaçadas”, alerta.

3 tatus, 30 tocas e 35 vertebrados

Como resultado das armadilhas fotográficas, os pesquisadores do Projeto Tatu-Canastra contabilizaram três fêmeas na reserva. E também encontraram 30 tocas consideradas fruto das escavações de tatus-canastra. Essas tocas têm uma característica muito interessante a observar: não são usadas apenas pelos seus “engenheiros”, mas por diversas outras espécies, para abrigo e conforto térmico.

“Trinta e cinco espécies de vertebrados foram registradas na Reserva Cisalpina, usando as tocas de tatu-canastra. Isso indica a importância de manter a qualidade do habitat para um grande número de espécies ao longo do Corredor de Biodiversidade tri-nacional do Rio Paraná”, ressalta Arnaud Desbiez, coordenador do projeto.

Outra informação importante que veio com o trabalho em campo dos pesquisadores foi o fato de que uma das fêmeas identificadas chegou a atravessar a rodovia BR-158. “Este ano, registramos cinco tatus-canastra atropelados no Estado. Sabemos que atropelamentos são um grande risco para a fauna do Mato Grosso do Sul. Este é um ponto importante para se pensar na proteção da espécie”, comenta Desbiez.

E são justamente projetos como o do Ipê, em parceria com o zoológico escocês, que podem ajudar a evitar estas mortes, como enfatiza Desbiez: “Precisamos identificar onde estão esses tatus, conhecer seus ambientes de ocorrência, especialmente em unidades de conservação. Isso é fundamental para monitorar a espécie e avaliar a viabilidade das populações a longo prazo, assim como conduzir programas de conservação”.

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Fotos: Divulgação

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Mônica Nunes

Jornalista com experiência em revistas e internet, escreveu sobre moda, luxo, saúde, educação financeira e sustentabilidade. Trabalhou durante 14 anos na Editora Abril. Foi editora na revista Claudia, no site feminino Paralela, e colaborou com Você S.A. e Capricho. Por oito anos, dirigiu o premiado site Planeta Sustentável, da mesma editora, considerado pela United Nations Foundation como o maior portal no tema. Integrou a Rede de Mulheres Líderes em Sustentabilidade e, em 2015, participou da conferência TEDxSãoPaulo.