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PANCS: novidades no seu prato podem ser banquetes ancestrais

PANCS

A primeira ideia para escrever este texto era fazer um breve resumo sobre plantas  alimentares não convencionais, conhecidas simplesmente como PANCS. Mas me parece inevitável que algumas vezes, no trabalho, nos encontremos em um grande dilema. Escrever sobre este assunto me colocou numa difícil posição: em primeiro lugar, porque toda a informação que consegui reunir não está embasada na minha experiência pessoal.

Eu nunca tive a felicidade de comer caruru, prato típico da região Nordeste, feito com uma das variedades da planta invasora que tem o mesmo nome ou ainda, ora-pro-nóbis (na imagem que abre este post), prato da região Sul, feito com uma cactácea que cresce muito bem por lá. Uma ótima cerca-viva por ter espinhos e que ainda por cima, floresce lindamente, além de ser útil, é altamente nutritiva! Ela é chamada popularmente de “carne dos pobres” pelo alto teor de proteína que fornece.

Pessoalmente, conheço poucos deste pratos, e sei menos ainda como prepará-los. Na verdade, a região Sudeste, onde nasci, é uma das mais beneficiadas pela mistura de culturas, devido aos grandes movimentos migratórios que ali ocorreram  no final do século 19. As feiras por lá são as mais intrigantes. Há sempre alguma folha nova ou um fruto novo. Pode-se encontrar vinagreira, serralha, bertalha, almeirão, catalonia, beldroega e escarola. Mas grande parte das plantas aqui citadas, com exceção destas últimas, nunca tive oportunidade de conhecer, daí o meu dilema de escrever, pois mesmo sabendo bastante sobre plantas, não me sinto confiante em recomendar aos meus leitores que saiam por aí comendo plantas não convencionais (PANCS), sem que alguém com experiência no assunto possa ajudar.

Então, estudei o assunto durante as últimas quatro semanas. Muitas das plantas possuem variedades similares entre si, que podem ser tóxicas, como é o caso da mandioca brava, do caruru bravo e da taioba brava, por isso, a identificação tem que ser feita por um especialista!

No entanto recomendo sim, que comecemos uma busca pessoal, cada qual em sua região, perguntando aos mais velhos e aos agricultores mais experientes, detalhes para aprender  mais e saber quais são exatamente estas plantas e o que às diferencia de espécies similares.

Vale a pena investigar, como devem ser colhidas e preparadas para comer, e sobretudo, saber seus valores nutricionais e se há possível toxicidade. Isto é fundamental porque, ao cortar as folhas, substâncias ácidas ou corrosivas, comuns nas verduras e frutas podem manchar superfícies ou  até mesmo a pele, e podem não ser recomendadas para crianças, idosos ou lactantes.

Conhecer profundamente o assunto e ter certeza das coisas requer um estudo aprofundado, sobretudo uma vivência , mas como filha de imigrantes, essas iguarias nunca chegaram à minha mesa, no entanto, não vejo a hora de experimentar uma nova verdura! Lembro-me bem da primeira vez em que comi rúcula. E hoje em dia, ela faz parte da minha dieta. Estar aberto a novos alimentos faz parte do enriquecimento cultural de uma sociedade, afinal,   muitos deles foram trazidos pelos colonizadores ou cultivados por milhares de anos pelos povos indígenas e este conhecimento está ameaçado de se perder pela nossa mera ignorância ou por pura falta de interesse.

Existe também uma grande dificuldade  de condensar as informações dadas pelos livros devido à sua relevância, como por exemplo, a descrição botânica e os detalhes morfológicos (forma das plantas) para sua correta identificação. Nem sempre as fotos dos livros e sites são suficientes para assegurar a identificação correta e pouca coisa pode substituir recomendações pessoais, além é claro, da dificuldade de descobrir onde encontrá-las para propagar uma muda.

Mas ao que parece, talvez este seja um bom momento para deixar claro que ninguém sabe tudo, muito menos eu, e essa dúvida, e muitas outras, fazem parte de um acervo de questionamentos colecionados também por outros profissionais.

Recomendo sim, no caso das PANCS, compilar experiências e dividir informações, então resolvi escrever mesmo assim, até mesmo para convidá-los a dividir comigo suas experiências pessoais: se já comeram, em que região, quem lhe recomendou, se foi algum ancião numa vila remota, ou fazendeiro, ou amigos de outra região e até mesmo o amigo feirante.

Então, para deixar bem claro, vamos distinguir os conceitos: hortaliça convencional é toda aquela encontrada no comércio atacadista, disponível em vários centros de distribuição, cujos valores nutricionais e composição química já estejam estudados e analisados e cujo uso seja difundido e conhecido pela maioria da população.

Já as plantas alimentícias não convencionais, ou PANCS,  são as hortaliças com distribuição limitada, restritas a determinadas localidades e regiões exercendo influência na alimentação e na cultura de populações tradicionais. São espécies que não estão organizadas enquanto cadeia produtiva, propriamente dita, diferentes das hortaliças convencionais (batata, tomate cebola, repolho, alface, etc), não despertando o interesse comercial por parte de empresas de sementes, fertilizantes ou agroquímicos”. Esta definição tirei da página 10, do Manual de Hortaliças não  Convencionais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Missão Mapa, 2013.

Enfim, são plenas as justificativas para mencioná-las: sua riqueza nutricional, importância cultural na manutenção da sabedoria popular, vinculados às sociedades tradicionais (indígenas, quilombolas, afrodescendentes, imigrantes) e a própria diversidade de alimentos, sobretudo, aqueles com resistência  à pragas de cultivo, servindo como excelente alternativa para o consumidor que quer evitar os  alimentos contaminados com agrotóxicos, pesticidas e transgênicos.

As PANCS trazem novas oportunidades para cultivo e comércio, assim como ocorreu com tantos alimentos funcionais nos últimos anos, que foram ganhando os mercados alternativos.

Na verdade, elas são superplantas, algumas ainda mantém seu caráter silvestre, muitas vezes nativas, como é o caso da araruta, cujo uso veio das tradições indígenas,  ou o caruru, consumido e difundido pelos pássaros e mamíferos, que brota espontaneamente em qualquer terreno e cresce mais rápido do que qualquer hortaliça.

Um fato que me impressionou muito durante a leitura do livro que mencionei mais acima foi saber que estamos perdendo nossa diversidade alimentar. A prática da agricultura industrial foi  aos pouco eliminando estas culturas, mais adaptáveis com a natureza diversa do nosso país. Acredito que devamos diversificar para garantir um futuro melhor.

Se você ficou curioso sobre PANCS, abaixo listo alguns exemplos. Que tal prová-las na sua próxima refeição?

Araruta (Marantha arundinacea L.)
Azedinha (Rumex acetosa L.)
Beldroega (Portulaca Oleracea L.)
Bertralha (Basella Alba L.)
Cará do ar (Dioscórea bulbifera)
Caruru (Amaranthus  cruentus, Amaranthus vriridis L.)
Jambu (Spilanthes oleracea)
Jurubeba (Solanum asperolanatum)
Major gomes (Talinum paniculaatum Gaert.)
Ora-pro-nóbis (Pereskia aculeata Mill.) (Pereskia grandifolia Haw.)
Peixinho (Stachys lanata)
Serralha (Sonchus oleraceus L.)
Taioba (Xanthosoma sagittifolium Shott.)
Vinagreira (Hibiscus  sabdariffa L.)

Leia também:
Sete árvores PANCS

Foto: Andréia Bohner/Creative Commons/Flickr

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