Presidente da Funai deixa cargo e diz que governo quer acabar com política indigenista

Por Victor Pires*

O Diário Oficial da União publicou em 5/5, o afastamento de Antônio Fernandes Toninho Costa da presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai). Ele ocupava o cargo desde janeiro deste ano e sai num momento de crise no órgão indigenista. Recentes cortes de orçamento e de pessoal tornam a já fragilizada execução de políticas públicas para os povos indígenas ainda mais complicada.

Segundo Costa, sua exoneração foi motivada por ele não aceitar nomeações políticas pedidas pelo líder do governo no Congresso, o deputado André Moura (PSC-SE), para cargos técnicos da instituição.

Costa convocou uma coletiva de imprensa, no mesmo dia da exoneração, na frente da sede da Funai, em Brasília, para falar sobre a demissão. Ele fez duras críticas ao governo de Michel Temer e ao ministro da Justiça, Osmar Serraglio. Disse que o governo quer “não só acabar [com a Funai], mas também com as políticas públicas. As políticas de demarcação de terras, as políticas de segmentos. Isso é muito grave”.

Ministro do agronegócio

Em relação ao ruralista Osmar Serraglio, Costa disse que ele não está sendo ministro da Justiça, mas ministro da causa que defende no Parlamento, a do agronegócio. “Os povos indígenas precisam de um ministro que faça justiça, e não um ministro que venha pender para um lado”, afirmou. Serraglio foi relator, na Câmara dos Deputados, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/00. Esta medida pretende passar para o Congresso Nacional, dominado pela bancada ruralista, a palavra final sobre a demarcação de Terras Indígenas (TIs), além de permitir a revisão pelos parlamentares de processos demarcatórios já concluídos. Na prática, significaria a paralisação das demarcações no Brasil e o acirramento de conflitos no campo.

Serraglio divulgou nota sobre a demissão de Antônio Costa. Nela, o ministro escreve que “várias questões não vinham sendo tratadas com a urgência e efetividade que os assuntos da área requeriam, o que corrobora a necessidade de uma melhor gestão”. No texto, o exemplo que Serraglio utiliza para falar desta suposta falta de “urgência” coloca os indígenas como um entrave e demonstra claramente que o objetivo do governo é passar por cima dos direitos indígenas. Leia a nota.

“A atuação do governo Temer em relação à Funai e à política indigenista é criminosa: confronta a Constituição e estimula a violência contra os índios”, considera Márcio Santilli, sócio fundador do ISA. Em 30/4, a violência contra os povos indígenas no Brasil ganhou contornos trágicos. Ataque de jagunços, a mando de fazendeiros, deixou 13 indígenas Gamela feridos, no município de Viana (MA). Na avaliação de Costa, com a política e as posições do atual ministro da Justiça, podem aumentar casos como esse.

Uma funcionária da Funai informou que, com a saída de Costa, quem assume interinamente a presidência do órgão indigenista é o general do Exército Franklimberg Ribeiro de Freitas. Ele é o atual diretor de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável na Funai. Teoricamente, quem deveria assumir é Janice Queiroz de Oliveira, diretora de Administração e Gestão, mas ela encontra-se afastada por questões de saúde.

Cortes na Funai

A instituição passa por um momento de muitas dificuldades. Na semana anterior à exoneração, enquanto indígenas de todo o país – entre eles, 1,5 mil líderes – estavam em Brasília para participar do Acampamento Terra Livre (a foto de destaque deste post mostra uma das manifestações realizadas por eles), o órgão sofreu corte de 44% em seu orçamento para o ano de 2017.

O dinheiro para gastos administrativos, como o pagamento da conta de luz e aluguel, antes de R$ 107,9 milhões, passou para R$ 60,7 milhões (Saiba mais). Em março, o governo Temer extinguiu 87 cargos comissionados da Funai, quase 12% do total.

*Este texto foi originalmente publicado no site do Instituto Socioambiental

Foto: Renato Soares (destaque) e Mario Vilela (Funai)

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Instituto Socioambiental

O ISA é uma organização da sociedade civil brasileira (OSCIP desde 2001), fundada nos anos 90 com o intuito de oferecer soluções para questões sociais e ambientais em prol dos bens e direitos coletivos e difusos relativos ao meio ambiente, patrimônio cultural, aos direitos humanos e aos povos originais. Recentemente, lançou a campanha “Menos Preconceito, Mais Índio” e o primeiro documentário em realidade virtual numa aldeia indígena: “Fogo na Floresta”.