As primeiras damas e o ativismo


Não é segredo pra ninguém que – cultural e estruturalmente – aos homens sempre foi reservado o espaço público e o exercício das atividades profissionais e políticas, enquanto à mulheres  foi outorgada a responsabilidade pelos cuidados da casa, da família e do ambiente doméstico, essencialmente privado e longe dos holofotes.

Nesse contexto, vale destacar a jornada silenciosa e subvalorizada traçada pelas mulheres negras e escravizadas que foram pioneiras no empreendedorismo, na emancipação profissional e, também, importantes articuladoras de movimentos sociais e políticos.  Isso tudo em momentos nos quais as mulheres brancas – e libertas – ainda sequer usufruíam do direito ao voto, nem da participação nas universidades.

Historicamente, a figura pública da mulher sempre esteve relacionada a de um homem, fosse seu pai ou marido. E foi, nesse mesmo contexto, surgiu a figura da primeira dama.

Há indícios de que o termo surgiu na Roma Antiga, mas os primeiros registros de uso são datados de 1838 nos Estados Unidos, em referencia à Martha Washington, esposa de George Washington, primeiro presidente do país.

O cargo de primeira dama não é previsto nas constituições, nem exige requisitos formais. Ainda assim, é compreendido por uma série de obrigações que vão desde recepcionar convidados e autoridades em eventos oficiais até liderar ações e projetos sociais.

No Brasil, em 1942, Darcy Vargas, esposa de Getúlio Vargas, fundou a LBA – Legião Brasileira de Assistência, um órgão ligado ao Ministério da Previdência e Assistência Social, cuja presidência ficaria a cargo da primeira dama. Assim ocorreu sucessivamente até 1995, quando Ruth Cardoso extinguiu a LBA por suspeitas de fraude durante o governo Collor, no primeiro dia de mandato de seu marido, o então presidente eleito Fernando Henrique Cardoso.

Dra. Ruth, antropóloga, feminista e idealizadora da Comunidade Solidária, durante o governo de FHC esteve à frente de inúmeras iniciativas em prol do fortalecimento da sociedade civil e da inclusão social. Fundadora da Comunitas, ela teve forte influência no desenvolvimento de políticas públicas e no amadurecimento das parcerias público-privadas no setor social.

Nos Estados Unidos, Michelle Obama se destacou como a primeira mulher negra a assumir esse posto na Casa Branca e rapidamente se posicionou como uma figura empática e uma ativista coerente e corajosa.

Foi através de Michelle que a obesidade infantil ganhou atenção mundial com o lançamento do programa nacional Let’s move! (Vamos nos mexer!), que compunha um time de experts para pensar atividades e merendas escolares mais saudáveis às crianças. Ela também se tornou porta voz dos direitos dos jovens e das meninas, insistindo na educação como o único caminho possível para um futuro próspero.

Em seu discurso de despedida, Michelle inspirou com sua firmeza e autenticidade. Reforçou, uma vez mais, a importância da educação como ferramenta de transformação social e resgatou a essência dos cargos políticos: servir humilde e integralmente à sociedade.

São mulheres como essas que desconstroem estereótipos ultrapassados e nos encorajam a pensar que podemos ser o que e chegar onde quisermos, desde que haja consciência e responsabilidade.

Um brinde à Dra. Ruth, à Michelle e tantas outras grandes mulheres que levantaram suas vozes e serviram seus países com tamanha competência.

E àquelas que estão chegando, o nosso pedido: Ouça, acolha, trabalhe e, acima de tudo, nos represente.

Fotos: Divulgação

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Gabriele Garcia

Sonhadora, feminista e apaixonada por pessoas e histórias. Trabalhou por dez anos como advogada e em 2014 deixou o escritório para empreender o Think Twice Brasil, cujo primeiro projeto – Experiência de Empatia – foi uma viagem de 400 dias por 40 países para se aprofundar no aprendizado e identificação de soluções para desigualdade social e de gênero. De volta ao Brasil, está à frente do Instituto Think Twice Brasil e de projetos ligados à justiça social e de gênero.