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O que é essa tal biodiversidade?


Sabe aquelas palavras sobre meio ambiente que ouvimos repetidamente quase todos os dias? Aquelas que, de tempos em tempos, a televisão, as redes sociais e os jornais usam para destacar sua importância para a sobrevivência da humanidade? A verdade é que nem sempre temos tempo para compreender com profundidade os conceitos que estão por trás das palavras ecológicas da moda.

Mais importante do que conhecer as palavras é entender os conceitos por trás delas e, mais ainda, como estes conceitos se encaixam perfeitamente como peças de um quebra-cabeça na manutenção da nossa vida em sociedade.

Vamos falar, então, de biodiversidade, palavra que surgiu em 1985, quando o biólogo Walter G. Rosen buscava um nome legal para um encontro de cientistas especializados em diversidade biológica. Batizado de National Forum on BioDiversity (Fórum Nacional sobre BioDiversidade), o evento coordenado por Rosen ocorreu na capital norte-americana, Washington, em 1986.

Diversidade biológica, como você possivelmente imagina, é o significado de biodiversidade, a incrível diversidade de organismos vivos de todos os tipos, incluindo terrestres, aquáticos, marinhos e, toda a diversidade de relações ecológicas complexas das quais eles fazem parte, sejam elas entre as mesmas espécies, espécies diferentes ou, mesmo, com os ecossistemas. 

Um dos maiores entusiastas dos estudos sobre o tema foi  o biólogo Thomas Lovejoy, que resgatou o termo diversidade biológica, o incluindo no prefácio do livro Conservation Biology: An Evolutionary-Ecological Perspective. Em seu texto, Lovejoy, já na década de 1980, alertava para a intensidade do impacto das ações humanas sobre os sistemas biológicos do planeta, e suas consequências na redução da diversidade biológica.

Claro que, na verdade, muito antes do conceito de biodiversidade ser cunhado, todos nós já o conhecíamos como aponta o aclamado pesquisador Ernst Mayr, em seu livro O desenvolvimento do pensamento biológico: diversidade, evolução e herança. Para ele, a percepção da variedade de formas de vida é tão antiga como a própria autoconsciência da espécie humana.

Como resultado do Fórum Nacional sobre BioDiversidade, coordenado por Rosen em 1988, o renomado biólogo Edward O. Wilson organizou a primeira publicação sobre o tema – Biodiversity (Biodiversidade) -, composta de artigos científicos de nada menos que 60 das maiores autoridades internacionais no assunto, presentes no fórum.

A obra incluiu 14 capítulos:
1. A situação da diversidade biológica;
2. Desafios à preservação da biodiversidade;
3. A dependência humana da diversidade biológica;
4. Diversidade em risco:
5. Florestas tropicais;
6. Diversidade em risco: A perspectiva global;
7. O valor da biodiversidade;
8. Como a biodiversidade é monitorada e protegida?;
9. Ciência e tecnologia: Como podem ajudar?;
10. Ecologia de restauração: Podemos recuperar o tempo perdido?;
11. Alternativas à destruição;
12. Políticas para proteger a diversidade;
13. Problemas atuais e perspectivas futuras; e
14. Maneiras de ver a biodiversidade.

Após anos de debate e a crescente preocupação com a conservação da biodiversidade, na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Rio92), no Rio de Janeiro, em 1992, foi finalmente lançada a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Que trouxe uma definição ampla e funcional de diversidade biológica ou biodiversidade, abrangendo a diversidade de espécies, a diversidade genética e a diversidade de ecossistemas.

Mas, afinal, por que a conservação da biodiversidade é tão importante?

Podemos comparar as milhares de espécies em um ecossistema, assim como as milhares de interações entre elas e o ambiente, as minúsculas peças de um smartphone, todas estão perfeitamente encaixadas em locais específicos, conectadas entre si, desempenhando funções singulares, mas, em geral, interdependentes.

Em equilíbrio, todo este quebra-cabeça de peças possibilita ao celular funcionar perfeitamente, disponibilizando uma série de recursos aos usuários como, por exemplo, a leitura deste texto. Se apenas uma destas peças apresentar mal funcionamento, o aparelho deixa de funcionar e todos os serviços disponibilizados por ele deixam de existir.

O mesmo ocorre com a biodiversidade, e justamente com a diversidade biológica e o papel de cada uma das espécies de um ecossistema, desempenhando uma função especifica. Isso é muito bem representado pelo Pica-pau-anão-barrado (Picumnus cirratus) que, no vídeo abaixo, inspeciona e captura larvas e insetos, livrando a árvore de possíveis parasitas e predadores que garantem a manutenção do equilíbrio do ambiente, assim como todos os serviços disponibilizados por ele que são essenciais ao nosso dia a dia.

