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Deus ajuda quem vara a madruga

macaco aotus no galho

– Gamba, vi um Aotus ontem!

Estava de costas quando escutei esta frase, que ecoou nos meus ouvidos como a emoção de alguém que descobre o mapa de um mítico tesouro. Era o Benhur, amigo biólogo que participava de uma expedição comigo em algum lugar esquecido entre o Maranhão e Piauí.

– Me leva lá? (minha resposta foi imediata)
– Gamba, são quase 10 horas da noite! E eu encontrei o bicho ontem, num capão de mata há 400 quilômetros daqui! Sabe quando a gente tem a chance de encontrar ele? Nunca!
– Pô Benhur, é um Aotus!

Nem é preciso dizer que o convenci a sair de onde estávamos, naquela hora, para viajar mais 400 quilômetros, entrar no mato e procurar um pequeno e arisco macaco. E se tudo desse certo, ainda voltar na mesma noite para dar continuidade aos trabalhos da expedição! Sem contar que estávamos no Maranhão, onde a qualidade das estradas é semelhante à idoneidade dos políticos que vivem por lá.

O Aotus, nome científico do gênero que engloba diversas espécies pouco estudadas do macaco-da-noite, é o único primata com hábitos noturnos. Vive solitário ou em pequenos grupos, e a dificuldade em encontrá-lo é justamente por ser muito tímido e habitar as copas altas da Floresta Amazônica. Mas lá fomos nós.

No meio da viagem começou a chover. Um olha para o outro, sem falar nada, mas já pensando que seria uma barca furada. Lá pelas tantas, paramos para abastecer quando, de repente, um policial nos abordou.

– Boa noite, precisamos solicitar sua viatura!
– Como? (Perguntei àquela figura fardada, parecendo um personagem de noticiário sensacionalista)
– Estávamos na perseguição de um motoqueiro que atropelou uma mulher grávida, quando ao voltar já com o meliante à delegacia, nossa viatura quebrou. Solicitamos que vocês nos empreste a caminhonete para o levarmos para averiguações.

Aquele diálogo era tão surreal que não poderia ser mentira. Fomos até o local da dita viatura quebrada (uma Parati velha), no meio da estrada. E lá estava outro policial com o dito-cujo.  Acabamos por emprestar a caminhonete. Sabendo que o Aotus ficaria no meu sonho de fotógrafo, sentei-me no meio-fio em plena madrugada maranhense, enquanto Benhur dava carona aos policiais e o meliante. Nos dias seguintes voltamos aos nosso afazeres biológicos e fotográficos da expedição, em lugares distintos às margens do Rio Parnaíba.

Uma semana depois reencontrei o Benhur na única lanchonete de outro pequeno vilarejo (cujos lanches renderam diarréias homéricas a vários membros da expedição).

– E aí, Benhur, vamos procurar o Aotus? (Arrisquei…)
– Sério, Gamba? Você está brincando, né?
– Ora, por que não? Só estamos a 450 quilômetros do capão de mata. Você vai lembrar onde era, tenho certeza! E veja pelo lado bom: agora são apenas 9h da noite. Com sorte, viajamos, encontramos o bicho, tiramos uma fotos e voltamos felizes! Se nenhum outro meliante nos atrapalhar!

Acho que descrevi nossa futura rotina com tamanha simplicidade, que o convenci! Lá fomos nós, e aí está a foto para comprovar. Um bicho tranquilo, de uma docilidade ímpar no olhar. Como foi o encontro com o macaco? Teve lá seus perrengues também, mas nada que comparasse ao motoqueiro-fantasma da semana anterior. Além disso, como sou um contador de histórias, vou deixar esta para próxima!

Foto: Adriano Gambarini

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Guida
Guida
8 anos atrás

Verdade Dri, Deus sempre ajuda quem vara a madruga. Parabéns pelo trabalho. Acumulando experiências não é mesmo companheiro de jornada? Beijos

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