ONU alerta: compromissos para reduzir emissões atendem apenas 1/3 da meta até 2030. E agora?

“Um ano depois do Acordo de Paris ter entrado em vigor, ainda nos encontramos numa situação em que não estamos fazendo o suficiente para salvar centenas de milhões de pessoas de um futuro miserável“, exclamou Erik Solheim, chefe do PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, ontem, em Genebra, na Suíça, na Assembleia do Meio Ambiente da ONU.  “Isto é inaceitável! Se investirmos nas tecnologias certas, garantindo que o setor privado esteja envolvido, ainda podemos cumprir a promessa que fizemos para proteger o futuro dos nossos filhos. Mas temos que entrar no caso agora”.

Edgard E. Gutiérrez-Espeleta, Ministro do Meio Ambiente e Energia da Costa Rica, e presidente da Assembleia, também deu seu recado: “O Acordo de Paris impulsionou a ação climática, mas o impulso é claramente vacilante. Por isso, nós enfrentamos uma escolha séria: aumentar nossa ambição ou sofrer as consequências”.

Os dois pronunciamentos foram feitos durante lançamento da oitava edição do relatório Emissions Gap Report, que destaca a lacuna das emissões e conclui que os compromissos dos países signatários do Acordo estão muito aquém do necessário. Resultam em apenas um terço da redução das emissões exigida até 2030 para atender as metas climáticas. Com um detalhe: a ação do setor privado e subnacional não está aumentando de forma a ajudar a preencher essa lacuna.

Só pra lembrar, o Acordo de Paris limita o aquecimento global a menos de 2oC, mas compromissos mais ambiciosos poderiam levar o mundo até 1,5oC. Se não cumprirmos nem a primeira meta – o que é bem provável diante do quadro atual de emissões -, o resultado será o agravamento dos impactos climáticos que já estão acontecendo, com graves riscos à saúde humana e às economias em todo o mundo.

Do jeito que estamos caminhando, é muito provável que o aumento da temperatura chegue a, pelo menos, 3oC em 2100. Parece distante, mas o aumento não se dará, obviamente, de uma hora para a outra. O cenário que se desenhará até lá será de catástrofes sucessivas, o que significa que os governos precisam revisar seus compromissos de maneira ainda mais incisiva. Isso sem contar que os Estados Unidos ainda podem abandonar oficialmente o Acordo, e a situação se tornaria ainda mais grave para o mundo.

A conclusão do relatório da ONU é de que as promessas de Paris podem levar as emissões de 2030 acima do nível desejável, que poderia nos manter no caminho do menor custo para atingir o objetivo de 2oC. Chegaríamos a registrar entre 11 a 13,5 gigatoneladas de dióxido de carbono equivalente (GtCO2e – que incluem outros gases além do CO2). Para se ter ideia do que isso representa, basta saber que uma gigatonelada é aproximadamente equivalente a um ano das emissões do setor de transportes na União Europeia (incluindo a aviação). Ou seja, a diferença de emissões (para se chegar a 1,5oC) é de 16 a 19 GtCO2e, superior às estimativas anteriores, à medida que novos estudos se tornaram disponíveis.

Mas, ao mesmo tempo em que o relatório da ONU chama a atenção para este cenário tão ameaçador, também apresenta formas práticas de reduzir emissões por meio da mitigação. A boa notícia é que ela pode ser feita com base em ações já adotadas nos setores da agricultura, edificações, energia, silvicultura, indústria e transportes. A palavra chave é ação!

E é sempre bom lembrar que as emissões de CO2 permaneceram estáveis ​​a partir de 2014, em parte, por causa das energias renováveis, especialmente impulsionada em países como China e Índia. Essa conquista elevou as esperanças de que as emissões teriam atingido o pico e que devem continuar estáveis ou declinar até 2020. No entanto, o que o relatório adverte é que outros gases de efeito estufa, como o metano, continuam em trajetória ascendente, o que pode ser agravado com o ainda incentivado crescimento econômico global.

‘Investir em tecnologia’, quase um mantra

Para que os objetivos do Acordo de Paris sejam cumpridos, não só governos, mas as empresas e as cidades precisam se engajar e buscar urgentemente ações que possam cortar as emissões de forma profunda e – importante! – rápida. E os investimentos em tecnologia, nos setores citados acima, podem economizar até 36 GTCO2e por ano, até 2030. Isso com investimento de menos de US$ 100 por tonelada de CO2 evitado, ou até menos

Grande parte desse potencial, em todos os segmentos, pode vir do investimento em energia solar e eólica, em aparelhos e veículos mais eficientes, no reflorestamento e no fim do desmatamento (nestas duas ações, estamos na contramão como publicamos aqui).  Se nos concentrarmos apenas nas ações recomentadas para estas áreas, poderemos chegar a cortar até 22 GtCO2e em 2030. Segundo o relatório, só essas reduções já nos colocariam no caminho para atingir a meta de 2oC e até desenhariam oportunidades para alcançarmos o mais desejado: manter a temperatura abaixo de 1.5oC.

Nesta jornada, empresas e cidades têm papel crucial e podem reduzir a lacuna das emissões de 2030 em algumas GtCO2e.