Outro exemplo: a perda de biodiversidade na Amazônia, o desaparecimento de espécies-chave como aquelas que atuam como polinizadores ou dispersores de sementes, pode afetar em um futuro próximo a disponibilidade de água no Sudeste. Segundo o relatório sobre o Futuro Climático da Amazônia, publicado pelo pesquisador Antônio Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), após extensa revisão em mais de 200 artigos científicos sobre a Amazônia e sua relação com o clima e as chuvas no Brasil, concluiu que o desmatamento dessa região influencia a falta de água sentida nas regiões mais populosas do país.

Complementarmente, o artigo Funções eco-hidrológicas das florestas nativas e o Código Florestal, recentemente publicado pelo pesquisador Leandro Tambosi, da Universidade de São Paulo, reafirma que as florestas – que dependem da diversidade de espécies para se manter em equilíbrio, pois sem elas centenas de árvores sequer poderiam se reproduzir -, desempenha funções essenciais para a recarga de aquíferos, a redução do escoamento superficial e contenção de processos erosivos e, ainda, para a proteção de corpos d’água.

Mas a importância da biodiversidade para a população brasileira não se restringe ao equilíbrio climático e ao abastecimento de água. A garantia da produção de alimentos a nível mundial depende essencialmente de serviços ecossistêmicos como a polinização.

A pesquisa de Rebecca Chaplin-Kramer, Global malnutrition overlaps with pollinator-dependent micronutrient production (Como a desnutrição global está altamente relacionada aos micronutrientes produzidos pelos polinizadores), da Universidade de Stanford, publicada em 2014 na revista Proceedings of the Royal Society B fala disso. Os resultados do estudo demonstraram claramente que a agricultura, em diferentes partes do mundo, depende dos serviços prestados por abelhas nativas para produzir culturas agrícolas de alto valor econômico. Mais que isso: o estudo demonstrou que além de atuar na reprodução das plantas. os polinizadores nativos são diretamente responsáveis pela fixação de vitamina A e ferro e qualquer interferência nesse sistema de polinização pode levar a sérias implicações para a saúde pública de vários países.

Sem mencionar o papel chave da biodiversidade na descoberta e na produção de novos medicamentos, o pesquisador Alan Harvey, em seu artigo Strategies for discovering drugs from previously unexplored natural products (Estratégias para a descobertas de medicamentos a partir de produtos naturais ainda não explorados), enfatiza que produtos naturais disponibilizam para a indústria farmacêutica uma fonte insubstituível de moléculas com diversidade estrutural, tão complexa que pode ser utilizada como base para medicamentos ativos contra uma ampla variedade de doenças.

Pesquisas como esta demonstram claramente o tipo de recurso que a sociedade pode estar abrindo mão ao permitir a perda da biodiversidade nos biomas brasileiros. Vale lembrar que menos de 10% da biodiversidade mundial já foi testada para o combate a doenças. Ainda assim, algumas drogas revolucionárias foram descobertas a partir de recursos naturais como a artemisina, que age contra a malária e, os incríveis compostos contra câncer taxol, docetaxel e camptothecin.

Medicamentos como estes – ou mesmo o popular Captopril, utilizado diariamente por milhões de brasileiros com problemas de hipertensão, curiosamente criado a partir de peptídeos presentes no veneno de uma espécie de cobra brasileira – jamais teriam sido descobertos se as espécies que os originaram tivessem sido extintas.

Além dos milhares de recursos garantidos pela conservação da biodiversidade e pela preservação dos mecanismos de funcionamento dos ecossistemas desempenhados com maestria por milhões de espécies, é imprescindível ressaltar que o aquecimento global e as mudanças climáticas podem ser potencialmente acelerados com a perda de biodiversidade. Isto porque, como foi demonstrado em abril deste ano pelo cientista Anand M. Osuri, na revista Natureimpactos que levem à perda de espécies, em especial aquelas que desempenham papéis-chave em florestas tropicais – como grandes aves e mamíferos dispersores de sementes -, podem afetar diretamente os processos de fixação e formação de estoques de carbono em florestas.

Sem biodiversidade, o planeta para. Deixa de funcionar exatamente como um smartphone que caiu do 10º andar. Se perdermos algumas poucas peças essenciais ao funcionamento dos nossos ecossistemas, poderemos perder recursos fundamentais para a nossa própria existência.

Na próxima vez em que você se deparar com o termo conservação da biodiversidade, lembre-se que, mais do que nunca, agora ele rima perfeitamente com conservação da humanidade.

Tucano-de-bico-verde (Ramphastos dicolorus), um dos maiores responsáveis pelo sucesso reprodutivo de milhares de árvores.
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Ana
Ana
7 anos atrás

Muito obrigada!!
compartilhei, levando adiante.

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