Personalidade animal

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É inevitável. Quando observo um animal por muito tempo, quase sempre acabo por compará-lo com tipos humanos que passaram pela minha vida. É impossível não notar semelhanças em seus comportamentos, nas feições e nas atividades do dia a dia de uma espécie na natureza.

Quando estou fotografando ariranhas por exemplo, sempre me vem à cabeça a hora do recreio na escola. Aquela bagunça generalizada, correria pelos corredores e, claro, o lanche. As ariranhas nadam, brincam, sobem nos tocos e, por fim, sempre têm um peixinho ali para compartilhar.

A onça me lembra aquele cara grandão, mais turrão. Quase sempre sentado pelos cantos e que, de vez em quando, chega para um papo, mas sempre muito reservado.

Mas o bicho que me inspirou a escrever este post foi a arara-azul que está na foto acima. Passei dois anos documentando a espécie para o livro Arara-azul Carajás (Nitro, 2016) e, a cada dia, percebia mais uma faceta da personalidade desse, que é o maior psitacídeo do mundo.

No início do contato, fiquei com a impressão de que a arara-azul é arredia. No Pantanal, sempre consegui me aproximar bastante dos bandos. Já no Mosaico de Unidades de Conservação de Carajás, com a qual trabalhei por um tempo, elas sempre voavam e nos deixavam pra trás, mesmo com a equipe bem distante.

Mas, com o tempo, a relação foi se aprofundando. Fomos nos conhecendo e nos respeitando e, logo, identificamos as araras e elas pareciam também saber quem estava ali.

Me lembro o dia exato em que fiz essa foto. Estava do outro lado do rio Itacaiúnas – na serra da Seringa no município de Água Azul do Norte, no Pará – e, da areia, observava o ninho na imensa estopeira. O casal tinha entrado na cavidade e eu esperava que os dois saíssem para fazer uma foto de ambos voando com as asas abertas. Bem, pelo menos essa era minha intenção.

Com a lente longa montada em um tripé, fiz o enquadramento que desejava e fiquei aguardando a saída das duas de dentro do ninho. Em vez de uma reação espevitada e de fuga, recebi o que considerei um sorriso de bom dia. Uma delas só colocou a carinha para fora do ninho e parecia me dizer: “Oi João!”.

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João Marcos Rosa

Formado em jornalismo, o fotógrafo João Marcos Rosa se especializou em registrar temas ligados à vida selvagem e à conservação, trabalhos que o levaram a correr o mundo atrás de boas e fascinantes histórias. Colabora com as revistas National Geographic Brasil, BBC Wildlife, GEO e Terra Mater. Autor dos livros “Harpia” e “Fauna de Carajás”, vive em Nova Lima (MG) e é um dos sócios da agência Nitro Imagens.