Na era do ‘faça você mesmo’… e sem desperdício

Dia desses, fiquei  à cata da tampa da minha lapiseira favorita (que além de evitar que os grafites caiam funciona com apontador)… Já era a terceira vez que perdia a tampa e estava conformado de ter de tampar com uma fita ou comprar outra lapiseira porque obviamente não existem tampas avulsas à venda.

Atenta, minha filha de 7 anos procurou me tranquilizar: “Papai, não se preocupe! Quando eu crescer vou ser inventora e criarei uma máquina faz tudo: você coloca o desenho de um lado e sai pronto do outro lado. Qualquer coisa!”.

Não sei se ela vai mesmo ser inventora, mas certamente viverá num mundo onde fabricar estas peças ou objetos específicos com precisão e em casa será tão trivial quando navegar na internet. É a revolução da impressão em 3D.

Impressão em 3D não é propriamente uma novidade. Já se vão mais de 30 anos desde que Chuck Hull, pesquisador na Califórnia, montou o primeiro modelo de impressora que utilizava luz para solidificar camadas de resinas fotossensíveis e formar objetos.

As primeiras impressoras 3D comerciais foram introduzidas no mercado dez anos depois, em meados dos anos 90. Eram utilizadas por grades industrias ou laboratórios de design para produzir protótipos que, ao final do processo, tinham que ser ainda lixados, acabados antes de atingir seu formato final. Grandes, pesadas, lentas e caras, estas máquinas eram o equivalente aos antigos mainframes das empresas.

O processo de camadas é simples. Ao adicionar uma camada sobre a outra, forma-se o objeto. Quanto mais camadas (e mais finas) mais preciso e bem-acabado fica o objeto, mas isso torna o processo mais lento. Na última década, este paradigma foi rompido.

Empresas como a Carbon3D desenvolveram tecnologia que rompe com o processo em camadas. Em essência, ao controlarem o nível de oxigênio e luz em uma superfície liquida, conseguem produzir, de forma contínua, um objeto saindo do próprio líquido. É equivalente aquela cena do filme O Exterminador do Futuro em que, de um líquido metálico, forma-se o vilão da história.

Esse método – dezenas de vezes mais rápido e preciso que o tradicional método de camadas – forma peças e produtos complexos perfeitamente acabados e com diferentes características físico-químicas. É possível produzir desde órgãos artificiais até peças para veículos que serão submetidas e extrema pressão e temperatura.

Na velocidade que o preço e a qualidade das impressoras 3D evoluem, não é preciso bola de cristal para prever, que num futuro próximo, este será um objeto tão comum numa casa ou escritório como é hoje um computador.

A impressão 3D tem um enorme potencial para contribuir para redução do desperdício. Uma oficina de automóveis, por exemplo, poderá imprimir as peças de reposição quando necessário. Toda logística associada à fabricação, ao transporte e ao estoque será evitada. O mesmo vale para um hospital ou uma clínica de próteses ou órgão artificiais ou coisas mais triviais como trocar o bocal da mangueira que espanou ou o puxador da porta do armário.

Pensando bem… vou guardar esta lapiseira sem tampa. Ainda hei de consertá-la!

Foto: Malavoda/Flickr

Publicado em Epoca Negocios na Edição de Abril2017

Um comentário em “Na era do ‘faça você mesmo’… e sem desperdício

  • 24 de abril de 2017 em 10:50 AM
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    Prezado Tasso, seu texto é primoroso, com um toque magnífico de poesia que nos remete a um mundo maravilhoso!
    Mas tem um porém, que sempre penso quando leio algo nesta linha: jamais irão inventar o substituto do desperdício pelo simples fato de haver uma certa lei que diz nenhuma energia aparecer do nada e sempre haverá transformação e desperdício.
    Uma máquina 3D é feita de quê? Usa que energia pra funcionar? Leva algum lubrificante? Sapatas magnéticas? Esse material vem de onde? Tem ouro nos contatos, nióbio no circuito, plástico na carenagem? Que material básico é usado para fabricar o que você quer? De onde vem? Pra onde vai? Qual será a mágica de logística pra fazer com que a máquina 3D funcione?
    Purismo não vale, bem sei, mas isso é esquecer que há um circuito e estamos metidos nele até o pescoço.
    Sou do tempo em que não existia saco plástico e mamãe tinha um carrinho de feira e comprava-se coisas à granel e o desperdício de uma semana em nossa casa cabia numa lata de lixo. Mamãe fazia vaso de lata, lavava as garrafas, desenhávamos em papel de pão…
    Problema é a quantidade de coisas novas por segundo que o capitalismo inventa pra existir. Até bola de cristal me parece que parou na Revolução Industrial!
    Guarde a lapiseira, Tasso, quem sabe seu filho encontre lá, no adiante, e queira saber pra que servia, mesmo?
    Abração!

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Tasso Azevedo

Engenheiro florestal, consultor e empreendedor social em sustentabilidade, floresta e clima. Coordenador do Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) do Observatório do Clima e colunista de O Globo e revista Época Negócios. Foi diretor geral do Serviço Florestal Brasil, diretor executivo do Imaflora e curador do Blog do Clima