As 100 maiores empresas mundiais emissoras, por exemplo, representam cerca de 1/4 das emissões globais de gases do efeito estufa!! E daí pode vir a chance de aumentarmos nossa ambição, como ressaltou o Ministro do Meio Ambiente e Energia da Costa Rica.

A Emenda Kigali ao Protocolo de Montreal pode ajudar muito nesse processo já que visa eliminar o uso e a produção de hidrofluorcarbonos – produtos químicos usados ​​principalmente em aparelhos de ar condicionado, refrigeração e isolamento de espuma. Mesmo que seja implementada com sucesso, ela chega atrasada para ajudar a alterar a lacuna de 2030, no entanto, continua sendo importante já que contribui de formar real para os objetivos de prazo mais longo.

Em meados do século XXI, as reduções dos poluentes climáticos de curta duração – como o carbono preto e o metano – poderiam ajudar a reduzir os impactos da absorção cumulativa de calor e a garantir uma trajetória de temperatura constante e mais baixa em direção aos objetivos de Paris de longo prazo.

Soma-se a isso a conduta do G20, que está coletivamente firme nos compromissos assumidos na conferência de Cancun, para 2020, embora isso não represente um ponto de partida ambicioso para atingir os objetivos de Paris. Mas as nações do G20 podem mais: ainda podem realizar ações que levem a reduções de curto prazo e abrir o caminho para mais mudanças na década seguinte. Quer ver?

Não apostar em novas usinas a carvão e eliminar rapidamente as existentes, o que garantiria a boa gestão de questões como emprego, interesses dos investidores e estabilidade da rede. É inacreditável, mas ainda existem cerca de 6.683 usinas a carvão em funcionamento no mundo, com capacidade combinada de 1.964 GW!! Essas usinas precisam, urgentemente, sofrer adaptações à Captura e Armazenamento de Carbono ou ser desativadas. Do contrário, emitirão cerca de 190 Gt de CO2.

Mas as más notícias não param por aí! No início deste ano, 2017, mais de 800 GW adicionais de capacidade de carvão foram sinalizadas com a construção de novas plantas, que podem emitir 150 Gt de CO2 e representam cerca de 85% do todo o setor no mundo. Elas estão na China, Índia, Turquia, Indonésia, Vietnã, Japão, Egito, Bangladesh, Paquistão e República da Coreia.

O relatório da ONU também indica a remoção de CO2 da atmosfera – por meio do reflorestamento, da arborização, do manejo florestal, da restauração de terras degradadas e do aumento do carbono do solo – como outra opção para agir.

O novo relatório da 1 Gigaton Coalition (apoiada pelo PNUMA e pelo governo norueguês), lançado no mesmo dia do relatório da ONU, vem se somar a esta jornada. Ele apresenta projetos de energia renovável e eficiência energética incentivados por seus membros nos países em desenvolvimento, que podem reduzir 1,4 GtCO2e até 2020. Com um detalhe: isso só poderá acontecer se a comunidade internacional atender a promessa de mobilizar US$ 100 bilhões por ano para ajudar os países em desenvolvimento a se adaptarem às mudanças climáticas e reduzirem suas emissões. Ou seja, se cumprirem o compromisso do Fundo Verde Climático, criado em 2015.

“Projetos e políticas de energias renováveis e eficiência energética apoiados por parceiros são vitais para a descarbonização global, pois fornecem recursos chave e criam ambientes propícios em regiões críticas”, disse Borge Brende, Ministro das Relações Exteriores da Noruega. “Como a energia renovável e a eficiência energética trazem muitos outros benefícios – incluindo melhor saúde humana e empregos – exorto a comunidade internacional a cumprir o financiamento prometido para apoiar os países em desenvolvimento em suas ações climáticas”.

Fotos: Agência Fapesp e Divulgação

Um comentário em “ONU alerta: compromissos para reduzir emissões atendem apenas 1/3 da meta até 2030. E agora?

  • 31 de outubro de 2017 em 3:46 PM
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    OS Governantes ainda debatem o clima do planeta. O planeta esta morrendo. Olha quanto esta
    gente debatem esta ação! Já faz muito tempo, e até agora, continua o debate sem solução.
    É temos que fazer a nossa parte com urgência.
    Uma das formas de reduzir este impacto é reflorestando, um grande reflorestamento traz um
    beneficio incalculavel para o planeta. Na redução do efeito estufa. É um pequeno gesto que uma
    pessoa pode fazer.
    Quem não pode plantar uma arvore. É só doar CR$10,00(dez reais) para o projeto AMIGOS DA
    FLORESTA, e receber um CERTIFICADO, como contribuinte com o meio ambiente.
    Vamos implantar 4.000.000 de mudas em 03 anos, Já temos os locais para implantação do
    reflorestamento. LINK http://PROJETOAMIGOSDAFLORESTA.COM.BR/

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Mônica Nunes

Jornalista com experiência em revistas e internet, escreveu sobre moda, luxo, saúde, educação financeira e sustentabilidade. Trabalhou durante 14 anos na Editora Abril. Foi editora na revista Claudia, no site feminino Paralela, e colaborou com Você S.A. e Capricho. Por oito anos, dirigiu o premiado site Planeta Sustentável, da mesma editora, considerado pela United Nations Foundation como o maior portal no tema. Integrou a Rede de Mulheres Líderes em Sustentabilidade e, em 2015, participou da conferência TEDxSãoPaulo.