Pyulaga, a lagoa dos pescadores

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Cheguei apressado na aldeia, não podia perder os preparativos para a pescaria dos Waujá. De todas as pescarias no Alto Xingu, esta é a mais famosa. Não por render grandes peixes, mas, sim, pela alegria com que é preparada.

Os rituais começam logo ao anoitecer e as fogueiras, vão se acendendo uma a uma. Os homens chegam, montam suas redes para se deitar ou, simplesmente, se acomodam ao redor do fogo e começam a contar histórias, promover brincadeiras e dar muitas risadas.

Os mais velhos entoam cantos que só são ouvidos nestes momentos, pois evocam as histórias das pescarias ancestrais. Cantam o canto de cada peixe que há na lagoa e pedem, assim, permissão para a pesca. Mais e mais homens chegam e logo todos estão contando anedotas e as brincadeiras com o fogo começam.

Os mais experientes pegam a palha do sapé e fazem tochas que logo são acesas nas fogueiras. Vão passando o fogo ao redor de todos aqueles que irão pescar. O fogo tem o poder de evitar que os peixes sintam o cheiro dos pescadores. O cheiro dos namoros nos dias que antecedem a pesca. Se o peixe sentir o cheiro do namoro pode machucar o pescador. Piranha, Cachorra, Arraia e Mandi são peixes que podem machucar um pescador desatento.

Logo amanhece e todos já estão pintados de preto carvão e a pescaria vai ter inicio.

Jamais imaginei uma rede de 500 metros fechando a lagoa em um imenso cordão. A seca este ano deixou os rios e lagos do Xingu muito mais baixos que o tradicional, mas foi isto que permitiu que eu entrasse no lago a pé junto com os pescadores. Como iria enfrentar os peixes, eu também passei pelo ritual do fogo e do carvão.

O peixe pescado neste dia alimentou a festa do Kuarup na aldeia Pyulaga. Este foi, sem sombra de dúvida, um dos maiores Kuarup que já vi e retratei em minhas viagens pelo Xingu.

Agora, vou deixar vocês só com o ensaio da pesca. Em breve, mostro o ensaio do Kuarup. Agora, estou de volta ao Xingu e, na volta, terei novas imagens e muitas histórias para contar.

Um abraço da Tribo!

2-pyulaga-homens-rezamp-e-fumam-para-espantar-os-males-foto-renato-soaresÀs margens do lago Pyulaga, com as caras pintadas de carvão, os índios Waujá (acima e abaixo) logo vão lutar com os peixes  3-pyulaga-a-pintura-de-carvao-foto-renato-soares

 

4-pyulaga-a-roda-de-fogo-foto-renato-soaresA roda de fogo para purificar e limpar do “cheiro do namoro”

5-pyulaga-renato-na-fogueira-foto-luciola-zvarickTambém entrei na roda do fogo

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Parecendo uma imensa sucuriju, os homens estivam a rede nas águas da lagoa Pyulaga
para fazer um grande cerco para prender os peixes

9-pyulaga-o-grande-cerco-foto-renato-soaresOs homens puxam a rede cercando toda a lagoa até chegarem a uma praia, terminando o cerco 

1a-pyulaga-puca-para-pescaria-foto-renato-soaresNo contra-luz, o menino se projeta dentro do pulsar. O índio e o peixe!

10-pyulaga-os-peixes-cercados-logo-vao-para-o-giral-foto-renato-soaresAs águas crepitam às margens da praia. Os peixes acuados não têm para onde fugir.
Logo todos vão entrar para a luta final com seus pulsares (redes para pesca) e lanças

11-pyulaga-tapioa-e-o-tucunare-foto-renato-soaresEm um amanhecer meu amigo Sapeca Waurá pegou este pequeno Tucunaré.
Ele estava com a cara pintada de preto carvão, pois foi ali para a lagoa brigar com os peixes.
Nesta luta saiu vencedor com seu prêmio nas mãos.

12-pyulaga-peixes-peixes-e-mais-peixes-foto-renato-soaresPeixe, muito peixe, tudo peixe!

13-pyulaga-peixes-no-giral-foto-renato-soaresGrande variedade de eixes no giral

6-pyulaga-cacique-fumando-na-oca-foto-renato-soaresO cacique Awakukumã trata o peixe que vai sendo moqueado lentamente no giral
dentro de sua casa, ainda em construção

14-pyulaga-entardecer-na-lagoa-foto-renato-soaresLogo que cheguei à beira da lagoa Pyulaga, me deparei com esta cena que me levou a uma viagem noite adentro

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Renato Soares

Fotógrafo e documentarista especializado no registro de povos indígenas, bem como da arte, cultura e biodiversidade do país. Mineiro, desde 1986 realiza viagens para retratar formas de expressão cultural dos grupos étnicos brasileiros. Colaborador do blog Por Trás das Câmeras, Renato descreve o que chama de "Diário de Campo". É autor ainda do blog Ameríndios do Brasil, mesmo nome do seu projeto de fotografia com os índios